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*MOHA MUDGARA – BHAJA GOVINDAM*

Obra de: Adi Guru Shankaracharya

Tradução e comentário de Swami Hamsananda Saraswati

 

Moha significa ilusão, indica o estado torpe da mente iludida pela falta de conhecimento e capacidade de ver os elementos e suas substâncias como elas são em verdade. Mudgara quer dizer remover, portando “Removedor de Ilusão e Torpor Mental” é o título da obra. Em uma atitude saudavelmente sarcástica, Sri Shankaracharya entoa um ensinamento de Jnana Yoga, com conteúdo de grande sabedoria em uma canção inocente e infantil, com um ar de ingenuidade tribal interiorana, característica de muitas das canções devocionais com o nome de Bhajam, presentes na Índia desde os tempos mais remotos.  A atitude do Autor, na forma de construir a obra, ensina igualmente a instrução espiritual de Jnana Yoga contida no texto. Os mestres espirituais sempre ensinam de três maneiras, uma é o exemplo, a segunda a atitude e o terceiro a instrução verbal. Infelizmente o homem atual perdeu o hábito da leitura dos dois primeiros itens.

 

 

Como o texto é cantado em melodia, é também conhecido por Bhaja Govindam, ou a cantiga ao Supremo. Govindam é um mantra que invoca alegria e é ensinado às crianças. Com uma atitude de pura infantilidade, muitos Vaishanavas se aproveitam para distorcer o significado espiritual que ensina o Mestre em Sua atitude ao estruturar a apresentação do conteúdo da obra e argumentam que no final da vida Shankaracharya teria se tornado devoto de Krishna e abandonado sua atitude Aduaita (os Vaishnavas são, em geral Duaitas) e tivesse indicado em Sua obra “Oh tolos adorem Govinda” (Bhaja Govindam). Mas tal argumento não procede e é uma visão infantil.

 

Este texto é o menor texto do Autor e foi o último de suas composições. Já no final de sua missão com seus discípulos e Mat, ou centros já definidos, com a congregação da Ordem Dashnami já implantada, Shankaracharia, em sua atitude de estruturar desta maneira o texto, na ordem em que Ele o montou, faz uma alegoria à sua sucessão discipular, uma saudação à nossa ordem e a nós todos em seu carinho e visão abrangente, com uma atitude de bênção, que aqui nos chega a todos neste momento por meio de Sua obra. Govinda Pada era o nome de Seu Guru, o texto começa com reverências devocionais ao Seu Guru, “BHAJA GOVINDAM” e continua com uma exposição em Satsangh para todos os presentes, ali estavam seus discípulos e na continuidade do texto temos uma mensagem de cada um de seus 14 discípulos, que foram os primeiros da Ordem. Nitidamente temos a presença do Guru, seu discípulo e os discípulos deste último.

 

 A parte do Texto que Sri Shankaracharya compôs por meio de um recital é denominada Duaadasa Manjarika Stotram. A parte onde consta stanzas de seus discípulos, inspirados por Seu Guru, no recital, é denominada, em seu compêndio, Chaturdasa Manjarika Stotram. Está presente a clara convocação, pelo Guru, para que todos nós possamos apresentar traduções de Suas obras, comentários, divulgação e novas obras para a Ordem.  

 

 

Bhaja Govindam adquiriu uma apresentação musical que se tornou tradicional na Índia, cantada também para as crianças. Seja lá quem for que escute, se encanta. Entretanto, o significado da atitude da obra, do texto e do exemplo do Mestre abrange a profundidade insondável das dimensões contidas na realização espiritual manifestas como verdadeira sabedoria e uma filosofia bem coesa.

 

A maneira de Sri Shamkara de apresentar este Texto expressa muita suavidade. O Satsangh em que o texto surgiu, ocorreu em Kashi (Benares, Varanassi), solo sagrado para nós, Terra para onde se dirigem os que querem deixar o corpo e se entregar para a dimensão eterna da conquista espiritual. Enquanto ali estava, Shankaracharya observou um senhor bem idoso estudando as complexas regras gramaticais de Panini para o idioma Samskrit, gastando horas a fio para esta finalidade. Tocado por esta cena em que o idoso perdia seu tempo com o mero exercício intelectivo enquanto lhe seria muito mais apropriado se ocupar em concentrar a sua mente naquilo em que jaz a esperança de paz e a transcendência de uma condição corpórea, muito pouco promissora, onde todos nós nos encontramos e só percebemos quando a morte se aproxima ainda mais. Shankara demonstra, em versos, a infantilidade de se ocupar com algo que não nos favoreça em nossa grande existência por vidas e suas transmigrações para uma condição onde o sofrimento e as limitações não se imponham com tanta brutalidade e menosprezo ao Ser que somos, cuja essência está livre e eternamente contente em sua natureza.

 

Que o Acharya de Shiva (Shankara é um de seus nomes) continue a nos conduzir da ignorância à luz da sabedoria, da existência eterna e pacífica.

