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O Resumo da Ópera

Sumário

1. Recapitulando
2. A disputa entre duas correntes
3. Por que tanta pressa para privatizar a CVRD?
4. Reservas para 500 anos? Um erro crasso da nossa legislação
5. Quanto vale afinal a Vale?
6. O Edital
7. Por quê a Vale deveria continuar sob o controle do Estado
8. O Governo está distante da realidade
9. A Vale privatizada
10. O conto do grampo
11. Em defesa do funcionalismo público
12. Os resultados de 1998 (winners and losers)
13. Esforço público, lucros privados



É bom ter presente que, como demonstra o último relatório das Nações Unidas, o resultado dos programas de "reformas" e de privatização pelo mundo afora não foi tornar o Estado enxuto e redirecionado para a área social. Na verdade ... a transferência de ativos e de empresas públicas para o controle privado foi propiciada pelo "mundo de negócios", no intuito de favorecer este ou aquele lobby empresarial, acentuando a concentração monopolista da riqueza, sobretudo a financeira.

                                                                                                      Maria da Conceição Tavares, deputada federal

O surgimento das estatais em todo o mundo, notadamente nas décadas de 30, 40 e 50, foi devido basicamente a cinco motivações: A CVRD originou-se dos Acordos de Washington em 1942, quando o governo americano e o governo inglês necessitavam desesperadamente de novas fontes de minério de ferro para as suas respectivas indústrias bélicas e o fornecimento a partir de empresas privadas, brasileiras ou estrangeiras, não inspirava confiança para o atendimento de suas necessidades prementes. Tornou-se inevitável um compromisso de governo a governo, algo selado num nível mais elevado que a lógica do lucro empresarial. Cessada a II Guerra Mundial, o Eximbank tentou adquirir o controle gerencial efetivo da Vale, uma vez que o esforço de guerra não se justificava mais e a posição do governo brasileiro como Estado-empresário se tornara incômoda (Cf. Machado, 1989, p.366-368).

As diretrizes de um programa de privatização variam de um governo para outro governo. Nas nações mais maduras do ponto-de-vista político, a privatização desponta como uma oportunidade para o Estado estender o seu benefício ao número máximo de cidadãos daquele país. Quando a França, por exemplo, estabeleceu o seu programa de privatização, houve preocupação em atender a cinco pontos fundamentais (Cf. Machado, 1989, p.125):

A) A corrente privatizante, de inspiração neoliberal, parte da premissa de que o Estado é ineficiente, devendo se ater a funções básicas, como saúde, educação e segurança pública. A insuficiência de recursos públicos não justificaria mesmo a continuidade de empresas estatais rentáveis a serem mantidas pelo aparelho estatal. Além disso, a expectativa do empresariado, no afã de crescer com base na alienação do patrimônio do Estado, tem grande influência nas decisões tomadas pelo Poder Executivo e pelo Congresso. A instituição do lobby é a materialização da vontade empresarial, sendo o canal próprio para promover a divisão do bolo (as estatais) da maneira mais adequada aos interesses dos grupos econômicos.

B) A corrente estatizante, ao contrário, considera que o Estado tem um papel que não se limita a funcionar como agente regulador da atividade econômica da nação. Existem áreas estratégicas onde o Estado deve continuar a atuar, com o objetivo de maximizar os efeitos econômicos e sociais de certas atividades, mormente em áreas ínvias. Isto se torna necessário principalmente na era da globalização, quando em todo o mundo o poder político vem sofrendo uma perda de importância face ao poder econômico (Cf. Forrester, 1996). A economia de mercado parte de uma lógica que ignora as demandas do elo fraco da cadeia econômica - países subdesenvolvidos, regiões atrasadas, minorias, excluídos, idosos, mão-de-obra não qualificada, etc. Cabe ao Governo, e somente ao Governo, estabelecer e executar políticas públicas voltadas para o desenvolvimento regional, correção de desigualdades sociais, eliminação da exclusão social, reforma agrária, geração de empregos e outras iniciativas visando assegurar o bem-estar da população brasileira como um todo.

