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MÍDIA
JUDAICA INDEPENDENTE
Se há uma coisa que os jovens em todos os lugares acham inútil é aprender história. Este filme é um pedaço da história arremessado contra sua consciência. A história de Olga ficou escondida, impedida de ser contada durante os governos de Vargas e depois durante o regime militar. Apenas em 1985, Fernando Morais pode nos mostrar a saga de Olga, com mais de 1 milhão de exemplares vendidos em todo o mundo. Mas foram precisos mais 19 anos e muita persistência para encontrar patrocinadores para um filme com tema judaico e comunista, além de sete anos para transformar um livro com mais de 300 personagens em um roteiro de cinema possível de ser realizado. Você vai se espantar com a produção brasileira, feita no Rio de Janeiro. O diretor Jayme Monjardim, com apoio da Globo e de diversas empresas, criou um dos mais belos, densos e trágicos filmes da história do cinema. Antes dos primeiros 20 minutos você vai lembrar da Lista de Schindler e se perguntar como nós temos algo que empurra o DVD de Spielberg para o fundo da gaveta. A recriação dos ambientes alemães, russos e brasileiros das décadas de 1920 e 30, a recriação de internas e externas do campo de concentração de Ravensbruck, com neve e tudo, feitas no Projac, no calor carioca, é impressionante. Uniformes, armas, veículos, figurino, objetos de cena, tudo está perfeitamente correto e de acordo com a época mostrada. Som e câmera, sempre problemas nas produções nacionais, são obras de mestres. Muitos diretores americanos vão ficar imaginando como tal produção impecável foi feita no Brasil. Não se surpreenda se Olga não for candidato ao melhor filme estrangeiro, mas sim ao melhor filme no próximo Oscar. Mas para isso seus produtores precisam ter a coragem de dublá-lo não enviando cópias legendadas para a Europa e para os Estados Unidos. Nós estamos acostumados com as legendas, mas eles simplesmente detestam. Sigam o incrível Fellini que dizia: “Por favor, não coloquem legendas nos meus filmes – dublem! Não quero que as pessoas leiam meus filmes. Quero que elas assistam”. Se você for um forte, espere pelo menos uma hora de choro. Se você for engajado, tanto na causa comunista, como na humanista, como na judaica ou meramente tenha um forte sentimento familiar talvez chore durante o filme inteiro. Apenas um alienado vai sair do cinema sem ter recebido algo de muito profundo. Uma das vantagens de ser jornalista independente é poder elogiar sem ter o rabo preso com isso ou com aquilo: jornalistas e colunistas sempre têm muito receio em elogiar o que merece, mas não têm critério algum em criticar o que não entendem. O filme não explica o judaísmo, não explica o comunismo, não explica o fascismo e não explica o nazismo. O filme é Olga. E através do livro de Fernando, do roteiro de Rita Buzzar, da direção de Mojardim e da luz e força de Camila Morgado, talvez você entenda como o Estado emprega a propaganda para divulgar a ideologia, como as pessoas se encaixam como peões de cada lado da mesa, como os peões nada conseguem mudar do contexto e como a ideologia de massa finalmente se transforma apenas dramas, dor e tragédias individuais. É um filme que faz você pensar e querer agir. Mas não com o oportunismo ridículo do senador Eduardo Suplicy, que logo declarou pretender exigir a mudança do nome do salão Felinto Muller (que também foi senador, além de chefe da polícia de Getúlio). Durante anos passando por tal lugar no Congresso, Suplicy e todos os outros políticos da esquerda nunca perceberam o nome do salão? Qual será a próxima medida demagógica? Quem sabe mudar o nome da estrada Rio-SP que homenageia o Marechal Eurico Gaspar Dutra? Ou talvez a ponte Rio-Niterói, na verdade Costa e Silva? Ou quem sabe riscar do mapa todas as avenidas presidente Getúlio Vargas, presentes quase em todas as cidades do Brasil, menos em São Paulo, é claro – isso, se o PDT que idolatra o trabalhismo de Vargas ignorando o seu fascismo deixar acontecer! Mas o convívio entre Olga e Prestes transformou-se em romance. O amor transformou-se em tragédia, quando depois de presos no Rio de Janeiro, Olga foi deportada por Getúlio Vargas para as prisões nazistas acabando assassinada numa câmara de gás. Caco Ciocler vive Prestes e Camila Morgado é uma fantástica Olga. Se a história não fosse verdadeira, dificilmente alguém teria conseguido criá-la. Agora, 81 anos depois de Olga Benário se engajar na militância comunista, todos poderão conhecer a luta de uma heroína para várias correntes. Só que pela pasteurização da ignorância histórica atual, a maioria das pessoas não vai conseguir entender o justo engajamento dos judeus na causa comunista em oposição ao fascismo e nazismo que os segregava, os perseguia e divulgava para quem quisesse ouvir que iria exterminá-los, diferenciando-o do comunismo marxista, castrista e chavista, anti-semita e anti-israelense atual que contrapõe o socialismo contra as democracias taxadas de fascistas, ao invés de investir contra os nazistas que continuam por aí com seus sites na internet, seus livros revisionistas e sua propaganda racista de sempre, suas ações de agressão e vandalismo em quase todos os países. Olga é um clássico, mesmo antes de sua estréia. Olga é uma visão que faltava sobre aquele momento histórico e o embate entre o fascismo e comunismo. Olga é obrigatório para quem quiser entender melhor o mundo e o ser humano. Juntamente com este filme, sugerimos a leitura do pouco divulgado pequeno livro “Destinatário Desconhecido”, de Kathrine Kressman Taylor, escrito em 1938 quando vendeu mais de 50 mil cópias, número elevado para aquela época nos EUA. Relançado com pouco alarde em 1999 na Europa, é um sucesso editorial mais atual e necessário do que no pré-guerra. Para a existência do filme foram precisos os esforços da Nexus Produções, da Globo Filmes, Lumière, Europa Filmes e patrocínios da Petrobrás, Credicard, BNDES, White Martins, Furnas Centrais Elétricas, Banco Banespa-Santander, Bancon BBA-Itaú e Rio Bravo Investimentos, empresas que acreditaram nas leis de incentivo à cultura no Brasil. (acrescentado a partir do comentário de um leitor no dia 8/agosto/2004) A atriz Eliana Guttman merece um destaque. Para uma atriz com forte ligação cultural com o judaismo fazer o papel de uma enfermeira nazista foi um grande desafio profissional. José Roitberg - jornalista |