1. AS NOVAS TECNOLOGIAS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO E A EMERGÊNCIA DA SOCIEDADE INFORMACIONAL *
Autora: Cláudia Marin da Silva
* Este texto faz parte da monografia de conclusão do curso de Especialização em Pensamento Político Brasileiro, defendida na UFSM em 28.03.2006, intitulada: “Tecnologias de informação e comunicação e suas implicações para p exercício da nova cidadania”.
Orientador: Prof. Dr.
Holgonsi Soares Gonçalves Siqueira
Por muito tempo, a velocidade de propagação de conhecimentos e informações e a troca de experiências entre os diversos indivíduos ou entre grupos distintos eram demasiadamente lentas. Com o passar dos anos, uma grande transformação mudou esse panorama pré-histórico: a Revolução Agrícola. As mudanças resultantes desse processo foram profundas e, dentre elas, a domesticação de animais teve um significado essencialmente importante: o deslocamento humano por longas distâncias foi incrivelmente facilitado. E, nesse contexto, a velocidade de propagação de conhecimentos e informações começava a se acelerar.
Posteriormente, uma nova revolução, iniciada em algumas poderosas e influentes nações da época, apresentou-se aos diferentes continentes: a Revolução Industrial. O aparecimento das máquinas a vapor e um pouco mais tarde dos trens e em seguida dos automóveis consolidaram o domínio dos homens sobre as máquinas. Um pouco mais tarde, conhecido o eletromagnetismo, a velocidade de propagação de informações atingiu níveis espantosos, devido ao uso do telégrafo e do telefone.
Mais recentemente, o surgimento de computadores pessoais, com suas redes de comunicação globais como a Internet, coloca a humanidade frente a uma nova onda de transformações. As luzes que se acendem são de uma era em que bits valem mais que átomos e que bens materiais não são mais garantia de poder e riqueza. Atualmente, a expressão “tempo real” aparece com freqüência dando a idéia da velocidade que corre a informação através dos canais de comunicação que envolvem o globo.
Portanto, após a Revolução Agrícola e a Revolução Industrial, o homem vive ultimamente a revolução do conhecimento. Não há atividade humana que resista a esse período de transição. O impacto das redes de computadores, da microeletrônica, das telecomunicações é total e pode ser sentido no trabalho, na educação, na economia, no entretenimento, nas artes, ou seja, em todas as esferas sociais. Assim sendo, o homem, segue como parte integrante, por um lado passivo e por outro atuante, nesse cenário de singularidade e de intensas mudanças tecnológicas. Desse modo, a sociedade, segundo alguns, autores é “pós-industrial” ou “informacional” e vive-se, hoje, o que se chama de “era da informação”.
O microchip marcou, da mesma forma como a máquina a vapor, a eletricidade e a linha de montagem em outros tempos, um avanço único no desenvolvimento tecnológico da humanidade.
Da nova economia, saem a linha de produção, os carros, o aço, a produção em massa, o marketing de massa e a mídia de massa, que distribuíam seus produtos derivados de grandes indústrias, estúdios e editoras, para entrarem os websites, rápidos como a luz numa fibra óptica, com seus conteúdos especializados e customizáveis, milhares deles, a poucos cliques de um mouse, bastando estar conectado ao ciberespaço1.
Nesse contexto, vive-se um momento em que ocorre uma transformação de nossa cultura material pelos mecanismos de um novo paradigma tecnológico que se organiza com base nas tecnologias de informação.
O processo contemporâneo de transformação tecnológica, de acordo com Castells (1999, p. 68), “expande-se exponencialmente em razão de sua capacidade de criar uma interface entre campos tecnológicos mediante uma linguagem digital comum na qual a informação é gerada, armazenada, recuperada, processada e transmitida”. Assim, é possível afirmar que interagimos em um mundo que se tornou digital.
Desse modo, a história da revolução da tecnologia da informação é relatada por diversos autores, dentre eles destaco Castells (1999) e Lévy (1999), os quais abordam e evidenciam em suas análises as transformações sociais, culturais e econômicas que penetram e difundem-se em todos os campos da atividade humana, devido, primordialmente, à propagação e ao uso das novas tecnologias de informação pelos indivíduos.