Quando altos executivos do Governo declaram à imprensa que serão feitas reavaliações de reservas minerais da Vale, devido à incorporação de novos dados, mas que isto não irá alterar o valor da privatização, surgem duas hipóteses: a) o executivo ignora a matéria do ponto de vista técnico; ou b) o coração tem razões que a própria razão desconhece. Um número expressivo de países, quer desenvolvidos, quer em desenvolvimento, debatem-se dentro do círculo vicioso do déficit público. As despesas públicas superam anualmente as receitas da máquina arrecadadora. Solução: dispensar pessoal, a mesma lógica da empresa privada que enxuga a folha de pagamento para poder competir no mercado. Consequência: legiões de desempregados provindo da esfera pública e da privada. Solução: o governo e os ex-empregadores recomendam que os desempregados abram o seu próprio negócio, tornando-se micro ou pequenos empresários. A proposta é atraente, não há dúvida. Como o seu número aumenta sem cessar, a competição se torna cada vez mais acirrada. Consequência: para permanecer competitivo, o micro ou pequeno empresário torna-se um sonegador de impostos. Em função disso, a máquina arrecadadora do Governo continua sem ampliar a base tributária e o déficit público permanece intacto ou cresce. Enquanto isso, as grandes empresas alardeiam que o Brasil é o campeão mundial da tributação. E as estatais? Foram devoradas sucessivamente pelo sistema econômico vigente, cujas rendas convergem maciçamente para as grandes empresas. No caso brasileiro, o processo é mais grave, porque as grandes empresas costumam ser familiares e a concentração de renda se perpetua. Nas economias do Primeiro Mundo, o mercado acionário se beneficia com a redução do tamanho do Estado, mesmo que ocorra alguma concentração de renda. Se a privatização de estatais resolvesse o problema do déficit público, o governo americano não teria tido qualquer problema nesta área, já que nos Estados Unidos nunca houve proliferação de estatais, por uma questão ideológica, diferentemente dos países europeus. O desmonte do welfare state nos Estados Unidos e em outros países industrializados tem origem diversa. O fato é que os mercados nacionais e o internacional tornaram-se pequenos demais para as ambições e planos de crescimento ilimitado das empresas e oligopólios que controlam os diversos segmentos desses mercados. Daí a fórmula mágica da globalização, que tenta ocupar todos os espaços geográficos, custe o que custar. Enquanto as grandes empresas otimizam a sua forma de atuar, no país de origem e nas suas filiais estrangeiras, o elo mais fraco da cadeia se vê "pessimizado" (umneologismo que o Aurélio ainda não registrou na sua última edição, mas que os linguistas têm obrigação de criar). O anúncio recente da implantação de mais quatro ou cinco montadoras de automóveis no Brasil é um sintoma inequívoco dessa competição canibalesca que caracteriza os dias atuais (Cf. Kurz, 1996). É possível, entretanto, que toda a mão-de-obra que estará operando no setor automobilístico nos próximos anos será inferior, em número, ao da época dourada do quarteto Volkswagen, GM, Ford e Fiat na década de 80. Teoricamente, o consumidor sai ganhando com tal competição, mas o empregado perde. Se alguém comprasse um automóvel a cada mês, durante 35 anos como empregado, estaria talvez plenamente satisfeito com esta situação. Ironicamente, o Governo faz vista grossa, contribuindo à sua maneira para "pessimizar" a situação do trabalhador e da classe média brasileira. Um imenso exercício de retórica é elaborado nos bastidores para tentar demonstrar que existem avanços na área social. Basta deitar os olhos sobre os sem-terra, sem-teto, meninos de rua, desempregados crônicos, vendedores ambulantes no centro das grandes cidades e cidadãos de baixa renda nos corredores dos hospitais, para se avaliar a falência do Estado no atendimento das necessidades básicas da população brasileira, enquanto o PIB continua a crescer. O Plano Real é usado como um anteparo contra qualquer crítica de grupos da oposição, mas não resolve os problemas crônicos acumulados ao longo de sucessivos governos. Observe-se, contudo, que a mesma incompetência ocorre em outros países, tais como Colômbia, Peru, México, Venezuela e inúmeros países asiáticos e africanos. Realmente, o Brasil não é exceção, fazendo parte do elenco de países mal administrados. Embora o seu PIB seja muito superior ao dos países listados, os indicadores sociais estão nivelados a economias mais frágeis. Algo está errado. Diga-se de passagem que o desenho da administração pública costuma ter uma geometria fractal. Em outras palavras, os erros e vícios existentes na esfera federal se reproduzem na escala da administração estadual e, também, da municipal. Tanto na primeira hipótese, quanto na segunda, o resultado final para o cidadão brasileiro seria o mesmo. Em ambas, o Governo perde o seu poder de barganha num segmento econômico onde os países em desenvolvimento ainda apresentam uma vantagem competitiva, talvez a derradeira, sobre os países industrializados: o controle sobre jazidas de classe internacional (Cf. Machado et alii, 1994). O plano atual do BNDES estabelece a venda em bloco. Neste caso, os interessados são uma dúzia de postulantes, de capital nacional e estrangeiro, conforme já divulgado pela imprensa. Se, ao contrário, houvesse o desmembramento, prevê-se que mais de uma centena de empresas se candidatariam a adquirir o espólio da Vale. Dentro da lógica da administração atual, os novos controladores irão demitir empregados, aumentar a automação da empresa, cortar custos, adotar a ISO 9000 e a ISO 14000, liquidar os programas de apoio às comunidades nas áreas de sua influência, de modo a otimizar o seu desempenho financeiro e propiciar um retorno mais alto para os acionistas. Deve-se relembrar que numa CPI realizada pelo Congresso Nacional em setembro de 1991, o então Presidente da Vale, Sr. Wilson Brumer foi questionado se seria recomendável privatizar a CVRD. Sua resposta foi que "não seria inteligente" o Governo privatizá-la. Na época, a correção de rumos das estatais era executada através do contrato de gestão, fórmula encontrada para acalmar os críticos do Estado-empresário. Comenta-se que a Vale dispõe de reservas de minério de ferro em Carajás que, lavradas ao ritmo atual, poderiam durar 500 anos até serem completamente esgotadas. De fato, as reservas e recursos (a parte da jazida cuja viabilidade econômica ainda não foi comprovada) excedem as necessidades da empresa num horizonte de 25-30 anos, que é o intervalo de tempo adotado nos estudos de viabilidade, segundo a prática internacional. Dentro da lógica das legislações mais modernas que a brasileira, as reservas ou recursos que excederem este prazo de 25-30 anos, deveriam ficar nas mãos do governo, seja União, seja governo provincial (o caso do Canadá) ou governo estadual. Por que 25 ou 30 anos? Porque este prazo coincide com aquele utilizado em matemática financeira para avaliar o retorno de um empreendimento industrial. Após 30 anos, o valor presente de um recebimento ou entrada de capital tende para zero. Portanto, as reservas excedentes a 25 ou 30 anos valeriam zero. Na prática, a questão é completamente diferente, porquanto o governo utilizará essas reservas excedentes para beneficiar e atender as demandas das gerações futuras. É, desse modo, uma concepção perfeitamente sintonizada com a tese do desenvolvimento sustentável. Tese que a pressa do Governo em privatizar a Vale prefere ignorar.

De acordo com a nossa Constituição, no seu Art. 20, alínea IX, consta que "são bens da União ... os recursos minerais, inclusive os do subsolo." No momento de privatizar a Vale, surge, portanto, um impasse jurídico. Isto porque, ao mesmo tempo, as reservas e recursos de que estamos tratando são, do ponto de vista legal, bens da União e, do ponto de vista prático, bens da CVRD. Seria ingênuo argumentar que a Vale recebe uma concessão que poderá ser revogada a qualquer momento, conforme estabelecido em lei. Ora, em qualquer legislação do mundo, o concessionário está sujeito a sanções e penalidades. Este dispositivo, todavia, não justifica a concessão por um prazo quase equivalente à idade das Américas. Equivale a uma pessoa jurídica ter recebido uma concessão das mãos de Cristóvão Colombo, ou de Pedro Álvares Cabral, e estivesse exercendo este direito até os dias de hoje. Simplesmente ridículo e inaceitável, nada mais, nada menos que isso. Outra argumentação utilizada para ocultar esta benesse absurda é que daqui a 500 anos o minério de ferro talvez não tenha qualquer valor para a sociedade. Realmente, as inovações tecnológicas vêm colocando à disposição da sociedade uma quantidade apreciável de novos materiais. Entretanto, nenhum cientista de materiais, em sã consciência, teria a veleidade de afirmar que minério de ferro não terá nenhum valor em 40, 50 ou 60 anos. Em resumo, o problema do prazo de concessão mineral é tão grave que, por si só, seria suficiente para sustar o processo de privatização da CVRD.

Em outubro de 1994, a revista Exame (Cf. Barros, 1994) publicou um artigo onde foram citadas diversas avaliações empreendidas por diferentes autores, com base no estoque de ações na Bolsa, no seu patrimônio ou, ainda, no seu potencial. A indicação do valor das ações na Bolsa, naquela época, levava à cifra de US$9,6 bilhões, número confirmado pela firma de consultoria Trevisan & Associados. Todavia, é importante lembrar que nos últimos anos analistas estrangeiros vêm declarando que as ações das empresas brasileiras, de modo geral, estão muito baratas, quando comparadas ao seu valor patrimonial. Coerentemente, um analista de banco de investimento, por solicitação de investidores japoneses, estimou o valor global da empresa em US$18 bilhões, segundo o mesmo artigo da Exame. Em dezembro do mesmo ano, um Vice-Presidente da Vale divulgou que a empresa estaria avaliada entre US$16 e US$18 bilhões, conforme editorial do jornal "O Estado de São Paulo". Todavia, para surpresa nossa, o valor que vem sendo divulgado atualmente pelas autoridades do Governo é da ordem de US$10-11 bilhões, sendo metade desta cifra (US$5 bilhôes) o que o Governo pretende arrecadar com a transferência dos 51% das ações da Vale. Entre o final de 94 e o início de 97, a Vale anunciou novas descobertas de ouro e cobre na Amazônia e, a despeito disso, o valor da empresa caíu de US$18 bilhões para US$10 bilhões? O Tribunal de Contas da União merece ser ouvido? Qual a lógica de tão colossal deságio?

Às vésperas do lançamento do edital, a Folha de S. Paulo publicou um artigo sobre esta matéria. Dentre as avaliações de diversos bancos de investimento, o Salomon Brothers foi o mais transparente, divulgando os seguintes dados para as diversas áreas de negócios da Vale:
 

Áreas de

Negócios

Estimativa

(bilhões de dólares)

Minérios e Transportes

Pelotização 

Ouro

Aço

Alumínio

Papel e Celulose

Outros

Projetos

7

0,258

1,5

1

1,040

0,801

0,650

1

Fonte: Grupos avaliam Vale entre R$10 bi e 13 bi - Folha de S. Paulo , 5.03.97, p.1-8

O representante do Salomon Brothers revela que o valor apurado pela sua empresa "é conservador", ressaltando que "o potencial real da Vale está, em parte, escondido".