 

TEXTO:

 

1.     Concentre-se na atitude de entoar o mantra do Guru e do Absoluto (Bhaja Govindam) e não haja como um tolo. Regras de gramática não poderão lhe ajudar no momento de dor, nem mesmo de sua morte.

2.     Não seja tolo! Deixe de lado a sua sede para conquistar a fortuna, conquistando o conhecimento Samskrit para pronunciar os mantras e aprender de textos que ensinam a atrair fortunas. Dedique o seu tempo para o que é real e verdadeiro, para se estabilizar na fonte disto tudo, na sua verdadeira essência, pois é Ela quem nos nutre sempre a todos aqui e além. Contente-se com seja lá o que vier oriundo das ações que já foram feitas no passado.

3.     Não fique tomado pela ilusão das paixões selvagens e sensualidade ao ver os encantos dos seios ou o corpo de uma mulher. Estas coisas não são nada mais do que as modificações da carne, ora nova, ora não. Nunca falhe em lembrar sempre a sua mente disto.

4.     A vida do ser humano é tão incerta quanto uma gota de chuva sobre a folha agitada do lótus. Saiba que todas as coisas contidas no mundo permanecem como uma oração à doença, ao ego e aos sofrimentos.

5.     Enquanto um homem é capaz de manter a sua família ele vê o afeto de todos à sua volta. Mas ninguém mais liga a mínima para ele quando o seu corpo fica envelhecido e curvado. 

6.     Enquanto o homem está vivo, todos os membros de sua família lhe indagam sobre o seu bem estar. Mas depois que a alma se despe de seu corpo, até mesmo a sua esposa sai correndo de medo do cadáver.

7.     A infância é desperdiçada no apego às brincadeiras. A juventude se perde no apego pelas mulheres. A velhice se vai ocupada com os pensamentos do passado. Mas dificilmente há alguém que queira se “perder” na vivência do Ser imortal.

8.     Quem é a sua esposa? Quem é o seu filho? Estranho é este “sansara” (existência efêmera). A quem você pertence? De onde você surgiu? Irmão, pondere sobre estas verdades aqui.

9.     Por meio de Satsangh (encontros com a verdade, a companhia com sábios) se cultiva o não-apego, do não-apego vem a liberdade da ilusão, que conduz á estabilidade no Ser. Da atitude de estar centrado em seu próprio Ser surge Jivan Mukti (estando no mundo sem ser dele).

10. Que gosto tem a sensualidade quando a juventude nos deixa? Para que serve um lago quando a água se vai? Onde fica sansara, a ilusão quando Satya, a verdade se torna conhecida?

11. Não faça tantos empreendimentos para adquirir fortuna, amigos e juventude. Cada um destes itens são destruídos em minutos. Liberte-se da ilusão mundana imposta por Maya, atinja a verdade atemporal.

12. A luz do dia e a escuridão da noite, o amanhecer e o entardecer, inverno e primavera, tudo isto se vai e torna a voltar. E os tormentos e tempestades dos desejos nunca se vão!

 

Este buquê de 12 versos foi transmitido a um escolar em gramática pelo famoso Shankara, adorado como sendo os Pés do Absoluto. Os versos seguintes, por seus veneráveis Acharyaas.

 

13. Acharya Padmapada disse: Oh homem enlouquecido! Porque esta loucura por fortunas? Será que não há ninguém para lhe orientar? Só há uma coisa em todo este mundo que pode lhe salvar deste oceano de ilusão denominado sansara. Embarque rápido na nave do Satsangh!

14. Totakacharya disse: Há muitos que usam os cabelos imitando o Senhor Shiva, outros que raspam a cabeça, há os que arrancam os cabelos, ainda há os que utilizam as vestimentas de cor alaranjada, os que usam outras cores; tudo somente para sobrevivência profissional. Ainda que vejam a verdade à sua frente revelada, não a enxergam, tolos que são!

15. Hastamalaka disse: A disposição e o vigor já abandonaram o corpo do homem de idade; a sua cabeça ficou calva, suas gengivas sem dentes e sua postura se curvou diante da ação do tempo que torna tudo efêmero. Ainda assim seu apego é forte e ele se absorve em desejos inúteis.

16. Subodha falou: Que coisa incrível! O homem que tem apenas uma fogueira para lhe aquecer pela noite e o sol durante o dia, que se alimenta do que lhe dão como um sacerdote itinerante e dorme sob as árvores, que se libertou de lugares, pessoas e utensílios; carrega ainda em seu coração a atitude de um obediente animal de estimação perante os mimos dos desejos sensuais.

17. Sureshwaracharya: Uma pessoa pode ir do Ganges até o mar em peregrinação, observar jejum, dar riquezas em caridade! Ainda assim se não possuir Jnana, sabedoria, nada irá lhe dar frutos espirituais, mesmo após uma centena de vidas.

18. Nityananda: Faça a sua moradia em um templo, uma casa ou uma árvore, use as vestimentas de um renunciante, utilize a Mãe Terra como sua cama. Deixe todos os apegos e abandone todos os confortos. Abençoado com VAIRAGUYA (o cessar dos desejos pela total satisfação existencial por meio da sabedoria, jnana), como poderia alguém não estar satisfeito?