Nesse primeiro momento, farei um breve resgate histórico da emergência do ciberespaço, nos principais eixos da transformação tecnológica em geração, processamento e transmissão da informação, explicitando e enfatizando o contexto global em que se está inserido atualmente.
De acordo com Lévy (1999), os primeiros computadores (calculadoras programáveis) surgiram na Inglaterra e nos Estados Unidos em 1945. Por muito tempo, reservados aos militares para cálculos científicos, seu uso civil disseminou-se durante os anos seguintes.
Os historiadores lembram, conforme Castells (1999), que o primeiro computador eletrônico pesava 30 toneladas, foi construído sobre estruturas metálicas com 2,75 m de altura, tinha 70 mil resistores e 18 mil válvulas a vácuo e ocupava a área de um ginásio esportivo. Escreve Castells (1999), que quando ele foi acionado, seu consumo foi tão alto que as luzes da Filadélfia piscaram.
Tecnicamente, um
computador é uma montagem particular de unidades de processamento, de
transmissão, de memória e de interfaces para entrada e saída de informações,
por isso ele pode ser encontrado em qualquer lugar onde a informação digital
seja processada automaticamente. Conectado ao ciberespaço,
Um computador pode recorrer as capacidades de memória e de cálculo de outros computadores da rede (que, por sua vez, fazem o mesmo), e também a diversos aparelhos distantes de leitura e exibição de informações. Todas as funções da informática são distribuíveis e, cada vez mais, distribuídas. O computador não é mais um centro, e sim um nó, um terminal. (...) No limite, há apenas um único computador, mas é impossível traçar seus limites, definir seu contorno. É um computador cujo centro está em toda parte e a circunferência em lugar algum, um computador hipertextual, disperso, vivo, fervilhante, inacado: o ciberespaço em si. (Lévy, 1999, pg. 44).
A partir dos anos 70, com a invenção do microprocessador, que é o computador em um único chip, houve uma emergência crescente de diversos processos econômicos e sociais de grande amplitude. Porém, destaco que foi só a partir dessa década que as novas tecnologias de informação difundiram-se amplamente, acelerando seu desenvolvimento sinérgico e convergindo a esse novo paradigma já referido.
Após esses processos, aconteceu um crescimento na produção industrial: robótica, linhas de produção flexíveis, máquinas industriais com controles digitais, etc.
Em meados de 1980, um movimento social nascido na Califórnia apossou-se das novas possibilidades técnicas e inventou o Computador Pessoal (PC) que, na verdade, se tornou o nome genérico dos microprocessadores.
Aqui, considero
necessário abordar o ponto de partida da globalização,
que foi recorrente ao processo de internacionalização da economia mundial,
ininterrupta desde a Segunda Guerra Mundial, pois foi a partir da década de 80
que se iniciou uma nova história: o mundo industrial foi sacudido por uma
profunda reestruturação capitalista, sustentada tecnicamente na revolução da
informática e das comunicações, devido à descentralização espacial dos
processos produtivos, assim, como afirma Vieira (1998, p. 75) “a nova
tecnologia influi em todos os campos da vida econômica e revoluciona o sistema
financeiro, pela conexão eletrônica dos distintos mercados”.
Desse modo, está havendo um redimensionamento
das noções de espaço-tempo, uma vez que, através do uso das TIC(s),
notícias dão a volta ao mundo, capitais entram e saem de um país por
transferências eletrônicas, novos produtos são fabricados em muitos países e
nenhum deles isoladamente.
Nesse sentido, as TIC(s) geram a capacidade do global e do local se interpenetrarem e de funcionarem em tempo real, em escala planetária. Essa influência recíproca gera uma das fontes de dinamismo da modernidade, o que é intrinsecamente globalizante.
As descobertas básicas nas tecnologias de informação, de acordo com Castells (1999), têm algo de essencial em comum: embora baseadas principalmente nos conhecimentos já existentes e desenvolvidas como uma extensão das tecnologias mais importantes, essas tecnologias representaram um salto qualitativo na difusão maciça da tecnologia em aplicações comerciais e civis, devido a sua acessibilidade e custo cada vez menor, com qualidade cada vez maior.
