A
síntese do romance – rapsódia
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Capítulo I - Macunaíma
Macunaíma,
“herói de nossa gente” nasceu à margem do Uraricoera, em
plena floresta amazônica. Descendia da tribo dos Tapanhumas e, desde
a primeira infância, revelava-se como um sujeito “preguiçoso”.
Ainda menino, busca prazeres amorosos com Sofará, mulher de seu
irmão Jiguê, que só lhe havia dado pra comer as tripas
de uma anta, caçada por Macunaíma numa armadilha esperta.
Nas várias transas (“brincadeiras”) com Sofará, Macunaíma
transforma-se num príncipe lindo, iniciando um processo constante
de metamorfoses que irão ocorrer ao longo da narrativa: índio
negro, vira branco, inseto, peixe e até mesmo um pato, dependendo
das circunstâncias.
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Capítulo II - Maioridade
De tanto
aprontar, foi abandonado pela mãe no meio do mato. Tremelicando,
com as perninhas em arco, Macunaíma botou o pé na estrada
até que topou com o Curupira e perguntou-lhe como faria para voltar
pra casa. Maliciosamente, o Curupira ensina-lhe um caminho errado que Macunaíma,
por preguiça, não seguiu. Escapando do monstro, o herói
topou com uma voz que cantava uma toada lenta: era a cotia, que depois
de ouvir o piá contar como enganara o Curupira, jogou-lhe em cima
calda envenenada de mandioca. Isto fez Macunaíma crescer, atingindo
o “tamanho dum homem taludo”.
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Capítulo III – Ci, Mãe
do Mato
Encontra
Ci, a Mãe do Mato e inventa com ela lindas e novas maneiras de gozos
de amor. O resultado desse idílio é o nascimento de um curumi,
que morreu prematuramente depois de mamar no único peito de Ci,
envenenado pela Cobra Preta. Enterrado o filho, Ci também resolveu
deixar este mundo. Deu ao herói sua muiraquitã famosa e subiu
pro céu por um cipó, transformando-se numa estrela.
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Capitulo IV – Boiúna
Luna
Tomado
de tristeza, Macunaíma despediu-se das Icamiabas e partiu
rumo às matas misteriosas. No caminho, encontra Capei, monstro fantástico
que abre a goela e solta uma nuvem de marimbondos. Nas lutas contra o monstro,
Macunaíma perde seu talismã e fica sabendo, através
de um uirapuru, que a tartaruga que engolira sua pedra tinha sido apanhada
por um mariscador. Este vendera a muiraquitã a um rico fazendeiro
chamado Venceslau Pietro Pietra, proprietário de uma mansão
na rua Maranhão, em São Paulo. Macunaíma resolve,
então, vir para a capital paulista recuperar sua muiraquitã.
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Capítulo V - Piaimã
O herói
junta seus irmãos e desce o Araguaia, com sua esquadra de igarités
cheias de cacau. Em São Paulo, fica sabendo que Venceslau Pietro
Pietra era o gigante Piaimã, comedor de gente, companheiro de uma
caapora velha chamada Ceiuci, também antropófaga e muito
gulosa. Esse capítulo apresenta uma das passagens mais saborosas
do romance: a chegada de Macunaíma e seus irmãos à
cidade de São Paulo. Nesse momento, Mário de Andrade inverte
os relatos quinhentistas da Literatura Informativa. Aqui é o índio
que se depara com a dita “civilização” e procura assimilá-la,
digerindo-a com suas próprias enzimas culturais.
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Capítulo VI – A francesa
e o gigante
Depois
de uma tentativa de aproximação frustrada, Macunaíma
resolve se vestir de francesa para conquistar Venceslau Pietro Pietra e
reconquistar sua muiraquitã. O regatão não emprestou
a pedra nem quis vendê-la. Mas deixou claro que poderia dá-la
se a francesa resolvesse “brincar” com ele… Muito inquieto, Macunaíma
foge, percorrendo, em louca correria, grande parte do território
brasileiro.