Segundo consta, o primeiro leilão vai colocar à venda 45% das ações ordinárias, esperando-se que o Governo arrecade o mínimo de R$2,91 bilhões, se prevalecer o preço de R$10 bilhões, estabelecido pelas autoridades. Vários analistas financeiros entrevistados pela Folha acreditam que o vencedor oferecerá um valor entre R$10 e 12 bilhões.

Para tornar a questão ainda mais difícil de entender, é ilustrativo fazer uma comparação com os dados da Codelco, estatal chilena (não sujeita à onda da privatização), cujo porte se aproxima daquele da Vale, apesar de estar limitada a operar com cobre, molibdênio, ouro e prata. Pois bem, quando interrogado sobre o valor da Codelco, se por ventura viesse a ser privatizada no futuro, o seu Presidente, Sr. Juan Villarzu, informou ao jornal El Diario (News@Chile, 1996) que o valor da empresa se situaria entre US$20 e US$35 bilhões, dependendo da rentabilidade futura de aplicações financeiras sobre os lucros da empresa. Portanto, enquanto a Codelco vale, no mínimo, US$20 bilhões, a Vale pode ser arrematada em leilão por meros US$10 bilhões. O Senado Federal está a par disso? A quem interessa um valor dessa ordem?
 

VALORES DE PRIVATIZAÇÃO DA CVRD
Critério ou

Autor(es)

Estimativa

(bilhões de dólares)

Valor das ações na Bolsa 1

Retorno esperado* 1

Funcionários da Vale 1

Investidores japoneses 1

Vice-Presidente da Vale 2

Ministro do Planejamento 3

Morgan Stanley 4

Opportunity 4

Bozzano, Simonsen 4

Salomon Brothers 4

9,6

> 9,6

12

18

16-18

10

12,16

10-12

12,3

13,31

Divulgado o Edital pelo Conselho Nacional de Desestatização, foi estabelecido o preço mínimo de R$10,361 bilhões, calculado com base no valor médio das ações da Vale negociadas nos últimos 90 dias. O leilão está marcado para o dia 29 de abril. É interessante notar que a opção pelo valor médio das ações no prazo escolhido não reflete de maneira direta a questão das descobertas anunciadas nos meses de janeiro e fevereiro. Suponhamos que, em vez de minério de ferro, o carro-chefe da Vale fosse o cobre. Neste caso, o surgimento no mercado internacional de um megaespeculador como o Mr. Hamanaka (ex-Diretor da Sumitomo), também conhecido por Mr. Five Per Cent, poderia bruscamente colocar o preço da Vale 20% ou 30% abaixo daquele considerado normal via bolsas de valores. Foi isto o que aconteceu no ano de 1996, afetando a rentabilidade de empresas produtoras de cobre, como a Codelco, BHP e RTZ. Isso serve para demonstrar que o critério baseado no valor das ações está sujeito a críticas. Em segundo lugar, estudos realizados por 22 especialistas da COPPE-UFRJ levantam dúvidas sobre o cálculo do valor mínimo, que pareceu ser "extremamente atraente" para os compradores potenciais. Além disso, os números apresentados no dataroom contradizem dados fornecidos pela própria Vale. Segundo depoimento do Prof. Pinguelli Rosa, "ou a Vale é desonesta e forja números, ou a Merril Lynch é descuidada". Acrescenta o relatório da COPPE que o dataroom omitiu a existência de duas jazidas de urânio na Província Metalogenética de Carajás. As jazidas de ouro e cobre também não constam do relatório da Merril Lynch. Vale aqui abrir um parêntese para um detalhe contido em relatório elaborado em 1995 pela EPA-Environmental Protection Agency, do Governo americano, o qual menciona como item fundamental para sublinhar o interesse das transnacionais de mineração pela América Latina, a privatização de jazidas de classe internacional. Não há qualquer ênfase a empresas modernas ou de alta tecnologia, ou com infra-estrutura adequada, ou bem administradas. O foco da questão é a qualidade das jazidas, sendo este o ponto crucial que o Conselho Nacional de Desestatização, ou as empresas de consultoria contratadas pelo BNDES, insistem em ignorar por motivos óbvios.

As repercussões sobre o preço mínimo no Brasil e no exterior foram unânimes em considerá-lo abaixo do esperado. Segundo a COPPE, houve subavaliação de, no mínimo, R$2,057 bilhões. É interessante notar que o estudo realizado pela Merril Lynch e empresas associadas vai custar ao bolso do contribuinte a módica quantia de R$198 milhões, baseada no preço mínimo. Como deverão surgir dois ou três consórcios, o fee da Merril Lynch ainda irá crescer um pouco em função do ágio a ser pago pelo vencedor do leilão. O quadro abaixo detalha a avaliação empreendida pela COPPE.
 

O Retrato da Desvalorização
Minério
Mina
Categoria
Diferença
CVRD-MRDI
Valor Unitário
(no local)
Valor a menos
(US$)
Ferro
Sistema Sul
Reservas
819 Mt
0,2 US$/t
163.800.000
Manganês
Azul
Reservas
3 Mt
0,5 US$/t
1.500.000
Ferro
Sistema Sul
Recursos
346 Mt
0,1 US$/t
34.600.000
Ferro
Carajás
Recursos
13.335 Mt
0,1 US$/t
1.333.500.000
Manganês
Azul e Urucum
Recursos
6 Mt
0,25 US$/t
1.500.000
Bauxita
Trombetas
Recursos
192 Mt
0,25 US$/t
48.000.000
Ouro 
Várias
Reservas
7,6 t Au
1,77 US$/g
13.452.000
Ouro
Várias
Recursos
203,5 t Au
0,885 US$/g
180.097.500
Ouro
Serra Leste
Recursos
187,8 t Au
0,885 US$/g
166.203.000
Projetos não
desenvolvidos
Várias jazidas
Reservas
n.a.
n.a.
114.500.000
TOTAL
---
---
---
---
2.057.152.500

Fonte: Grupo de Assessoramento Técnico (GAT) da COPPE/UFRJ - Vale foi subavaliada em US$2 bilhões Jornal do Brasil, 10.03.97, p.4

Segue um quadro com os números da privatização, que não costumam ser divulgados de modo muito transparente:
 

Os Números da Privatização
Preço mínimo
R$10,361 bilhões
Percen-
tagens
Capital social
381.559.000 ações
100,00%
Ações ordinárias
249.983.144
65,52%
Ações ordinárias
em poder da União
189.987.189
49,79%
Preço mínimo das
ações da União
R$5,066 bilhões
---
Leilão do bloco
estratégico
29 de abril
---
Objetivo
Venda de 45% das
ações ordinárias
---
Número de ações
112.492.415
29,48%
Preço mínimo do
lote
R$2,78 bilhões
---
Lance vencedor
R$3.338.178.240,00
---
Ágio *
19,99% 
---

Fonte: Adaptado de "Vale por R$10,3 bilhões" Correio Braziliense, 6.03.97
Folha de São Paulo, diversos números
* A privatização de duas companhias de distribuição de energia elétrica
no Rio Grande do Sul obteve ágios de 82,62% e 93,55%, respectivamente.

