Druidismo


Nenhum povo europeu possuiu tão arraigado sentimento de imortalidade, justiça e liberdade, como os gauleses. Por longo tempo foram considerados bárbaros, injustamente. Como eram conhecidos apenas por intermédio de escritores romanos e cristãos, era interessante desacreditarem tal povo, desfigurando-lhes a crença. César foi um deles. Em "Comentários" cometeu erros propositados, e deliberadamente narrou inexatidões ao descrevê-los, com clara intenção de exaltar-se ante a posteridade. Os cristãos viam-nos como sanguinários e violentos, e encontravam em seus cultos unicamente práticas grosseiras. Realmente, não podemos negar que a princípio, usavam sacrifício humano. Este, todavia, na maior parte decorria de execuções judiciárias. Os druidas, juízes e executores ofereciam aos sentenciados em holocausto aos deuses. Cinco anos separavam a sentença da execução da mesma. Em períodos de calamidade, vítimas voluntárias se ofereciam à expiação. No tempo dos Césares, esta prática que tanto denegriu sua imagem, já havia sido extinta, enquanto nos dias de hoje, muitos paises civilizados adotam ainda a pena de morte. Apesar do preconceito dos cristãos, Lucano, em Farsálias, revela terem sido os gauleses depositários dos mistérios da vida e da morte. É desconhecido o fundador da religião druídica e o autor dos Livros Sagrados, as Tríades. Embora a religião gálica seja conhecida por druidismo, e nos dicionários conste o termo druida como seu sacerdote, a instituição dos druidas não se constituia em corpo sacerdotal. Esse título equivalia ao de sábio. Alguns, sob a denominação de eubage, presidiam as cerimônias religiosas. A maioria entretanto, dedicavam-se à educação dos jovens, a práticas políticas e judiciais, ao estudo das ciências e das letras. Segundo a doutrina contida nas Tríades: "Há três Unidades Primitivas: Deus, a Luz e a Liberdade.

Três Unidades de Deus: Ser Infinito em Si Mesmo;Ser Finito para com o Finito; e estar em relação com cada estado das existências no círculo dos mundos." Eis a Trindade Divina. Explicava ainda , que a alma gera-se no seio do abismo - anoufn - onde reveste as formas rudimentares de vida e só adquire consciência e alcança a liberdade depois de permanecer por muito tempo imersa em instintos primários. Pelo ensinamento das Tríades, cantado por Taliesino, parece não haver nessa religião a crença na origem divina da alma. Tampouco encontra-se qualquer referência ao descenso vibratório, vez que reportam-se ao nascimento do espírito já no plano material. A ascensão evolutiva de reino a reino e posterior aprimoramento do ser humano até a angelitude, no entanto, mostram-se iguais as demais religiões. Os druidas pregavam que em sua longa peregrinação, a alma percorre três círculos, que correspondem a três estados sucessivos. No afnoun, onde se origina, período mais primitivo, imersa na matéria, sofre o jugo da animalidade. Em seguida penetra no abred, círculo das migrações que povoam os mundos das experiências e dos sofrimentos, quando mais depurada, completa seu aprendizado em diversos orbes. A Terra é um deles e a alma nela reencarna muitas vezes. À custa de incessante luta liberta-se das influências materiais, livrando-se da roda das encarnações.

Continua sua jornada em gwynfyd, círculo dos mundos venturosos ou da felicidade, completamente despojada de anseios e sentimentos terrenos. Além dessas duas regiões, encontra-se o ceugat, círculo do Infinito, morada da Essência Divina, que engloba todos os outros. As Tríades impõe três condições para se chegar à plenitude, ou seja, adquirir a ciência e a virtude: "Transmigrar em abred, transmigrar em gwynfyd e recordar-se de todo o passado, inclusive o referente ao afnoun." Essas proposições expressam a ascensão da alma, de renascimentos também em outros mundos além da Terra e a possibilidade de reencarnação voluntária, mesmo quando o espírito se encontra livre dessa contingência. Tal prerrogativa pertence aos Seres situados no círculo de gwynfyd, que parece corresponder ao plano que os teosofistas indicam como os dos que alcançaram a categoria de Anjos. Por esse motivo presume-se que também nessa religião o poder de retomar as vestes carnais é exercido com fins de auxílio à humanidade. A doutrina druídica confere grande importância à recordação de vidas anteriores. Condiciona a conquista da plenitude ao pleno desabrochar do Amor e do Saber, como nas demais religiões.

