A FALTA QUE AMA

			Entre areia, sol e grama
			o que se esquiva se dá,
			enquanto a falta que ama
			procura alguém que não há.

			Está coberto de terra,
			forrado de esquecimento.
			Onde a vista mais se aferra,
			a dália é toda cimento.

			A transparência da hora
			corrói ângulos obscuros:
			cantiga que não implora
			nem ri, patinando muros.

			já nem se escuta a poeira
			que o gesto espalha no chão.
			A vida conta-se inteira,
			em letras de conclusão.

			Por que é que revoa à toa
			o pensamento, na luz ?
			E por que nunca se escoa
			o tempo, chaga sem pus ?

			O inseto petrificado
			na concha ardente do dia
			une o tédio do passado
			a uma futura energia.

			No solo vira semente ?
			Vai tudo recomeçar ?
			É falta ou ele que sente
			o sonho do verbo amar ?

	    	                 Carlos Drummond de Andrade

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