O Brasil é uma das últimas fronteiras do nosso planeta onde acontecem ainda descobertas importantes de jazidas de bens minerais (Cf. reportagens realizadas pelo Estado de São Paulo e Correio Braziliense, no mês de janeiro de 1997). Sob certos aspectos, com base na tecnologia de sensoriamento remoto disponível nos tempos atuais, a superfície lunar é melhor conhecida do que a superfície da Amazônia, simplesmente porque a Lua não tem cobertura vegetal. Em pouco mais de 50 anos, a CVRD passou de exportadora de minério de ferro a um conglomerado que produz também aço, ferroligas, bauxita, alumina, alumínio, ouro (maior produtor da América Latina), manganês, potássio, caulim, celulose e papel. Somente em pesquisa mineral, uma atividade de alto risco, a sua subsidiária - a Docegeo - vem investindo algo da ordem de US$30 milhões anuais. No período de 1972 a 1990, ela investiu a soma de US$173,4 milhões, exclusivamente em pesquisa mineral (Brumer, 1991). Com o aumento da competição entre as grandes transnacionais da mineração, sediadas na América do Norte, Europa, África do Sul e Austrália, houve um consenso de que o futuro das empresas líderes estaria fortemente atrelado ao conceito de "jazida de classe internacional". Trata-se de uma categoria de jazida caracterizada por altos teores, de preferência de localização superficial, com transporte de baixo custo até um porto oceânico, de modo a garantir um custo de produção tão baixo que possa suportar as flutuações dos ciclos econômicos, quando os preços dos bens minerais oscilam para cima e para baixo. As jazidas de ferro de Carajás se enquadram perfeitamente nesta classificação, enquanto as jazidas do Quadrilátero Ferrífero envelheceram ao longo do tempo, embora ainda ofereçam rentabilidade para os produtores. Outro exemplo, a Província Aurífera do Tapajós promete ser uma das melhores áreas do mundo para produção de ouro a baixo custo. Todavia, durante algumas décadas, a pesquisa sistemática dessa área foi prejudicada pela presença de grandes contingentes de garimpeiros extraindo o ouro aluvionar na superfície. Estima-se que a produção brasileira de ouro no século XX (até 1993) atingiu 1.416 toneladas. Os recursos totais de ouro no Brasil são estimados em 30 mil toneladas (Cf. DNPM, 1994, p.69). Presentemente, um número expressivo de empresas estrangeiras está requerendo áreas para pesquisar na bacia do Tapajós, em função da mudança constitucional que abriu a nossa legislação novamente para o capital estrangeiro. A CVRD poderia continuar o seu esforço de pesquisa nas áreas de grande potencial, sozinha ou sob forma de "joint venture" com empresas estrangeiras, como já vem ocorrendo. Abrir mão do esquema atual significa introduzir um grau de incerteza que, certamente, irá beneficiar este ou aquele grupo econômico, nacional ou estrangeiro, em detrimento do poder de decisão do Estado de influir nos rumos da futura CVRD. Os pressupostos do desenvolvimento regional, por exemplo, serão substituídos pela lógica da "bottom line" dos cálculos estritamente financeiros que comandam as empresas.

A privatização das siderúrgicas estatais teve uma conotação diferente do caso da CVRD, uma vez que inexiste qualquer fator de preocupação da sociedade brasileira, equivalente ao significado daquilo que se encontra no subsolo: jazidas já conhecidas e mensuradas, aquelas ainda em fase de pesquisa preliminar ou detalhada, bem como outras jazidas que irão se revelar no futuro, em áreas já requeridas ao DNPM pela Vale e suas subsidiárias. Uma siderúrgica é um complexo industrial perfeitamente palpável, passível de avaliação econômica rigorosa e pouco questionável, enquanto o principal ativo de uma mineradora é o seu estoque de jazidas, principalmente quando as jazidas possuem o status de classe internacional. Além das considerações relativas ao mercado, o sucesso de uma siderúrgica repousa basicamente no seu know-how e talento gerencial, enquanto o sucesso de uma mineradora depende fundamentalmente da qualidade e quantidade de suas jazidas. É óbvio que o know-how e o talento gerencial ajudam a empresa de mineração a otimizar o seu desempenho, mas as jazidas de má qualidade não atraem absolutamente o interesse das empresas-líderes do setor. Somente a busca de jazidas de classe internacional explica o sucesso de empreendimentos mineiros em países obscuros como a Papua-Nova Guiné, Botswana ou Namíbia. Se o subsolo dos países do Primeiro Mundo fosse tão pródigo nos dias atuais, ou se a sua tecnologia operasse milagres, por que embrenhar-se em países um tanto exóticos e enfrentar tantos perigos, incluindo animais peçonhentos e doenças tropicais?

Ao tentar privatizar a Vale, o Governo cometeu uma série de equívocos lamentáveis, cujas consequências se materializaram a partir do dia 29 de abril, data prevista para o leilão que somente aconteceu no dia 6.05.97 após uma enorme resistência dos seus opositores. O Governo julgou que a CVRD seria mais uma estatal dentro do Programa Nacional de Desestatização, e não é. Os ativos da Vale envolvem reservas minerais de valores variáveis e de avaliação subjetiva, mesmo empregando-se as melhores técnicas de avaliação disponíveis no ambiente internacional. O artifício das golden shares representa uma salvaguarda de valor questionável, porque se refere estritamente ao segmento de minério de ferro, deixando os novos controladores inteiramente à vontade para alienar as outras áreas de negócios no primeiro momento. A pouca importância que o Governo deu à questão das reservas para 400 ou 500 anos também significa que há uma generosidade excessiva para com os adquirentes do patrimônio mineral da Vale, fato inédito na história da mineração internacional. A campanha publicitária patrocinada pelo Governo foi dirigida ao público consumidor de amenidades, e não a aquele público mais conscientizado e mais exigente, dentro de uma nação com 160 milhões de habitantes e com uma história política como a nossa. O BNDES, ao publicar uma cartilha sobre a privatização da Vale, orientada para um público de 1o. ou 2o. grau, esqueceu de publicar algo mais substancial, algo como um Memorial sobre a Privatização da CVRD, para ser analisado e discutido por políticos, juízes, intelectuais, militares, sindicatos e outras entidades possuidoras de capacidade de análise e de crítica. A prova dessa deficiência está consubstanciada no fato de que o Edital não ofereceu os motivos da privatização. Receando não apresentar razões consistentes, o Governo preferiu se omitir. Todavia, um dos equívocos mais sérios foi a tentativa de depreciar a CVRD como uma empresa banal, transportadora de pedra, desprovida de qualquer valor do ponto de vista tecnológico ou estratégico. Ao anunciar um programa de governo modernizante, as autoridades esquecem que os nossos juízes, militares, intelectuais e outras personalidades, receberam nos bancos escolares o ensinamento de que nosso País é extremamente rico em recursos naturais, dependendo do Governo o seu bom aproveitamento em prol da sociedade. Na era da informática, da biotecnologia e da energia nuclear, países como o Canadá, Rússia e Austrália obtêm preciosas divisas através da exportação de bens minerais. Alguns argumentos divulgados pela imprensa parecem sugerir que o Brasil já ingressou no G-7, devendo encarar a atividade de mineração como algo do passado ou do Quarto Mundo (países mais pobres). Pobre é este exercício de retórica, que pode convencer apenas os nossos irmãos analfabetos. Será que o Governo acha normal programar o leilão de uma estatal contando com um batalhão de 600 advogados da Advocacia Geral da União, mais 120 advogados do BNDES, quatro jatinhos e provavelmente alguns helicópteros? Quem são os inimigos? Os autores das liminares? Os que ainda têm a capacidade de se indignar?