A partir da
década mencionada acima, de acordo com Castells (1999), a Revolução da
Tecnologia da Informação contribuiu para a formação dos meios de inovação em
que as descobertas e as aplicações interagiam e eram testadas em um repetido
processo de tentativa e erro: aprendia-se fazendo.
Esses
ambientes exigiam, apesar da atuação on-line, concentração espacial de
centros de pesquisa, instituições de educação superior, empresas de tecnologia
avançada, uma rede auxiliar de fornecedores, provendo bens e serviços e redes
de empresas com capital de risco para financiar novos empreendimentos. Uma vez
que um meio esteja consolidado, como o Vale do Silício na época referida, ele
tende a gerar sua própria dinâmica e atrair conhecimentos, investimentos e
talentos de todas as partes do mundo.
Desde então, o computador escapou do serviço de dados das grandes empresas e dos programadores profissionais para tornar-se, de acordo com Lévy (1999, p. 31 e 32) “um instrumento de criação (de textos, de imagens, de músicas), de organização (bancos de dados, planilhas), de simulação (planilhas, ferramentas de apoio à decisão, programas para pesquisa) e de diversão (jogos)” de uma proporção crescente da população de países, que Lévy coloca como desenvolvidos.
Nessa mesma idéia, Castells (1999) se posiciona sobre o assunto, colocando que a comunicação mediada por computadores é uma revolução que se desenvolve em ondas concêntricas, começando nos níveis de educação e riqueza mais altos e provavelmente (grifo meu) incapaz de atingir grandes segmentos de massa sem instrução, bem como países pobres.
Ao que tudo indica, a vida digital em
termos de informação será cada vez mais modelável pelo usuário que poderá
decidir de forma personalizada o momento mais adequado para a sua interação,
uma vez que novas ferramentas estão sendo criadas e disponibilizadas na web
e que podem ser acessadas de qualquer lugar do mundo, bastando que o usuário
disponibilize dos recursos necessários para tal tarefa.
Em relação à cibercultura, entendo que Lévy (1999) a traduz como um conjunto de técnicas (materiais e intelectuais), de práticas, de atitudes, de modos de pensamento e de valores que se desenvolvem juntamente com o crescimento do ciberespaço. Desse modo, o ciberespaço é a chamada “rede”, a web ou ainda a internet.
Essa conjuntura atual tem influência direta e indireta na economia mundial. Desse modo, as transformações do capitalismo têm levado autores como Castells (1999), Alain Touraine (1969) e Daniel Bell (1973), a afirmar que a economia, na segunda metade do século XX, passou de um modelo de produção industrial para outro baseado na informação, trazendo com isso diversas implicações sociais, políticas, culturais e educacionais.
O modelo capitalista adotado pelos países centrais até a década de 60, conhecido como economia industrial, baseava-se no princípio de desenvolvimento econômico “taylorista/fordista”. A partir do final da década mencionada, iniciou-se a configuração de um outro padrão de acumulação de capital, chamado por Touraine (1969) e Bell (1973) de economia pós-industrial e por Castells (1999) de economia informacional, cujo princípio produtivo foi o “toyotista”.
O princípio “taylorista/fordista”, de base eletromecânica rígida, caracteriza-se pela produção em massa e em série de mercadorias padronizadas, aspectos que demandam dos trabalhadores capacidades cognitivas relacionadas à memorização de conhecimentos e repetição de procedimentos numa determinada seqüência; além disso, exigiam ainda a uniformização de respostas, a separação entre tempos de aprender e tempos de repetir procedimentos práticos.
Quanto à dimensão ideológica das relações de produção, o controle se dá mediante a fiscalização externa, através da presença de inspetores, gerentes, supervisores, presentes no interior do espaço produtivo.
Entretanto, de acordo com Castells (1999):
Quando a demanda de quantidade e qualidade tornou-se
imprevisível, quando os mercados ficaram mundialmente diversificados e,
portanto, difíceis de ser controlados, e quando o ritmo da transformação
tecnológica tornou obsoletos os equipamentos de produção com objetivo único, o
sistema de produção em massa ficou muito rígido e dispendioso para as
características da nova economia. O sistema
flexível surgiu como uma possível resposta para superar essa rigidez. (pg.
