Introdução
Diversas foram as transformações que a humanidade
atravessou ao longo de sua História. Guerras e conquistas, lutas
e glórias, tudo se mescla em uma enormidade sem fim de acontecimentos
que marcaram a identidade de cada povo e, por que não acrescentar,
de toda uma civilização.
Nem tudo foi glória, nem tudo foi esplendor, mas, sobretudo,
tudo foi história. Almejando a paz ou lutando na guerra, cada país
teve seus heróis e seus mártires. Todavia, como diz G. Le
Bon, em seu livro "Les Incertudes de L’heure présente": "L’heroisme
peut sauver um peuple dans les circonstances difficiles; mais c’est l’accumulation
journalière de petites vertus que détermine sa grandeur"
(O Heroísmo pode salvar um povo em circunstâncias difíceis,
porém somente a acumulação diária de pequenas
virtudes determina sua grandeza).
Não basta lutar, é preciso ter virtude, mas também
é verdade que não basta ter virtude, é preciso lutar.
A luta e a virtude formam a flor da Paz. Sem o espinho da guerra,
a rosa se torna frágil e facilmente é morta. Sem as pétalas
virtuosas da rosa, a flor não tem beleza e de nada vale. A guerra,
antes de brutalidade, deve ter elegância; antes de sangrenta, deve
ser bela. Tal era a concepção de guerra que tinha o medieval,
e mesmo o francês no "Ancien Régime": a guerra com panache.
Da convicção profunda de que a vida é uma
luta, contra si e contra todos, nasce a Idade Média. Doze pescadores,
discípulos de um crucificado, fundaram uma Igreja que se espalhou
pelo mundo, cristianizou bárbaros, triunfou sobre o paganismo primitivo
e formou as nações católicas, dividindo a história
em antes e depois de Cristo. Assim como ao fogo junta-se o calor, a história
do Ocidente, dito cristão, está intimamente ligada à
história da Igreja, Católica, Apostólica e Romana.
Após a queda do Império Romano, provocada pelas
invasões bárbaras, o papel desempenhado pela Igreja foi mais
importante do que nunca. Nestes termos, salienta Pierre Gaxotte:
"Quando o Império desmoronou sob os golpes dos bárbaros,
foi a Igreja o refúgio das leis e das letras, das artes e da política,
ocultando, nos seus mosteiros, tudo o que podia ter valor para a cultura
e ciência humana.
Em plena anarquia, soube construir uma sociedade viva e ordenada, cuja
política e espírito eram suficientes para, por si só,
fazerem lembrar os tempos calmos e suspirar por eles. Vai ao encontro dos
invasores, conquista-os, apazigua-os, converte-os, canaliza a sua vaga
e limita suas devastações. (...)
No meio de desgraças que surgem, no meio da derrocada do Estado
carolíngio, no meio dessa noite do nono século cheio de ruídos
de armas ao mesmo tempo que novas invasões húngaras, sarracenas
e normandas devastam e enchem o país, ao mesmo tempo que a população
flutua errante, a Igreja, mais uma vez, agüenta-se. Acata as tradições
interrompidas, combate as desordens feudais, regulamenta as guerras privadas,
impõe as tréguas e a paz.
Os grandes monges Odon, Odilon e Bernardo levantam por cima dos torreões
e das cidades o poder moral da Igreja, a idéia universal, o sonho
da unidade cristã. Pregadores, pacificadores, conselheiros de toda
a gente, árbitros de todas as questões, eles intervêm
por toda parte e em tudo, como verdadeiros poderes internacionais, aos
quais os poderes terrestres não podem resistir senão tremendo.
(...)
Em volta dos grandes santuários e das santas abadias, estreitam-se
relações e planejam-se viagens. Ao longo dos caminhos, por
onde transitam longas procissões de peregrinos, nascem as canções
épicas. As florestas desaparecem, graças aos monges que as
desbravam. À sombra dos mosteiros, repovoam-se os campos.
Aldeias em ruínas reerguem-se de novo. Os vitrais das Igrejas
e as esculturas das catedrais são o livro de imagens onde o povo
se instrui. O Papa ordena as cruzadas e destrona reis. Doações,
riquezas, honras, tudo é deposto aos pés dos clérigos,
e o próprio excesso deste reconhecimento é o índice
da grandeza dos seus benefícios".
Convertidos ao Cristianismo, os bárbaros formam nações
- cuja primeira é a França - levantam catedrais e palácios,
abadias e santuários, cidades e fortalezas. Castelos, erguidos na
paz e voltados para a guerra.
De tal forma a Igreja influenciava a sociedade temporal, que
o Papa Leão XIII (1878 a 1903) assim escreve:
"Tempo houve em que a filosofia do Evangelho governava os Estados.
Nessa época, a influência da sabedoria cristã e a sua
virtude divina penetrava as leis, as instituições, os costumes
dos povos, todas as categorias e todas as relações da sociedade
civil. Então a Religião instituída por Jesus Cristo,
solidamente estabelecida no grau de dignidade que lhe é devido,
em toda parte era florescente, graças ao favor dos Príncipes
e à proteção legítima dos Magistrados. Então
o Sacerdócio e o Império estavam ligados entre si por uma
feliz concórdia e pela permuta amistosa de bons ofícios.