A oposição ao Governo não deve ser entendida como a manifestação de um Brasil atrasado, que resiste à modernização, ou que não quer enxergar o futuro. Estas frases de efeito não resistem ao observador mais atento do que se passa na arena política e no ambiente econômico. O que juízes, militares e intelectuais estão enxergando claramente é que estamos dentro de um processo extremamente concentrador de renda, quando estatais de qualquer natureza estão sendo oferecidas a preços altamente convidativos às nossas empresas familiares. A entrada dos fundos de pensão representa, de qualquer forma, um avanço, mas a sociedade brasileira precisa de outros mecanismos que venham a resolver de maneira mais efetiva os nossos problemas sociais crônicos: reforma agrária, geração de empregos, melhores padrões de saúde, educação, habitação, segurança, etc. Ironicamente, a cada privatização a população tem a plena certeza de que sobrevirá mais desemprego, porque a nova empresa necessitará de ficar mais enxuta e mais competitiva dentro de um mundo globalizado. Esta engrenagem é que gera a insatisfação crescente dentro da sociedade brasileira. Se o exemplo da Inglaterra servir para alguma coisa, os interessados devem ler os jornais com farta documentação sobre a recente vitória do Partido Trabalhista. Será que a sociedade britânica aprendeu algo nos últimos 18 anos? Aqui e lá, os frutos do neoliberalismo e da globalização estão indo parar em poucas mãos. As demandas da população como um todo não estão sendo atendidas. Esta frustração desagrada juízes, intelectuais e militares. Está fazendo falta um ombudsman no Planalto?

Tecnicamente, o Consórcio Brasil é o mais fraco dos dois candidatos que compareceram ao leilão da Vale. Sua experiência prévia em mineração se limita à operação de minas cativas de ferro e manganês no Quadrilátero Ferrífero e, no passado, de carvão em Santa Catarina. Fora da siderurgia, não atua na área de metalurgia em geral. A sua origem teve lugar no ramo têxtil, que era uma atividade dinâmica nas primeiras décadas deste século. Todos os seus sócios são meros investidores, nacionais e estrangeiros, extremamente interessados na bottom line. Neste caso, ele será mais tentado ao desmembramento da CVRD do que o consórcio perdedor, liderado pela Votorantim, pelo menos em teoria. Recorde-se que as golden shares protegem exclusivamente o segmento do minério de ferro. Os grupos japoneses já manifestaram o seu desejo de adesão ao Consórcio Brasil, na tentativa de garantir longos prazos de suprimento e preços bem comportados para o minério de ferro. Desse modo, enquanto o discurso oficial do Governo brasileiro primou em afirmar que o minério de ferro não é absolutamente estratégico para nós, os japoneses não perderam tempo em assegurar o seu envolvimento direto com a CSN. Em outras palavras, o tema é estratégico para o Japão e o Brasil ignora solenemente e com determinação a recíproca. Segundo os jornais, a própria Anglo American pretende conseguir também uma fatia do Consórcio Brasil. Enfim, tudo é possível daqui prá frente.

Dentro do novo desenho da siderurgia e da mínero-metalurgia pós-Vale, o mínimo que o Governo deveria patrocinar seria o estudo da nova configuração dos mercados pelo CADE, de modo que o capitalismo selvagem pudesse dar um salto para o capitalismo juvenil. O reconhecimento da necessidade de uma legislação antitruste monitorando o mercado significaria a nossa evolução em direção a um capitalismo juvenil. Um capitalismo maduro vai demorar ainda algumas décadas, na melhor das hipóteses.

Outros detalhes da privatização poderão ser obtidos no artigo "The CVRD privatisation: a hard victory for the government", publicado em novembro no periódico Raw Materials Report - Journal of Mineral Policy, Business and Environment, vol. 12, no. 4, pp. 36-41 (1997).

Dois meses após a privatização, o presidente do Conselho de Administração anunciou a reestruturação da empresa em quatro áreas: corporativa, minérios, alumínio e papel & celulose. "A área de minérios continuará sendo o 'core business', e a idéia é que cada uma das áreas se tornará mais viável e agressiva, ganhando em dedicação, flexibilidade e dinamismo", declarou o Sr. Steinbruch (Kinch, 1997). Um corte de 10% na sua força de trabalho de 15.500 empregados está sendo considerado. Vale lembrar que as últimas diretorias da Vale, enquanto estatal, já haviam implantado há mais de cinco anos o programa de demissão incentivada, com resultados considerados excelentes. No Sistema Norte, que compreende todo o complexo de Carajás, o principal escritório da empresa será em São Luis, e não mais em Belém. As autoridades do Estado do Pará se queixam de que a política da empresa ameaça deixar os buracos resultantes da mineração no Pará e os lucros, ou seja, o efeito multiplicador fora do Estado.

Como já era esperado, no mês de setembro de 1997 já haviam rolado todas as cabeças importantes da antiga diretoria da Vale, sendo substituídas pelos novos executivos de confiança do Grupo Vicunha. Aguardem novas demissões, dentro da lógica do momento, que norteia os processos de privatização pelo mundo afora.

O Conselho Nacional de Desestatização aprovou em 18.09.97 as diretrizes básicas para a colocação nos mercados nacional e internacional, de 78 milhões de ações ordinárias remanescentes da CVRD, que representam 20% do capital total e 30% do capital votante da empresa, num valor estimado em R$2 bilhões (Gazeta Mercantil, 1997). Para esclarecer melhor a situação, na época da privatização, as ações ordinárias com direito a voto representavam 65,52% do capital social total. Muito generosamente, o governo anuncia que "nosso interesse é pulverizar o melhor possível e expandir o mercado brasileiro de capitais". O vice-presidente do BNDES acrescenta que "o mercado de varejo em outros países representa algo entre 25% e 30% do mercado de capitais. No Brasil, ele desapareceu há pouco mais de 10 anos e recriá-lo, agora, é uma prioridade importante". Ora, num país caracterizado por uma extrema concentração de renda, seria um milagre existir um número expressivo de pequenos investidores agindo no mercado de capitais. Este é o eterno problema do nosso país, na linguagem de grande número de políticos e tecnocratas. O discurso é excelente, mas a prática ...

No dia 10 de outubro de 1997, o jornal "O Liberal" anunciou que "a operação desmanche posta em prática no Pará pela Companhia Vale do Rio Doce, a partir de sua privatização, tem agora como alvo a Docegeo, internacionalmente reconhecida como uma das mais competentes empresas de pesquisa mineral do planeta e responsável por algumas das maiores e mais importantes descobertas do setor já feitas até hoje no Estado. Depois da transferência de parte da estrutura administrativa mantida pela própria Vale em Carajás para São Luis do Maranhão, o ato encenado contra a Docegeo tem um efeito devastador: rigorosamente nada restará, aqui em Belém, do que foi a sede do Distrito Amazônia da empresa ao longo dos últimos 26 anos". Segundo a reportagem, Belém não terá o direito de manter nem mesmo o Centro de Documentação, depositário de um patrimônio técnico, científico e cultural altamente expressivo, reunindo perto de 390 mil itens. "Da CVRD propriamente dita e de suas coligadas, juntando tudo, aqui em Belém, o que sobrar deverá se limitar a meia dúzia de gatos pingados, sem nenhuma autonomia ou expressão", desabafa o geólogo Vanderlei Beisiegel, chefe do Distrito Amazônia de 1985 a 1991. Ele recomenda que "cabe ao Estado do Pará ... usar a lógica correspondente aos interesses de sua população e negociar com a nova Vale nos moldes exigidos - a todo benefício, isenção, incentivo, tratamento preferencial e outras benesses envolvidas deve corresponder a equivalente ação positiva e concreta da empresa".