212)
Assim, foi nessa reestruturação econômica e com o surgimento das TIC(s) com suas características peculiares, com ênfase na desterritorialização, na flexibilidade, nos espaços de fluxos e na lógica de redes que a produção em massa e a centralização do saber ficaram ultrapassados, fazendo com que surgisse um novo modelo de produção adaptado à economia global e ao sistema produtivo flexível, sendo este, o “toyotismo”.
Esse novo modelo (“toyotista”), caracterizado por Castells (1999, p. 216) como um “sistema de gerenciamento mais destinado a reduzir incertezas que a estimular a adaptabilidade”, de base microeletrônica flexível (sendo que esta flexibilidade está no processo e não no produto) possuí características como a produção de mercadorias não padronizadas, cuja qualidade é determinada pela demanda imediata do mercado consumidor.
Portanto, esse “novo” modelo de acumulação de capital demanda dos produtores diretos de mercadorias outras capacidades cognitivas, tais como a integração entre pensamento e ação, a capacidade de comunicar-se adequadamente, autonomia intelectual e moral, criatividade e flexibilidade.
Foi nesse sistema econômico que, conforme Castells (1999), a comunicação on-line e a capacidade de armazenamento computadorizado tornaram-se ferramentas poderosas no desenvolvimento da complexidade dos elos organizacionais entre conhecimentos tácitos e explícitos, uma vez que uma empresa ¨criadora de conhecimentos¨ baseia-se na interação organizacional entre os conhecimentos explícitos e os conhecimentos tácitos para atuar como fonte de inovação.
Como fator histórico determinante para o surgimento da sociedade informacional tem-se a reestruturação e expansão do sistema econômico capitalista sendo a nova economia, econômica e tecnológica, denominada por Castells de ‘capitalismo informacional’[2].
Assim, pode-se dizer que surge uma economia em rede, interdependente, que aplica seu progresso em tecnologia, conhecimento e administração na própria economia, conhecimento e administração, formando um círculo de interação que age sobre todos os domínios das atividades humanas. Sobre esse aspecto, saliento que as TIC(s) tornaram-se indispensáveis, pois são elas que possibilitam o estabelecimento de conexões infinitas, aspecto este central para o novo modelo de produção.
A produtividade e o crescimento econômico na economia informacional passaram a depender mais da qualidade da ciência, da tecnologia, da informação e da gestão, do que do aumento quantitativo de capital e trabalho como ocorria no modelo anterior, isso porque o que se busca nesse novo modelo é a cooperação, a inovação e a redução de incertezas, pois a base está no aumento de troca de todas as formas de conhecimentos, ou seja, requer a participação de todos no processo de inovação, já que apenas dessa forma, de acordo com Castells (1999, p. 217), “é racional que um indivíduo transfira seus conhecimentos para a empresa, e a empresa transfira seus conhecimentos explícitos entre seus trabalhadores”.
Nesse sentido, a sociedade, as empresas e as instituições estão tendo que mudar seu modelo organizacional para poder adaptar-se às condições de imprevisibilidade introduzidas pela rápida transformação econômica e tecnológica, sendo que esta tem como princípio a formação de redes com base na flexibilidade e o trabalho on-line, o qual liga unidades em rede em tempo real, fazendo com que opere uma mudança na nova economia global em que as empresas têm que se tornar mais eficientes, priorizando as competências e as habilidades cognitivas de seus trabalhadores, bem como a capacidade de processar informação.
Para que esse novo modelo de produção funcione, as novas TIC(s) são decisivas, uma vez que, como evidencia Castells (1999, p. 108), “as informações circulam pelas redes: redes entre empresas, redes dentro de empresas, redes pessoais e redes de computadores”. Entretanto, com a crescente interconectividade e a extrema descentralização dos processos na economia global, as empresas em redes fragmentadas e descentralizadas têm mais possibilidades de fracassos se não fizerem uso da adaptabilidade além da flexibilidade.
Desse modo, o que se tem que ter como base no novo modelo de economia informacional, conforme Castells (1999, p. 38) é a “descentralização, participação e coordenação” para assegurar tanto a inovação como a continuidade em um ambiente em rápido crescimento.