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Capítulo VII - Macumba
Como não
tivesse força suficiente pra matar o gigante, Macunaíma vem
para o Rio de Janeiro procurar o terreiro de macumba da tia Ciata. Pediu
à macumbeira vários castigos pro gigante Piaimã que,
além de receber a chifrada de um touro selvagem, é ferroado
por quarenta mil formigas-de-fogo.
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Capítulo VIII – Vei,
a Sol
É
também no Rio de Janeiro que Macunaíma reencontra a Vei,
a deusa-sol que pretendia casar uma de suas três filhas com o herói.
Embora tivesse prometido, Macunaíma não cumpriu a palavra
empenhada: logo que anoiteceu, convidou uma portuguesa e brincou com ela
na jangada. Depois foram descansar num banco da avenida Beira-mar,
no Flamengo, quando surgiu Mianiquê-Teibê, monstro de garras
enormes com olhos no lugar dos peitos e duas bocarras nos pés, de
dentes aguçados. Macunaíma saiu correndo pela praia; o monstro
comeu a portuga e desapareceu.
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Capítulo IX – Carta pras
Icamiabas
O herói
retorna a São Paulo e, saudoso, resolve escrever uma “carta pras
icamiabas”, relatando como era sua vida em São Paulo. Faz, num satírico
estilo beletrista, uma descrição da agitada vida paulistana,
com seus arranha-céus, ruas “habilmente estreitas” cheias de gente,
cinemas, casas de moda, ônibus, estátuas e jardim. Nesta pernóstica
missiva, o corrupto Imperador faz questão de detalhar para as amazonas
a prática constante de amores pecaminosos, tanto que ele até
pensa em tirar proveito da exploração do lenocínio.
Critica o capitalismo selvagem dos paulistas locomotivas e dos italianos
arrivistas, destacando, horrorizado, ao final, uma curiosidade original
deste povo: “falam numa língua e escrevem noutra”. Depois de abençoar
as suas súditas, termina a carta, com a maior desfaçatez,
pedindo mais uma “gaita” pras suas fiéis icamiabas. |
Capítulo X – Pauí-pódole
A surra
que Venceslau Pietro Pietra recebeu de Exu foi tão violenta que
ele ficou meses numa rede, travado pelos suplícios a que foi submetido.
Sem poder readquirir a muiraquitã, Macunaíma ocupou-se então
do complicado estudo das duas línguas da terra, “o brasileiro falado
e o português escrito”. Interrompe um mulato pedante que fazia um
verborrágico discurso sobre o Cruzeiro do Sul, falando que aquelas
quatro estrelas que brilham no vasto campo do céu são, na
verdade, o Pai do Mutum, figura zoocosmológica que teve seu corpo
de ave metamorfoseado numa constelação.
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Capítulo XI – A velha
Ceiuci
Depois
de ter passado a noite brincando com a patroa da pensão, Macunaíma
falou pros seus irmãos Maanape e Jiguê que tinha achado “rasto
fresco de tapir”, em pleno asfalto paulistano, junto à Bolsa de
Mercadorias. Induziu seus irmãos a caçarem o animal e estes
quase acabam sendo linchados pela multidão que se aglomerou pra
assistir à caçada. Um estudante subiu na capota de um automóvel
e discursou contra Maanape e Jiguê. Foi interrompido por Macunaíma
que, tomado por um efêmero acesso de fraternidade, resolveu defender
os irmãos entrando no meio da multidão e distribuindo rasteiras
e cabeçadas até ser preso por um “grilo”, soldado da antiga
guarda-civil de São Paulo. No meio da confusão, o herói
conseguiu fugir e foi ver como passava o gigante Venceslau Pietro Pietra,
ainda “convalescendo da sova apanhada na macumba”. Faz uma aposta com o
curumi Chuvisco pra ver quem conseguia assustar o gigante e sua família.