19. Anandagiri: Uma pessoa pode ter yoga ou bhoga (apego à ignorância), pode possuir apego ou desapego. Isto não diz nada, pois apenas quem está munido de uma mente estável e estabelecida no Ser consegue regozijar satisfação existencial, mais ninguém.

20. Driidhabhakta: Que uma pessoa leia um pouco o Guita, beba apenas um gole de água do Ganges, propicie Govinda apenas uma vez. Não terá então problemas após a morte.

21. Nityanatha:  Nascendo e reencarnando sucessivas vezes, nascendo de novo para ainda estar apegado ao útero! É sem dúvida difícil de se atravessar este oceano de sansara. Oh Murari (Govinda)! Me abençoe com a redenção, em sua misericórdia! 

22. Nityanatha: Não haverá falta de roupas para um monge enquanto houver trapos atirados pelas ruas. Liberto de vícios e virtudes ele segue em frente. Quem vive em unificação com o Absoluto regozija contentamento e felicidade, pura e incondicional, como uma criança ou como quem experimenta a embriagues.

23. Surendra: Quem é você? Quem sou eu? De onde eu surgi? Quem é minha mãe? E meu pai? Pondere nesta verdade e olhe para tudo isto aqui como sendo algo que não possui essência em sua aparência, assim como um sonho, abandone o pesadelo, desperte!

24. Medhaatithira: Em mim, em você e em tudo, não habita ninguém mais do que o mesmo Vishnu ou Ser. Sua impaciência e ira é sem sentido. Se deseja se estabilizar em seu status de Vishnu em breve, então tenha sempre SAMABHAWA (estabilidade mental no Ser).

25. Medhaatithira: Não perca o seu tempo em tentar ficar amigo de, conquistar o amor de, o afeto de, ou tentar lutar contra amigos e inimigos. Descubra o que você é e todos são, constituídos do mesmo Ser que é o seu. Veja a si mesmo em todos e deixe de lado todo e qualquer sentimento de dualidade.

26. Bharativansha: Ao invés de se ocupar com a conquista de luxúria, ira, paixão, sensualidade e ambições; busque ponderar sobre a sua natureza verdadeira, sua essência. Tolos são aqueles que permanecem cegos para o Ser. Como se estivessem atirados aos infernos, transformam o caminho em mero sofrimento com pequenas escalas na alegria apenas.

27. Sumatira: Regularmente estude o Guita, recite diariamente alguns dos mil nomes de Vishnu em seu coração e lembre as Suas muitas glórias. Adquira prazer em estar na presença de sábios, distribua e aumente a sua fortuna compartilhando-a com os que necessitam e os que possam auxiliar outros.

28. Shankaracharya, novamente tem a palavra: Quem se embrenha em satisfazer os prazeres comuns reza a doença em seu corpo. Mesmo que a morte traga um fim em tudo, o ser humano ainda assim não abandona estas coisas para se ocupar com outras.

29. Shankaracharya: A fortuna não é um bem verdadeiro, na verdade não há tanta felicidade assim nisto. A felicidade não se compra. Reflita nisto sempre. Uma pessoa rica teme até mesmo seus filhos. Este é o poder da riqueza em todas as partes!

30. Shankaracharya: Regule os seus pranas (energia vital) com a prática de yoga, permaneça sem ser afetado profundamente em sua mente pelas influências externas, adquira o discernimento para distinguir entre o verdadeiro e o falso, entre o eterno e o efêmero. Use o nome do Ser Absoluto, entoe e cante os Seus mantras ao invés de ocupar a mente com o exercício contínuo e vicioso do raciocínio e da intelecção, silencie assim a mente turbulenta. Faça isto com muita atenção, com muita dedicação.

31. Sri Shankaracharya uvacha: Oh devoto dos Pés de Lótus do Guru! Que você possa ser libertado em breve de sanasara, mediante disciplina do corpo e da mente. Irá experimentar logo o Senhor Interno de seu coração!

32. Assim um tolo intelectual, perdido em meio às regras gramaticais, se libertou de sua estreita visão, pela Luz emitida por Adi Guru Shankara e seus discípulos.

33. Bhaja Govindam, Bhaja Govindam, Bhaja Govindam, soa a entoação dos mantras... Oh tolos! Não há outra maneira de se utilizar o tempo e a mente que seja útil para atravessar o oceano de sofrimentos e ilusões das vidas senão assim.

 

 

HARI OM TAT SAT

 

Temos aqui o Satsangh, em sua presença, caro leitor, dos discípulos Acharyas de Sri Shankaraji em uma obra secular, nossa sagrada Ordem Dashnami. Que adquira as bênçãos do Senhor da continuidade e da preservação do universo, que foi propiciado para tal neste texto, o Senhor Vishnu, Govinda. Bhajo Govinda, Bhajo Govinda, Bhajo Govinda... Nacho Nacho cha Nandelaala... OM NAMO NARAYANAYA

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