De acordo com as idéias acima, estou procurando evidenciar que essa nova economia informacional exige novas capacidades no mundo do trabalho, nas instituições públicas e privadas, com ou sem fins lucrativos e, principalmente, faz com que os indivíduos tenham que desenvolver novas habilidades para poder interagir nessa realidade que prima por flexibilidade, autonomia, gestão e troca de conhecimentos, além de domínio técnico para o uso das tecnologias, como o computador, com suas lógicas de redes e o espaço de fluxos.
Nessa perspectiva, ao considerar as disputas e interesses que marcaram e que marcam a economia mundial, é possível que, no processo de transição entre o primeiro e o segundo modelos de acumulação capitalista relacionados acima, existam tensões, uma vez que o domínio de ciência e tecnologia tem implicações diretas sobre a divisão internacional do trabalho.
Assim sendo, na fase do industrialismo, os processos tecnológicos eram direcionados para o crescimento econômico a partir da otimização da produção; já a fase do informacionalismo objetiva o acúmulo de conhecimentos e maior grau de complexidade no processamento da informação como meios de alcançar a máxima evolução tecnológica.
Baseada nisso, a sociedade contemporânea está sendo remodelada através de uma intensa revolução tecnológica que tem como ferramenta primordial as tecnologias da informação. Essa revolução tem se processado em ritmo acelerado e por toda parte, o que se observa, é o surgimento de uma nova forma de relação entre a economia, o Estado e a sociedade.
Nessa nova economia, como foi sublinhado acima, até o próprio capitalismo está sofrendo um processo de reestruturação com a organização das empresas em redes, a descentralização de suas atividades e a integração dos mercados financeiros. Assim, emerge uma economia em rede profundamente interdependente que se torna cada vez mais capaz de aplicar seu progresso em tecnologia, conhecimento, produtividade, lucratividade e competitividade.
Assim,
a nova economia, ou seja, a economia informacional é global, com capacidade de
funcionar em tempo real, em escala planetária, intensificando as relações
sociais, usando como ferramenta primordial as novas tecnologias, dentre elas a
internet.
Trata-se, portanto, de uma economia
informacional e global que, na perspectiva de Castells, apresenta as seguintes
características:
É informacional porque a produtividade e
competitividade das unidades ou agentes desta economia (quer sejam empresas,
regiões ou nações) dependem fundamentalmente da sua capacidade de gerar,
processar e aplicar com eficácia a informação baseada no conhecimento. É global
porque a produção, o consumo e a circulação, assim como os seus componentes
(capital, mão de obra, matérias-primas, gestão, informação, tecnologia,
mercados) estão organizados à escala global, quer de forma direta, quer
mediante uma rede de vínculos entre os agentes econômicos. É informacional e
global porque, nas novas condições históricas, a produtividade gera-se e a
competitividade exerce-se por intermédio de uma rede global de interação.
(1997: 93).
No que diz respeito à sociedade informacional, esta, de
acordo com Castells (1999, p. 57), “apresenta variação histórica considerável
nos diferentes países, conforme sua história, cultura, instituições e relação
específica com o capitalismo global e a tecnologia informacional”. A
emergência do informacionalismo como nova base material, tecnológica da
atividade econômica e da organização social age em diferentes tipos, em
cenários diferentes e com expressões culturais e institucionais específicas,
visto que todas as sociedades são afetadas pelo capitalismo e informacionalismo
gerados pelo contexto atual.
Considero fundamental fazer aqui uma distinção entre “sociedade da informação” e “sociedade informacional”, que, na teoria de Castells (1999), apresentam as seguintes definições:
O termo sociedade da informação enfatiza o papel da informação na sociedade. Mas afirmo que informação, em seu sentido mais amplo, por exemplo, como comunicação de conhecimentos, foi crucial a todas as sociedades, inclusive à Europa medieval que era culturalmente estruturada e, até certo ponto, unificada pelo escolasticismo, ou seja, no geral uma infra-estrutura intelectual. Ao contrário, o termo informacional indica o atributo de uma forma específica de organização social em que a geração, o processamento e a transmissão da informação tornam-se as fontes fundamentais de produtividade e poder devido às novas condições tecnológicas surgidas nesse período histórico. (1999: 65)
Desse modo, conhecimentos e informação[3] são elementos cruciais em todos os modos de desenvolvimento, visto que o processo produtivo sempre se baseia em algum grau de conhecimento e no processamento da informação. A diferença na sociedade informacional é a ação de conhecimentos sobre os próprios conhecimentos como principal fonte de produtividade.