Perde a aposta e resolve fazer uma pescaria. Como não tivesse anzol,
o herói se transforma numa “piranha feroz” pra cortar a linha de
um inglês que pescava a seu lado. Acontece que a velha feiticeira
Ceiuci, mulher do gigante, também costumava pescar no igarapé
Tietê e prende o herói. Ao ser pescado pela tarrafa da feiticeira,
Macunaíma vira um pato que devia ser logo comido. Além de
brincar com a filha mais moça de Ceiuci, ludibria-a e foge,
montado “num cavalo castanho-pedrez que pra carreira Deus o fez”. É
uma fuga espetacularmente surrealista: num momento está em Manaus
e noutro em Mendoza, na Argentina.
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Capítulo XII – Tequeteque,
chupinzão e a injustiça dos homens
Desesperado
porque ainda não conseguira reaver a muiraquitã, Macunaíma
se disfarça de pianista e tenta, junto ao governo, uma bolsa de
estudos na Europa, para onde Venceslau Pietro Pietra havia viajado. Não
conseguindo a bolsa, sai a viajar com os manos pelo Brasil pra ver se acha
“alguma panela com dinheiro enterrado”. Nestas andanças, encontra
um macaco comendo coquinho baguaçu. Como estava com fome, o herói
pergunta ao macaco o que estava comendo e ouve a seguinte resposta cínica:
“-- Estou quebrando os meus toaliquiçus pra comer.” Macunaíma
resolveu imitá-lo, agarrou um “paralelepípedo e juque! nos
toaliquiçus. Caiu morto.” Só conseguiu ressuscitar graças
à feitiçaria de Maanape, que colocou no lugar do órgão
destruído dois cocos-da-baía. Depois “assoprou fumaça
de cachimbo no defunto-herói” e este reanimou-se, tomando guaraná
e uma dose de pinga.
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Capítulo XIII – A piolhenta
de Jiguê
Jiguê
resolveu se amulherar com Suzi, cunhatã muito velhaca que passava
todo o tempo namorando Macunaíma. Jiguê descobre, fica furioso,
dá uma baita surra no herói e expulsa Suzi com uma porretada.
Levada por seus piolhos, Suzi vai “pro céu virada na estrela que
pula”.
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Capítulo XIV - Muiraquitã
Maanape
comunica ao herói a volta de Venceslau Pietro Pietra. Macunaíma
enche-se de coragem e decide matar o gigante. Come cobra e, com muita esperteza,
coloca Piaimã balançando num cipó de japecanga, embala-o
com força e o gigante acaba caindo dentro de um buraco onde Ceiuci,
a velha caapora, preparava uma imensa macarronada. O gigante cai na água
fervente e o cheiro de seu couro cozido, além de matar todos os
ticoticos da cidade, provoca o desmaio de Macunaíma. Quando se recupera,
o herói apanha a muiraquitã e volta pra pensão.
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Capítulo XV – A pacuera
de Oibê
Morto
Piaimã e reconquistada sua muiraquitã, Macunaíma,
Maanape e Jiguê são novamente índios e resolvem voltar
para o distante Uraricoera. O herói levava no peito “uma satisfação
imensa”, mas não deixa de ter saudade de São Paulo. Tanto
que levava consigo todas as coisas que mais o haviam entusiasmado na “civilização
paulista”: um casal de legornes, um revólver Smith-Wesson e um relógio
Patek. Um bando de aves forma uma grande tenda de asas coloridas que protegem
o Imperador do Mato-Virgem. Nesta viagem de volta feliz, o herói
teve novas aventuras amorosas, lembrando-se com saudade da vida dissoluta
que levara em São Paulo: encontra-se com Iriqui (antiga companheira
de Jiguê) e com uma linda princesa que tinha sido transformada num
pé de carambola. Com sua muiraquitã, o herói faz uma
mandinga e o caramboleiro vira “uma princesa muito chique”, com quem tem
vontade de brincar, mas não pode, pois são perseguidos pelo
Minhocão Oibê. Graças a uma nova mandinga, o herói
transforma Oibê num cachorro-do-mato, de rabo cabeludo e goela escancarada.