Ensina ainda, não ser o homem joguete da fatalidade, nem gozar de favoritismo, explicando que cada um prepara e edifica o próprio destino. Eis a Lei do Carma com todas as suas consequências e implicações. Pelos ensinamentos das Tríades constata-se que apesar do objetivo do ser humano ser a Perfeição para unir-se a Deus, não representa, como em outras religiões, o retorno à Origem, mas tão só uma jornada que conduz ao Ser Supremo. É apenas o final de uma partida e não a viagem de regresso. Conforme Lucano em Farsálias: " As almas não se sepultam nos sombrios reinos do Erebo(inferno), mas voam a animar outros corpos em novos mundos. A morte não é senão o termo de uma vida; daí seu heroísmo no meio de sangrentos combates, e o seu desprezo pela morte." Os gauleses consideravam os despojos dos guerreiros simples invólucros gastos, e como tal, indignos de atenção. Por isso os abandonavam insepultos nos campos de batalha, para grande surpresa de seus inimigos. Tal atitude, considerada bárbara pelos romanos, que desconheciam suas crenças e a maneira como encaravam a morte: como simples emigração. Possuíam tanta convicção de voltarem a viver nos mundos que turbilhonam pelo Infinito que emprestavam dinheiro para ser pago em encarnação futura. Essa doutrina viril conferia-lhes coragem, tanto que os fazia caminhar para o campo de batalhas com completo desprezo pelo fim que os aguardava,, com total desapego da vida física. Lutavam de peito nú e achavam covardia porteger-se com couraças ou usar de artimanhas guerreiras. Por entenderem sabiamente a morte, não a temiam. A comemoração dos mortos é de iniciativa gaulesa. No dia correspondente hoje ao 1º de novembro, celebravam a festa dos espíritos, não nos cemitérios, pois não davam qualquer valor ao corpo físico, mas em cada lar, onde os bardos e os videntes evocavam as almas de seus mortos queridos. Afora o Livro Sagrado, nenhum outro ensinamento foi escrito, para não ser desvirtuado ou materializdo por imagens. Transmitiam-no oralmente aos Iniciados para que o guardassem de memória, e aos bardos para que os preservassem em seus cânticos. Utilizavam-se de todos os recursos extra-sensoriais como forma de auxílio na vida cotidiana. As druidezas proferiam oráculos, os magos utilizavam-se da magia e os médiuns e videntes correspondiam-se com os espíritos, através de suas faculdades paranormais. Possuíam deidades próprias, não de modo politeísta, mas como entidades de diversos graus evolutivos, prepostos de um Deus único, que os ajudavam quando a elas recorriam. Teutatés, Esus e Gwyon representavam a força, a luz e o espírito, no panteão gálico, mas acima deles pairava a Unidade do Deus Supremo. Realizavam os rituais em céu aberto: clareiras, florestas, ou junto a penedias. amavam e cultuavam a natureza , da qual se utilizavam para simbolizar os Princípios Divinos, razão de terem sido julgados animistas por muito tempo. Erguiam seus altares com pedras brutas, considerando que a pedra lapidada seria profanada por ter contato com o homem. Nenhum objeto feito pela mão humana adornava seus santuários. O carvalho representava Deus, Eterna Fonte de Vida; o visco que nele crescia, sem no entanto com ele se confundir, figurava o espírito imortal do homem. Acreditavam as charnecas e bosques povoados de seres imateriais e almas errantes, à procura de novas encarnações. Chamavam-nos de Duz e Korrigans. Com a conquista romana da Gália e da Bretanha - onde também vicejava essa religião - , e posterior difusão do cristianismo, os Mistérios druídicos foram degenerando, quase nada restando deles, na Europa, ao irromper da Idade Média.

By Diego & Priscila

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