A expansão das TIC(s) na sociedade informacional, portanto, objetiva intensificar a socialização global das últimas décadas, tornando possível uma maior diversificação da produção[4] econômica, social e cultural, bem como sua penetrabilidade em todos os domínios da atividade humana, servindo de base para a geração, armazenamento, recuperação, processamento e expansão da informação, em que o fundamento principal é a transmissão do conhecimento em geral.
Entretanto, é preciso atentar-se para as diversificações culturais e históricas de cada povo, o que faz com que cada sociedade sofra influências e transformações diferenciadas, gerando configurações especificas. Em um contexto globalizado, as tecnologias de informação e comunicação, na perspectiva de Guiddens (1991, p. 75) “ligam localidades distantes de tal forma, que acontecimentos locais são modelados por eventos ocorrendo à milhas de distância e vice-versa”, ou seja, pode-se dizer que tudo e todos estão conectados interferindo e modificando seu meio social, econômico, político, cultural e institucional.
Porém, penso que ainda se precisa saber como aproveitar os benefícios sociais e culturais de toda a informação que circula em rede, nas sociedades conectadas em escala mundial, uma vez que a revolução da tecnologia tem sua penetrabilidade em todas as esferas da atividade humana e, nesse sentido, acaba por difundir-se pelas culturas mais significativas da sociedade e, a partir disso, propaga-se por diferentes países, várias culturas e organizações diversas que se apropriam da inovação tecnológica utilizando-a em todo o seu potencial.
Todavia, é preciso ficar esclarecido que, de acordo com Castells (1999), a tecnologia não determina a sociedade, nem a sociedade escreve o curso da transformação tecnológica, visto que muitos fatores, inclusive criatividade e iniciativa empreendedora, intervêm no processo de descoberta científica, inovação tecnológica e aplicações sociais, de forma que o resultado final depende de um complexo padrão interativo.
Desse modo, pode-se dizer que há uma interação dialética entre a sociedade e a tecnologia, pois a tecnologia incorpora a sociedade, mas não a determina. Da mesma forma, a sociedade utiliza a inovação tecnológica, também não a determinando, deste modo, o dilema do determinismo tecnológico é um problema infundado, dado que a tecnologia é a sociedade, e a sociedade não pode ser entendida ou representada sem suas ferramentas tecnológicas.
Nesse contexto, vivencia-se uma nova economia em que a sociedade informacional surge com velocidade e mobilidade surpreendentes na qual o homem é obrigado a abdicar da rigidez das atitudes, idéias e tipos de comportamentos fundamentados no sistema de valores tradicionais, fazendo com que as mudanças operem em todos os sentidos de sua vida sem ao menos ter consciência real disso, ou seja, a realidade em que estamos inseridos atualmente altera nossas próprias vidas, de forma muito veloz sem que, às vezes, seja perceptível.
Dentro de uma perspectiva econômica, as tecnologias, ao propiciarem, no final do século XX, que a economia mundial conseguisse tornar-se verdadeiramente global, evidenciaram novas forças que operam na atual ordem mundial, denominadas pela economia capitalista de neoliberais. O setor da tecnologia da informação, cada vez mais organizado ao redor da Internet, conectando eletronicamente o mercado financeiro global, tornou-se a fonte suprema dos investimentos e da geração de valor para toda a economia.
A nova economia afeta a tudo e a todos, mas é
inclusiva e exclusiva ao mesmo tempo, os limites da inclusão variam em todas as
sociedades, dependendo das instituições, das políticas e dos regulamentos. Por
outro lado, a volatilidade financeira sistêmica traz consigo a possibilidade de
repetidas crises financeiras com efeitos devastadores nas economias e nas
sociedades. (Castells, 1999, p. 203).
Conseqüentemente, a nova economia não deixa de ter falhas e riscos, prosperidades e crises. Todavia, através do informacionalismo, do qual a criação de redes é o atributo fundamental, a partir do processo de globalização que expressa uma grande mudança estrutural, as economias e as sociedades procuram seus caminhos específicos para realizar a transição para essa nova modalidade de desenvolvimento.