Organizada assim, a sociedade civil deu frutos superiores a toda expectativa,
cuja memória subsiste e subsistirá, consignada como está
em inúmeros documentos que artifício algum dos adversários
poderá corromper ou obscurecer."
Após o surgimento das nações católicas,
a Igreja se torna a cúpula da organização social.
Com o poder de quem tem as chaves da eternidade e a certeza de que luta
por um ideal verdadeiro, ela exerce sua influência na expansão
da Fé e no ideal da civilização cristã, una
e coesa em torno da Cruz e do Papado.
Guerreiro de Fé e de coragem, o cavaleiro da Idade Média
se entregava, por inteiro, aos seus ideais. Alma repleta de convicções
e certezas, não tinha receio de nada. Assim se exprime S. Bernardo,
Doutor Melífluo:
"Os Cavaleiros de Cristo podem com tranqüilidade de consciência
combater os combates do Senhor, não temendo, de maneira nenhuma,
nem o pecado pela morte do inimigo, nem o perigo da própria morte,
neste caso, infligida ou sofrida por Cristo, nada tem de criminoso, e muitas
vezes traz consigo o mérito da glória. Pois, com a primeira
alcança glória para Cristo, com a outra alcança o
próprio Cristo. (...) O cavaleiro de Cristo mata com a consciência
tranqüila e morre ainda mais seguro de si. Morrendo trabalha por si
mesmo; matando trabalha por Cristo. E não é sem razão
que ele porta o gládio: ele é o ministro de Deus para a punição
dos maus e exaltação dos bons. Quando mata um malfeitor não
é homicida mas, por assim dizer, malicida; e é necessário
ver nele tanto o vingador que está a serviço de Cristo, como
o defensor do povo cristão. Quando porém é morto,
considera-se não ter morrido, mas ter chegado à glória
eterna. Portanto, a morte que ele inflige é um benefício
para Cristo; a que recebe, é um benefício para si mesmo.
(...) Os pagãos até não deveriam ser mortos, se se
pudesse impedir dalguma outra maneira as suas grandíssimas vexações
e retirar-lhes os meios de oprimir os fiéis. Mas atualmente é
melhor que sejam mortos a fim de que, desse modo, os justos não
se dobrem à iniqüidade das mãos deles, pois do contrário
certamente se manterá a chibata dos pecadores sobre a classe dos
justos".
Cheio de confiança, o medieval avançava para o
combate. Não temia nem a morte nem a derrota, pois seus ideais estavam
alicerçados nas certezas derivadas da Fé e na convicção
de um futuro glorioso e eterno.
Mas poderá objetar alguém. De onde provinham tantas
convicções? Quem tem certeza de que tem a certeza?
Tudo é relativo, diria, como se estivesse comunicando a verdade
absoluta! A única verdade é que não existe verdade;
a única justiça é a igualdade; o único bem
é a ausência de bem! Chega-se à Pós-modernidade,
onde não há conceito que possa existir, nem ideal pelo que
lutar, tudo é incerto no crepúsculo das certezas e das verdades.
É a nadificação da existência humana, submersa
na lama das mentiras que se proclamam verdadeiras, do relativo que se proclama
absoluto, da contestação das normas como norma de conduta.
Liberdade, igualdade, Sorbonne, ecologia, rock, drogas, nova Era, Gnose,
pirâmides e cristais, etc; forma-se a Revolução Pós-moderna
no cadáver da modernidade.
Como uma Revolução suplantando outra Revolução,
temos a Pós-modernidade substituindo a modernidade. Assim como outrora
o Comunismo surgiu da Revolução Francesa, a modernidade deu
origem à Pós-modernidade. Não como processos estanques,
mas como materialização de uma cosmo-visão antropocêntrica,
que tem no homem a origem e a finalidade de toda a existência. Não
há Deus criador da moral e, pela sua própria existência,
autor da desigualdade; todos são igualmente iguais e livres em um
imanentismo que caminha para a supressão do princípio de
autoridade. Ninguém mais dirá o que é certo, pois
o ser humano, libertado pelo conhecimento (do grego Gnosis), caminhará
livremente para sua auto-realização, onde todos formarão
uma só realidade (Panteísmo) e viverão em comunidades
sem as regras morais que sufocam e aprisionam todos os homens ("Comunidades
alternativas", uma das características da Pós-modernidade).
Esses princípios, presentes em toda a história
antropocêntrica, tornam-se explícitos na Pós-modernidade.
O Renascimento, antes de uma mudança apenas artística, representa
uma transformação gradual e processiva (que até hoje
produz seus efeitos) onde uma cosmo-visão teocêntrica sede
lugar ao antropocentrismo que, na medida em que se radicaliza, torna-se
panteísta e gnóstico.
Por outro lado, na mesma medida em que se aproxima o termo da
Revolução, começa a nascer uma sensível reação
a ela. Uma reação embalada, como será visto, por um
odor tradicionalista e medieval. Esse inusitado odor vem com a promessa
de surpresas inimagináveis na aurora do século XXI, como
veremos...
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