por Adapa (Twin Rivers Rising, 1995-1997)
Qual é o objetivo do Ritual num sistema de Mágica? Num amplo sentido, ritual pode ser definido como "qualquer ato ou conjunto de atos comuns, formais e feitos de forma repetitiva" {1}. Se concordarmos com esta definição, então um ato de Ritual Mágico torna-se uma espécie de drama, sendo que em verdade não estamos de todo errados. Muito antes pelo contrário, um Ritual Mágico é um psicodrama em toda a extensão da palavra, onde a(s) pessoa(s) que dele participa(m) tenta(m) entrar em contato nada mais, nada menos do que com a imanência essencial de seres divinos, os deuses e as deusas.
Carl Jung observou que desde o começo dos tempos, o homem tem recorrido a instrumentos artificiais, a ações ritualísticas, tais como danças, cantos, identificação com espíritos ancestrais, etc.
" Na tentativa óbvia de conjurar ou despertar estas camadas mais profundas da Psique, onde a luz da razão e do poder da vontade não podem penetrar, e trazê-las de volta à memória. Por este motivo usavam eles idéias mitológicas ou arquetípicas que expressavam o inconsciente" (2)
Partindo-se deste princípio, a Mente e a Personalidade existem como ilhas num vasto mar psíquico, mas abaixo... nas vastas profundezas, está o inconsciente coletivo, do qual somos capazes de obter conhecimento e compreensão durante Rituais. Uma vez que aceitemos esta noção da realidade, torna-se claro que rituais são fundamentalmente uma seqüência de eventos que permitem a comunicação. Esta comunicação é facilitada através da indução de estados alterados da consciência. Portanto, Isaac Bonewits caraterizou ritual como " qualquer seqüência ordenada de eventos ou ações, que é designada para produzir um estado alterado de consciência previsível dentro do qual podem ser obtidos certos resultados mágicos ou religiosos" {3} Rituais, portanto, facilitam a conexão entre as realidades exteriores e interiores, entre as esferas superiores e as inferiores. Através do ritual, podemos nos mover além dos limitados confins do self e experimentar as profundezas indomadas da alma coletiva. É através também de rituais que podemos tocar na imanência não só do mundo natural, como também na imanência do divino. " Como seres humanos, apesar de nossa vocação seja o estabelecimento de contados, na maior parte da nossa experiência comum temos a separação. Rituais parecem ser um dos métodos através dos quais nos reintegramos tanto a nível individual como grupal ao Cosmo."{4} Através de rituais, e mais especificamente através da Invocação da divindade dentro do ritual, nós incorporados o Deus/a Deusa dentro do círculo como dentro de nós mesmos.
Invocação, a um nível mais fundamental, consiste em chamar as entidades positivas das esferas em que se encontram, convidando-as para participar de um trabalho positivo{5} Mas Invocação é mais do que isto também. Invocação é o ápice da experiência do divino em nossas vidas. Sua antítese é a evocação. Evocação geralmente consiste no contato com uma entidade que é espiritualmente inferior, sendo que através de coerção pretende-se que esta participe do trabalho desejado, independente de sua vontade (6). Ao se fazer uma evocação, usa-se o princípio Necromântico da Demonologia (demon do grego Daemon ou Daimon quer dizer "espírito"), de dizer o nome correto a fim de controlar o ser desejado. Conforme disse Agrippa, " o nome certo das coisas são os raios certos destas mesmas coisas, sempre presentes em todas as horas e mantendo o poder destas coisas" (7} Em geral, é um procedimento a ser evitado, pois evocar é controlar o livre arbítrio do espírito chamado, e tudo o que afetar o livre arbítrio de outrém pode causar dano. Eliphas Levi, o grande mago cabalista do século XIX, identificou apenas duas situações onde seria permitido usar evocações: por Amor e Inteligência{8} Ainda assim, ele reconhecia um grande perigo pessoal envolvido neste tipo de procedimento. Invocação é, portanto, o procedimento tradicional usado em rituais. Seu papel é o de ligar e unir. Através de rituais, nós criamos e entramos em estados alterados de consciência caracterizados pela abertura. Através deste portal, entramos nas profundezas do inconsciente coletivo, onde o poder de imagens simbólicas serve para nos ligar com pensamentos, visões e conhecimento Daquele/Daquela que não se pode Ver. Mas para realmente experimentar Aquele/Aquela que não se pode ver, devemos nos "como" este Ser, tal qual falou o Professor Heideger, pois todo conhecimento e experiência é, num certo sentido, caracterizado por este "transformar". Segue-se naturalmente daí que a forma mais elevada de conhecimento obtido através da experiência só pode ser obtida através da união verdadeira com o outro. "Quando, através de Invocação, entramos num estado mais profundo de consciência, nós nos fundimos com a imagem arquetípica e naquele momento, transformamo-nos no Deus e na Deusa" (9). Esta não é apenas uma união do self com a presença imanente dos deuses e deusas que temos dentro de nós. O que realmente ocorre é o elo de conexão com todas as Realidades, estabelecendo-se por momentos a união primordial, essencial e completa nossa com o cosmo. "A Deusa invocada é muito mais do que aquela parte da deusa que habita dentro de todos nós. Ela é a Matriz da qual surgem as idéias, sobre a qual se assenta o divino feminino e a origem deste poder que está presente em toda mulher - a fonte de toda criação e destruição, a energia que move todos os ciclos" (10} Portanto, e em última análise, a natureza real do ritual e da Invocação dentro dele é a experiência do Self como Deus/Deusa, e a experiência do Todo/Toda/Tudo, pois esta é a única forma através da qual podemos realmente conhecer o divino.
" Se não vos fizerdes tal qual Deus, não podereis conhecê-Lo, pois semelhante só pode ser conhecido por semelhante. Fazei-vos, portanto, crescer na mesma estatura da Grandeza que transcende todas as medidas; saltai para fora de cada corpo; transcendei todo o tempos; transformai-vos em Eternidade, e então devereis conhecer Deus " {11}
Notas
{1} Webster's New Collegiate Dictionary, 1981 Edition
{2} Mysterium Coniunctionis, Carl Jung, p.522
{3} Second Epistle of Isaac, Isaac Bonewits, 5:3-6
{4} Drawing Down The Moon, Margot Adler, p.162
{5} Positive Magic, Marion Weinstein, p. 50
{6} Id
{7} Three Books of Occult Philosophy, Henry Cornelius Agrippa, Book I p. 213
{8} Transcendental Magic, Eliphas Levi, p. 295
{9} The Old Religion in a New Age, Vivianne Crowley, p. 146
{10} The Cauldron of Change, De-Anna Alba, p.119
{11} Thrice Greatest Hermes, Studies in Hellenistic Theosophy e Gnosis, G.R.S. Mead, Book II p. 119
AUTOR: ADAPA (TWIN RIVERS RISING, 1995-1997)