Em outra reportagem do mesmo dia ("Belém não faz o menor sentido"), O Liberal comenta que "a diversificação das atividades e a consolidação dos vários empreendimentos aqui mantidos pela Vale e pelas suas coligadas fazem do Pará o segundo principal Estado na composição do faturamento global do grupo. As projeções indicam, porém, que já no início do próximo século ele passará a ocupar a primeira posição, superando Minas Gerais, hoje em primeiro lugar. Vislumbrando-se um cenário de médio e longo prazos, o Pará se apresenta para o futuro como a principal fonte de suprimentos da Companhia Vale do Rio Doce. Como se não bastassem as reservas já conhecidas, além do Salobo e Serra Leste, novas e importantes descobertas de ouro e cobre enriqueceram o patrimônio da empresa em Carajás". Mais adiante, a reportagem critica o comportamento omisso de suas lideranças políticas: "segunda maior província mineral do planeta, e caminhando em marcha acelerada para galgar já no início do próximo século à primeira posição, o Pará, por culpa maior de suas elites dirigentes - é preciso reconhecer - não conseguiu se livrar até hoje da deprimente condição de simples depósito (grande e rico, mas um depósito) de bens minerais, que são extraídos e mandados para fora em estado bruto". De fato, o que está ocorrendo na Região Norte não traz nenhuma surpresa, considerando que a lógica empresarial - a racionalidade fria da bottom line - ignora completamente as implicações políticas e sociais, salvo quando a comunidade reage e faz pressão, em busca de alguma forma de distribuição de benefícios legítimos.

A transferência do escritório da Vale de Belém para São Luis continua provocando reações adversas entre políticos do Estado do Pará. No dia 14 de outubro, o deputado Aloísio Chaves entrou com o projeto de lei 89/97, no sentido de revogar a lei no 5758/93, que concedeu isenção de ICMS, por dez anos, às empresas que realizem operações relativas à extração, industrialização, circulação e comercialização de bauxita, alumina, alumínio e seus derivados no território paraense (O Liberal, 1997b). Tal projeto, se aprovado, irá atingir duramente a Vale, que não paga hoje um só centavo de ICMS, além de se beneficiar da lei Kandir, que a isenta do pagamento do imposto na exportação de minérios. "Não queremos os buracos e a poluição que a Vale também traz. Em Oriximiná, que eu conheço, deixaram sobre o lago Batata uma camada de lama vermelha extremamente poluidora ao meio ambiente", declarou o deputado. Hoje Aloísio Chaves define a Vale como uma "latifundiária mineralógica", detendo direitos de lavra outorgados pelo DNPM em mais da metade do território do Pará. "Ela está fazendo reserva de mercado mineral", adiantou. Outro deputado, Zeno Veloso, afirmou que sempre se manifestou contrário à idéia da isenção, e diz que na luta contra a Vale o Estado do Pará deve procurar alternativas "dentro da lógica capitalista". Para ele, "a Vale, hoje, só pensa no lucro, como toda empresa privada".

Enquanto a Assembléia do Estado do Pará reage e toma iniciativas contrárias aos interesses da Vale, a Associação Mineira de Defesa do Meio Ambiente-AMDA decidiu tornar-se acionista da empresa com direito a voto, no intuito de levar suas reivindicações para a assembléia de acionistas (Peixoto, 1997). A intenção da AMDA é de que a empresa venha a reparar danos ambientais provocados pela mineração e pelo transporte ferroviário. "Há quatro anos estamos dialogando e cobrando ações da Vale, mas é muito complicado. A Vale até hoje não tem um sistema de gestão ambiental no Estado", queixa-se Dalce Ricas, presidente da ONG mineira. Indagado sobre tal iniciativa da AMDA, o gerente-geral de imprensa da Vale retrucou que tal entidade "pode esbravejar, falar, fazer o que quiser... os majoritários são quem decide". Temos aí uma amostra grátis do estilo truculento do capitalismo que impera neste país que aspira sofregamente atingir a modernidade. A disposição para o diálogo e para o entendimento com a comunidade são virtudes pouco exercidas pela maioria dos empresários, preocupados com a realização do lucro nosso de cada dia.

Quando a Vale foi privatizada, o governo festejou o ágio de 19,99% pago pelo consórcio vencedor, embora os críticos mencionassem a sua decepção com um ágio tão insignificante, face ao gigantesco patrimônio da empresa, reconhecido no Brasil e no exterior. Em outubro do mesmo ano, duas companhias distribuidoras de energia elétrica foram privatizadas pelo governo gaúcho, o qual recebeu R$3,145 bilhões pela sua venda (Paz, 1997). Note-se que este valor foi pouco inferior a aquele recebido pelo governo federal na privatização da Vale, com a agravante de que as duas estatais gaúchas não são detentoras de direitos minerários sobre jazidas de ouro, de minério de ferro para mais de 400 anos, etc. etc. Mais uma vez, a argumentação usada pelas autoridades durante a privatização da Vale não resiste à crueza dos fatos do próprio programa de privatização oficial, revelado no dia-a-dia para a opinião pública.

Comentando a Crise Asiática, o ex-ministro Rubens Ricupero, atual secretário-geral da UNCTAD, estende as suas considerações para o controvertido desempenho das privatizações no Brasil, alertando que no caso da Light, "a privatização não produz os efeitos desejados, pois em vez de aumentar os investimentos, ela dá lugar a uma distribuição prematura de dividendos, em detrimento do usuário." A propósito da CVRD, ele se manifesta de modo bastante crítico: "Eu creio que ainda há uma grande interrogação sobre se a privatização da Vale do Rio Doce não vai conduzir a um grande desastre, um desmantelamento de uma companhia que tinha boas condições internacionais."

Em sua edição do dia 7 de abril de 1998, a Folha de S. Paulo informa que o governo federal espera arrecadar neste ano a soma de US$20,85 bilhões com a venda de empresas estatais e concessões para a iniciativa privada explorar serviços atualmente oferecidos pelo Estado. Diga-se de passagem que esse valor colocará o Brasil no topo do ranking dos países que efetuam privatizações em todo o mundo. No período 93-97, o país que mais vendeu estatais federais foi a Itália, obtendo uma renda média anual média em torno de US$9 bilhões. Quanto ao Brasil, um país do Terceiro Mundo, arrecadou US$4,3 bilhões no ano passado, ficando à frente das médias obtidas pela Alemanha e Espanha. Se considerarmos também as vendas de estatais dos governos estaduais, o Brasil ganharia facilmente o título de campeão mundial das privatizações no ano de 1997. Segundo o BNDES, os Estados brasileiros arrecadaram perto de US$14 bilhões com privatizações no ano passado. Neste ano, espera-se que o total das privatizações brasileiras atinja US$32,79 bilhões. Esse montante supera, com larga margem, em quatro vezes o PIB anual do Paraguai, nosso parceiro no Mercosul. No tocante às estatísticas das privatizações brasileiras, a origem do dinheiro foi a seguinte: 45% dos leilões foram vencidos por empresas nacionais e só 13% pelo capital estrangeiro. As pessoas físicas ficaram com 14%, os bancos com 15% e os fundos de pensão com 13%.