Como Macunaíma agora só queria brincar com a princesa, Iriqui
fica tristíssima e sobe “pro céu, chorando luz, virada numa
estrela”.
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Capítulo XVI - Uraricoera
Finalmente,
chega ao Uraricoera natal e, ao passar por um lugar chamado Pai da Tocandeira,
reconhece suas raízes e chora: a maloca da tribo era agora uma tapera
arruinada. Uma sombra leprosa devora seus irmãos e a princesa, e
o herói fica “defunto sem choro, no abandono completo”, empaludado
e sem forças para construir uma oca. Ata sua rede em dois cajueiros
no alto da barranca junto do rio e assim passa seus dias “caceteado e comendo
cajus”. Todas as aves também o abandonam, ficando somente um papagaio
pra quem o herói conta todos os casos que lhe tinham acontecido.
Graças a este papagaio é que se salvou do esquecimento a
história do herói, parido por uma índia tapanhumas.
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Capítulo XVII – Ursa
maior
Num dia
de janeiro de muito calor, o herói acorda sentindo umas “cosquinhas”,
que até lhe parecem feitas “por mãos de moça”. Era
a última vingança de Vei, a Sol, tramando para liquidá-lo
de vez. Macunaíma lembra-se de que há muito não brincava
e vai tomar banho num lagoão, pensando que a água fria viria
amortecer seus desejos de amor. O herói, encaminhando-se para a
água, enxerga lá no fundo “uma cunhã lindíssima”,
ora branca de cabelos louros, ora morena de cabelos negros, que começa
a tentá-lo com danças e meneios. Macunaíma hesita,
temeroso, mas acaba mergulhando na lagoa, desvairado pelos encantos irresistíveis
da uiara. Esta o mutila, devorando-lhe uma perna, os brincos, os cocos-da-baía,
as orelhas, os dedões, o nariz e os beiços. Desaparece também
com sua muiraquitã: o herói pula e dá “um grito que
encurtou o tamanho do dia”. Tem ainda força para lançar plantas
venenosas no lagoão, matando peixes, piranhas e botos que lá
estavam. No afã de recuperar seus tesouros, Macunaíma abre-lhe
as barrigas e o que encontra reprega no corpo mutilado, com sapé
e cola de peixe. Não consegue, todavia, reconquistar a perna nem
a muiraquitã, “engolidas pelo monstro Ururau”. E assim tudo se acaba.
Macunaíma, mutilado, vai bater na casa do Pai Mutum, que, com dó
dele, faz uma feitiçaria e transforma-o na constelação
da Ursa Maior. “Ia pro céu viver com a marvada. Ia ser o brilho
bonito mas inútil porém de mais uma constelação.”
Neste balanço que Macunaíma faz de sua existência,
ele dialoga com sua consciência e deixa sua mensagem para a posteridade:
“Não vim no mundo para ser pedra”. A pedra simboliza disciplina
rígida, método, lapidação de caráter,
traços que Macunaíma, a própria encarnação
da esperteza e da improvisação, nunca quis assumir.
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Epílogo
“Acabou-se
a história e morreu a vitória”. Os filhos da tribo dos Tapanhumas
“se acabaram de um em um”. “Uma feita um homem foi lá” e, rompendo
o “silêncio enorme” que “dormia à beira-rio do Uraricoera”,
ouve-se:
-- “Curr-pac, papac! curr-pac,
papac!…”
Era o
papagaio ao qual Macunaíma havia contado toda a sua história.
“Então o pássaro principiou falando numa fala mansa, muito
nova, muito!”
“Tudo ele contou pro homem e depois
abriu asa rumo de Lisboa. E o homem sou eu, minha gente, e eu fiquei pra
vos contar a história. Por isso que vim aqui. Me acocorei em riba
destas folhas, catei meus carrapatos, ponteei na violinha e em toques rasgado
botei a boca no mundo cantando na fala impura as frases e os casos de Macunaíma,
herói da nossa gente”. Era o próprio Mário de Andrade.
“Tem mais não”.
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