Nessa perspectiva, o que se observa nessa nova sociedade é a ruptura de paradigma até então baseado nas sociedades nacionais, por um novo modelo tecnológico, que possuí distintos aspectos centrais que são a base material da sociedade informacional. Com base na teoria de Castells (1999), quero destacar aqui as características do novo paradigma tecnológico que são considerados fundamentais na análise do meu tema de pesquisa.
Portanto, a primeira característica do novo paradigma é baseada na informação como matéria-prima, ou seja, é possível afirmar que são tecnologias para agir sobre a informação e não apenas informação para agir sobre a tecnologia, como foi o caso das revoluções tecnológicas anteriores. O segundo aspecto deste novo modelo refere-se à penetrabilidade dos efeitos das novas tecnologias, uma vez que a informação é uma parte integral de toda atividade humana, todos os processos de nossa existência individual e coletiva são diretamente moldados (contudo, não determinados) pelo novo meio tecnológico. A terceira característica da sociedade informacional diz respeito a sua organização estrutural em forma de rede. Assim, é interessante observar que essa lógica de redes é adaptada à crescente complexidade de interação e aos modelos imprevisíveis do desenvolvimento derivado do poder criativo dessa interação, ou seja, é perceptível que há uma lógica de redes em qualquer sistema ou conjunto de relações, usando essas novas tecnologias de informação.
Entretanto, outros elementos
que intervêm no processo, como o Estado e a sociedade, apresentam graus de
complexidade organizacional que extrapolam a lógica das redes, mesmo sendo
influenciados por esse novo modelo da estrutura social.
Desse modo, o que se observa, referente aos sistemas de redes, mas sendo um aspecto claramente distinto, é que o paradigma da tecnologia da informação é baseado na flexibilidade, ou seja, não apenas os processos são reversíveis, mas instituições e organizações podem ser modificadas e até mesmo fundamentalmente alteradas pela reorganização de seus componentes.
E por fim, uma última característica desse novo modelo tecnológico refere-se à crescente convergência de tecnologias específicas para um sistema altamente integrado, no qual trajetórias tecnológicas antigas ficam literalmente impossíveis de se distinguir em separado. Assim, a microeletrônica, as telecomunicações e os computadores são todos integrados no sistema de informação.
De acordo com essas características, Castells (1999) resume o paradigma das TICs, dizendo que o mesmo
(...) não evolui para seu fechamento como um
sistema, mas rumo a abertura como uma rede de acessos múltiplos. É forte e
impositivo em sua materialidade, mas adaptável e aberto em seu desenvolvimento
histórico. Abrangência, complexidade e disposição em forma de rede são seus
principais atributos. (Castells, 1999, p. 113).
Nessa conjuntura, a dimensão social da Revolução da Tecnologia de Informação, ao que parece, não é boa e nem ruim, mas, principal e indiscutivelmente, não é neutra. Portanto, é uma força que está, mais do que nunca, sob o atual paradigma tecnológico, enraizado profundamente na vida e na mente dos cidadãos da atual sociedade.
Conforme Lévy (1999), em uma perspectiva social, o que interessa é o uso das tecnologias de informação e comunicação na sociedade, bem como a intervenção do cidadão na manipulação e na apropriação da mesma. Segundo ele:
As projeções sobre os usos sociais do virtual
devem integrar o movimento permanente de crescimento de potência, de redução
nos custos e de descompartimentalização. Tudo nos leva a crer que estas três
tendências irão continuar no futuro. Em contrapartida, é impossível prever as
mutações qualitativas que se aproveitarão desta onda, bem como a maneira pela
qual a sociedade irá aproveitar-se delas e alterá-las. É neste ponto que
projetos divergentes podem confrontar-se, projetos indissoluvelmente técnicos,
econômicos e sociais. (1999, p. 33).
O surgimento das novas tecnologias também fez com que os abismos sociais ficassem cada vez maiores. Nesse contexto, é preciso perceber como a sociedade discute, altera e intervém na apropriação das novas TIC(s), uma vez que a difusão destas amplia seu poder à medida que os usuários se apropriam dela e a redefinem. Sob esse aspecto, as novas tecnologias de informação e comunicação não são simplesmente ferramentas a serem aplicadas, mas processos a serem desenvolvidos, numa relação muito próxima entre processos de criação e utilização.
