Lenda da Manguda
Nos últimos anos do século passado, mais um per sonagem lendário
foi
incorporado às noites de' São Luís, trazendo pavor
e sobressalto às crianças e
a considerável parte da população adulta da pacata
e ainda mal-iluminada
cidade provinciana. Deu origem à lenda a farsa idealizada e mandada
executar
por comerciantes envolvidos no contra bando de mercadorias - principalmente
tecidos europeus - introduzidas na praça local sem o pagamento dos
tributos
devidos.
Para ludibriar a fiscalização, diversos portos alternativos
foram usados. Mas a
vigilância das autoridades punha em sérios riscos as descargas,
não raro
descobertas e frustradas por flagran tes e apreensões. O porto do
Jenipapeiro,
nas imediações da Quinta Vitória, em que residia,
o poeta Joaquim de
Sousândrade, apresentava-se como excelente opção, já
que para lá não se
dirigiam as patrulhas de policiamento. As autoridades jogavam desnecessária
a providência, considerando o local suficiéntemente protegido
pela guarnição
permanente da Penitenciária, localizada onde hoje se acha o Hospital
Presidente Dutra.
O bairro dos Remédios passou, então, a ser o ponto predileto
das aparições de
uma figura fantasmagórica, logo batizada por Manguda, em virtude
de trajar
chambre alvo, de mangas muito largas e compridas. O rosto era dissimulado
por máscara, e da cabeça nascia uma nuvem de fumaça.
Acerca da Manguda, os jornais da Cidade publicaram diversas noticias e
comentários. Jerônimo de Viveiros recolheu à sua valio
sa História do comércio
do Maranhão estes versos transcritos do jornal A Cruzada. Não
informa o
historiador maranhense a data da publicação, nem se a transcrição
é integral.
Diz, porém, que a autoria é atribuida a Luís Domingues:
Era noite e já bem tarde,
Singrava as águas do Anil
Batel veleiro, apressado,
Chegando à praia sutil.
Receosos, caminhavam,
Como se andassem à toa
Espreitando a sentinela,
Postada junto à Camboa.
Pobre soldado bisonho,
Aturdido e tresnoitado,
Viu crescer a bicha horrenda
E ficou desnorteado.
Saltaram fora os remeiros,
Descarregaram o batel
De fardos, mercadorias,
Prestes juntaram o farnel;
Alerta estou! Brada ela,
Quando a Manguda velhaca
Passou-lhe diante dos olhos,
Nas costas levando a maca
Não lhe valeu a "Comblain",
Do sabre nem se lembrou.
Caiu prostrado no chão,
E não mais, - alerta estou!