Entrementes, o que aconteceu com a Companhia Vale do Rio Doce? De acordo com a mesma edição da Folha de S. Paulo, depois da privatização, a CVRD reduziu em cerca de um terço seu quadro de pessoal e registrou em 1997 o maior lucro de sua história - R$756 milhões. Em relação a 96, o lucro cresceu 46,23%. No mês em que foi privatizada, a empresa tinha 15.142 empregados, enquanto que em março de 98 o número caíu para 10.466. Os gastos com o programa de desligamento incentivado somaram R$95 milhões em 97. A partir de julho de 97, dando partida no seu programa de reestruturação, a Vale cortou 30% das despesas, especialmente dos itens materiais, serviços contratados e gastos diversos. Graças ao fim do ICMS sobre as exportações, a Vale teve uma economia de R$38 milhões nos gastos com impostos. Os cortes de pessoal e de despesas já eram esperados por todos aqueles que acompanham a rotina das demissões e enxugamento das despesas ocorrendo no universo das empresas privadas. Todavia, o que mais preocupa o cidadão comum é que a administração da macroeconomia brasileira, pelo governo atual, não consegue gerar empregos na medida em que as demissões se sucedem em cascata. Em outras palavras, o sucesso das privatizações é aplaudido pelas autoridades governamentais e o insucesso de milhões de brasileiros desempregados ou subempregados é encarado com indiferença. Este gênero de capitalismo era praticado nos Estados Unidos nas primeiras décadas deste século, na época conhecida como a idade de ouro dos "robber barons". Não é justo que tamanha concentração de riqueza venha a ocorrer no final do século em que nós vivemos, com uma imensa legião de miseráveis dispersos nas áreas urbanas e rurais deste país. Além de antiético, é extremamente perigoso do ponto de vista das suas conseqüências sociais.

O programa de privatização do Governo Federal sempre deixou a desejar em termos de lisura e transparência, apesar da propaganda realizada para provar exatamente o contrário. Era apenas uma questão de tempo para que os acertos entre compadres do governo e da iniciativa privada viesse à luz do dia. A propósito desses conluios que somente denigrem a imagem dos governantes, seja aqui, seja no exterior, transcrevemos aqui uma versão bem humorada, em estilo quinhentista, do Conto do Grampo, segundo o jornalista Moacir Werneck de Castro, do Rio de Janeiro (edição do Jornal do Brasil de 1o.12.98):

"Era uma vez um país que virou nação, e essa nação implantou um Estado, e esse Estado administrou grandes riquezas, pois a terra em tal maneira era graciosa que nela dava tudo. Mas essas riquezas, por mal administradas, iam parar nas mãos de uns poucos, nativos e estrangeiros. Assim o Estado, falhando aos seus propósitos, se viu incapaz de enfrentar doestos e vitupérios, tanto da parte dos despossuídos como dos possuidores, que mais e mais ambicionavam possuir.

Dispondo estes últimos das regalias da força, e os primeiros tão somente de um reclamo de justiça, não era difícil prever o fim de tal porfia. Ganhou quem de ganhar havia, conforme a lei segundo a qual a razão do mais forte é sempre a melhor.

Sobre o Estado assim diminuído implantou-se a supremacia do mercado, o qual, sem peias de qualquer sorte, passou a reger a riqueza nacional, do que resultou ficarem os ricos ainda mais ricos; os pobres, mais pobres; e a nação, mais endividada. Pelas trombetas mediáticas que propagavam o pensamento único vigente - e saco houvera para agüentar a zoeira das trombetas em altíssimos decibéis - espalhou-se entre as gentes a idéia de que tudo se resolveria com a alienação do patrimônio público, um processo que veio a receber o nome de privatização.

Tal idéia permitia que, tirando-se um pouco de todos para dar muito a alguns, se proporcionassem negócios harto proveitosos. E assim aconteceu que do estrangeiro se exacerbassem cobiças, com miras a pingues lucros. Formaram-se então grupos e parcerias, todos buscando locupletar-se, lautamente. E aqueles que não entravam no negócio, ou de qualquer modo lhe criavam tropeços, eram alvo de mofa e escárnio.

Ao Fundo Monetário Internacional, instância competente das nações ricas, manifestou o governo do país em questão as suas saudáveis intenções de bom pagador, fiel aos imperativos da era da globalização, onde cada país, na rede universal, é uma parcela de um todo único. E esse Fundo prometeu alguns bilhões de sestércios, desde que fosse assegurado aos credores, mediante o necessário controle das finanças do país, o pagamento do principal, acrescido de elevados juros.

Sobrevieram, porém, molestas conseqüências. Tornou-se transparente o que devia ser opaco, e público o que devia ser secreto. Tudo porque mãos criminosas, burlando a vigilância dos centuriões, instalaram num dos palácios reais uma nefanda maquininha chamada grampo, que permitia serem registradas em minúsculos papiros as conversas de respeitáveis autoridades.

E essas autoridades se entregavam a alegres confidências, usando gírias artesanais e palavras até então consideradas chulas, como o curioso apodo de babacas dado em tom chocarreiro aos néscios e pobres de espírito. Tal situação provocou dificuldades assaz infortunadas, justamente quando se preparavam os festejos de um segundo reinado. Daí sucedeu um abalo entre as lealdades nas quais se baseava o rei, bem como indesejáveis açodamentos na disputa por novos cargos em perspectiva.

O soberano, entretanto, não se deu por vencido e, em numerosas orações, pois tinha o dom da palavra fácil, proclamou que não temia o escândalo, tanto o verdadeiro como o forjado.

Em seu refúgio no deserto, um sábio eremita soube das novidades da Corte por um mensageiro alado chamado Televisão, e assim falou: "Em verdade vos digo, senhor rei, que debalde fareis prodígios de oratória se não ouvirdes as lições da sabedoria antiga. De que vale a vossa presunção, se um simples grampo pode deslustrar o régio manto? Acaso tomais ao pé da letra a parábola dos talentos, quando diz que "ao que tem, dar-se-á, e terá em abundância; mas ao que não tem, tirar-se-lhe-á até o que julga ter?"

Já que falais em escândalo, escutai o apóstolo: "Ai do mundo por causa dos escândalos! Eles são inevitáveis, mas ai daquele homem por quem vem o escândalo!"

A voz rouca do anacoreta soou por vales e montanhas, mas não sabe o douto cronista, ao qual nos reportamos, se foi ouvida no palácio real, onde paredes à prova de som - e de grampos - foram instaladas por artesãos de suma perícia. E todas as atenções se voltaram para o próximo lance da interessante história."

Seria cômico se não fosse trágico, comentaria outro autor quinhentista, William Shakespeare.

Reagindo à tendência atual de se considerar o funcionário público o vilão responsável pelos males da nossa administração e da nossa economia, o Sr. Rubens Ricupero, secretário-geral da UNCTAD e ex-ministro da Fazenda, assim se manifesta: "Existe entre nós o preconceito de que homens do setor privado são a priori melhores para administrar o país e formular planos econômicos. Mas será mesmo verdade? É claro que, em princípio, nenhuma categoria tem o monopólio do patriotismo, do espírito público ou da probidade e eficiência. Há exemplos convincentes tanto das vantagens do sistema americano de recorrer ao setor privado como da tradição francesa (que vem de Colbert) e européia, em geral, de utilizar funcionários de carreira para a maioria dos cargos, reservando aos políticos eleitos os postos ministeriais e poucos outros.