Esse novo sistema tem sua lógica própria com base na capacidade de transformar toda a informação em uma linguagem comum, processando-a em velocidade cada vez maior e com custo cada vez mais reduzido.
Tudo muda muito rápido, valores se
desfazem e/ou se modificam, dissolvem-se fronteiras e desenraizam-se as coisas,
as gentes e as idéias, trazendo com isso, diferentes implicações sociais em que
emergem novas formas de participação dos cidadãos, bem como busca-se
sensibilizar as pessoas, cada vez mais, para questionar, intervir e buscar de
forma autônoma a apropriação das novas ferramentas tecnológicas.
Assim
sendo, ao considerar a importância
da autonomia, do exercício da
cidadania, da capacidade de escolher e decidir na sociedade atual, destaco
a importância das novas TIC(s) e a necessidade de se discutir e agir no que
tange à inclusão digital. O não acesso da população às novas tecnologias está
sendo responsável pelo surgimento de um novo grupo: os excluídos digitais e,
nesse contexto, a autonomia, a cidadania, as escolhas e as decisões dos
indivíduos ficam bastante comprometidas.
1
Lévy (1999) define ciberespaço como o espaço de
comunicação aberto pela interconexão mundial dos computadores e das memórias
dos computadores. Essa definição inclui o conjunto dos sistemas de comunicação
eletrônicos (...), na medida em que transmitem informações provenientes de
fontes digitais ou destinadas à digitalização. Esse autor insiste na
codificação digital, pois ela condiciona o caráter plástico, fluido, calculável
com precisão e tratável em tempo real, hipertextual, interativo e, resumindo,
virtual da informação que é a marca distintiva do ciberespaço. Neste sentido, o
ciberespaço permite a combinação de vários modos de comunicação. É possível
encontrar, graus de complexidade crescente: o correio eletrônico, as
conferências eletrônicas, o hiperdocumento compartilhado, os sistemas avançados
de aprendizagem ou de trabalho cooperativo e, enfim, os mundos virtuais
multiusuários.
[2] Castells (1999) caracterizou este Capitalismo Econômico como um processo de reestruturação capitalista, empreendido desde os anos 80, em que uniu sua forma tradicional de organização econômica em redes de empresas às ferramentas da tecnologia da informação. Assim, para que se faça o entendimento, no âmbito econômico, uma série de reformas, tanto no campo das instituições como do gerenciamento empresarial, visavam quatro objetivos principais: aprofundar a lógica capitalista de busca de lucro nas relações capital/trabalho, aumentar a produtividade do trabalho e do capital, globalizar a produção, circulação e mercados, aproveitando a oportunidade das condições mais vantajosas para a realização de lucros em todos os lugares, e direcionar o apoio estatal para ganhos de produtividade e competitividade das economias nacionais, freqüentemente em detrimento da proteção social e das normas de interesse público. A inovação tecnológica e a transformação organizacional com enfoque na flexibilidade e na adaptabilidade foram absolutamente cruciais para garantir a velocidade e a eficiência da reestruturação. Deste modo, o informacionalismo está ligado à expansão e ao rejuvenescimento do capitalismo, como o industrialismo estava ligado a sua constituição como modo de produção.
[3] Para que se faça entendimento farei uma distinção
entre conhecimento e informação, na perspectiva teórica de Bell (1976) in Castells
(1999). Assim, conhecimento é um conjunto de declarações organizadas
sobre fatos ou idéias, apresentando um julgamento ponderado ou resultado
experimental que é transmitido a outros por intermédio de algum meio de
comunicação, de alguma forma sistemática. Deste modo, são diferenciados
conhecimentos de notícias e entretenimento. Enquanto que a informação é
a comunicação de conhecimentos, ou seja, são dados que foram organizados e
comunicados.
[4] Na perspectiva teórica de Castells (1999), produção é a ação da humanidade sobre a matéria (natureza) para apropriar-se dela e transforma-la em seu benefício, obtendo um produto, consumindo (de forma irregular) parte dele e acumulando o excedente para investimento conforme os vários objetivos socialmente determinados.