A questão, portanto, é mais de cultura que de suposta superioridade inerente de uma ou outra abordagem. Falou-se em 'cultura da privatização', mas melhor seria falar em cultura do setor privado ou do setor público. Cultura é sistema de valores, crenças e práticas. Na área privada, a cultura se organiza em torno da busca da auto-realização por meio do êxito material. Isto é, a eficiência tem como recompensa a fortuna. Em contraste, não se abraça, salvo as exceções aberrantes, o serviço público para ficar rico. A recompensa terá de vir por outros caminhos: o prestígio da promoção, a consciência de servir o bem comum, de promover os interesses da comunidade e não os particulares, por mais legítimos e respeitáveis."

Ele acrescenta uma lista de funcionários abnegados que muito contribuíram para o engrandecimento do nosso país: Machado de Assis, Carlos Drummond de Andrade, Simões Lopes, Guimarães Rosa, Rio Branco, Oswaldo Cruz, Mario Pinotti, Nelson de Morais, Anísio Teixeira, Darcy Ribeiro, John Cotrim, Mario Bhering, Orlando e Claudio Villas Bôas, dentre outros. Duvida o Sr. Ricupero que "a quarentena resolva o problema de separar a esfera do público da do privado no caso da nomeação de pessoas inspiradas pelo valor do êxito material. O melhor seria dar condições de trabalho e remuneração satisfatórias a carreiras como a do Tesouro, da Receita ou criar algo semelhante aos inspetores de finanças franceses. Afinal, não havia essa relação incestuosa com o mercado no tempo em que os assessores dos ministros da Fazenda eram retirados dos quadros do Banco do Brasil ou dos fiscais do imposto do consumo."

O lucro da CVRD em 98 - R$ 1,029 bilhão - foi o maior já registrado por uma empresa privada no país. Nada mau para uma empresa que "carrega pedras, põe sobre um vagão e leva até o porto", conforme a justificativa singela do governo para convencer a opinião pública sobre a necessidade de sua privatização. Apesar da previsão oficial da queda de 4% do PIB em 99, o Sr. Benjamin Steinbruch, presidente do Conselho da empresa, assegura que os lucros da Vale e da CSN baterão novos recordes em 99. "Não gostaria de andar para trás", afirma o empresário (Folha de S. Paulo, 14.03.99, p. 2-4). Com a maxidesvalorização do real, o avanço se dará pela via da exportação: US$ 3 bilhões da Vale e US$ 750 milhões da CSN. Em outro trecho da entrevista, ele afirma: "Sou a favor da privatização em geral porque ela resolve os problemas da gestão estatal de atividades produtivas e gera impostos para o governo."

O Globo, em sua edição de 22.03.99, noticiou que a Vale foi multada pela Secretaria Executiva do Estado do Pará em R$ 191 milhões por sonegação fiscal. Segundo esse jornal, foi a maior multa por sonegação já aplicada pelo estado. A multa foi aplicada pelo fato da empresa não vir recolhendo o ICMS na importação de equipamentos para a sua coligada Albrás e para projetos da própria companhia desenvolvidos na Serra dos Carajás, no sul do Pará. Consta que as suas relações com o Governo do Pará estão abaladas desde que houve desistência da Vale de prosseguir com o Projeto Salobo, que representaria um investimento de cerca de US$ 1,5 bilhão, engavetado após a privatização. Localizado na região de Carajás, o projeto Salobo possui reservas de 1,2 bilhão de toneladas de minério de cobre, contendo como subprodutos 240 toneladas de ouro e 700 toneladas de prata. O próprio governador tem queixas da Vale, ao afirmar que a empresa recolhe aos cofres do Estado apenas R$ 300 mil mensais, o equivalente ao recolhimento de um grande supermercado da cidade de Belém. O clima tem estado tão tenso, segundo o Globo, que o Governo do Estado tem ameaçado retirar a Polícia Militar de uma área de 400 mil hectares que a empresa mantém na área do Projeto Carajás e que é cobiçada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST).

Apesar do seu perfil 'low-tech', segundo a ótica do governo federal, a Vale foi o maior exportador individual em 98, alcançando suas exportações o valor de US$ 1,756 bilhão (Folha de S. Paulo, 4.04.99, p. 2-1). Em segundo lugar, vem a Embraer com US$ 1,173 bi e, em escala decrescente, a Ceval, a Fiat, a Ford, a CST, a General Motors, a Petrobrás, a Volkswagen e a Souza Cruz. Enquanto a indústria de transformação não obtém um sucesso maior no mercado internacional, é a indústria extrativa mineral que se mantém, durante anos sucessivos, no pódio com a medalha de ouro. Isto acontece porque, durante mais de 54 anos como estatal, a Vale teve uma administração eficiente e compatível com as oportunidades que a mineração brasileira oferecia. Sem empreguismo, sem politicagem, sem vícios, sem os males que justificaram os programas de privatização no mundo inteiro. A Vale representou a ovelha sacrificada no alto da pirâmide da privatização.
 

Dentro da melhor tradição do governo, os resultados da empresa, mal decorridos dois anos de sua privatização, foram invejáveis, demonstrando a extrema generosidade dos donos do poder com o grande capital. Com efeito, a Vale encerrou o ano de 1999 com o lucro líquido de R$ 1,251 bilhão, 21,6% superior ao de 98.  Nada mau para uma empresa cujo "know-how" é carregar pedra, segundo o marketing governamental na hora do leilão da privatização. Os investimentos de US$ 936 milhões programados para o ano de 2000 serão concentrados sobretudo em seu "core-business" e na área de logística. É este resultado a conseqüência natural e previsível do talento empresarial dos seus dirigentes? Na opinião de alguém que conheceu a Vale bem de perto, durante mais de 10 anos, "seria preciso um erro de gestão sobre-humano para a Vale não dar certo". Palavras de Eliezer Batista, segundo informa o Relatório Reservado (edição de 11.05.2000).

Segundo informações do Globo On, do dia 21.05.2000, "nas próximas semanas, o BNDES recebe a proposta de solução negociada entre os sócios para a venda de ações da Vale e da CSN. Na mesa de negociação está a possibilidade de a Previ e o Bradesco venderem suas ações da CSN para seu principal acionista, Steinbruch. A CSN, por sua vez, venderia suas ações da Vale para os dois sócios." Continua a reportagem: "Para tentar deslanchar o acerto entre  os sócios, o BNDES está disposto a financiar a CSN. É que as ações que a siderúrgica teria que comprar da Previ e do Bradesco custam mais caro do que os papéis da Vale que venderia. A diferença, calculam técnicos do banco, ficaria em torno de R$ 600 milhões." Ação entre amigos?

Referências:

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Castro, M. W. de O conto do grampo Jornal do Brasil, 1o. 12.98

Correio Braziliense, vários números, janeiro de 1997.

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__________ A privatização da CVRD (editorial), 19.12.94, p.A3.

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Folha de São Paulo, vários números, ano de 1997

__________ Ricupero aponta riscos de deflação global, 18.01.98, p.2-8.

__________ Brasil lidera privatizações no mundo, 7.04.98.

__________ Vale demite um terço dos seus empregados e tem lucro recorte, 7.04.98.

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Última atualização: 24.05.2000

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