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BOAVISTA FUTEBOL CLUBE

É fantasia lutar pelo título antes do ano 2000

NA PRIMEIRA entrevista em que, como fez questão no fim de acentuar, não lhe falaram do pai, o emancipado João Loureiro reafirma que o Boavista não tem condições para lutar pelo título, admitindo, no entanto, que tal possa suceder depois do ano 2000. Nessa altura, já o clube terá concluído o seu complexo comercial e desportivo que lhe poderá gerar receitas que viabilizem uma equipa mais ambiciosa. João Loureiro, que não acredita em acções nem investiu nas SAD existentes, admite ser inevitável que também o Boavista venha a transformar-se numa empresa.

EXP. - Então, no balneário, já se fala do título?

J.L. - No balneário lê-se o que vem nos jornais. Não acredito que se fale em termos de objectivo, mas apenas como sonho.

EXP. - Há um ano afirmava que falar do título era um disparate. Mantém essa opinião?

J.L. - Se o Boavista puder ser campeão nacional não sou eu quem vai dizer para não ser. Digo é que, nesta altura, é um erro assumir o título como objectivo, ou mesmo programar a equipa nesse sentido. Até porque implicaria um orçamento que iria desequilibrar a saúde financeira do clube. Nós somos um exemplo de boa gestão, para cumprir as obrigações, fiscais ou salariais, fazemos muita ginástica. Se, à partida, a meta fosse o título teríamos de ter um investimento no futebol da ordem dos três milhões de contos. Não digo aos jogadores para perderem jogos, e se formos ganhando semana a semana chegaremos em primeiro. Ou seja, o título poderá ser um resultado não um propósito mas de um acaso. A nossa responsabilidade são as competições europeias.

EXP. - Em Dezembro, quando reabrirem as inscrições, prefere obter um encaixe financeiro ou manter a equipa mais competitiva?

J.L. - Temos a consciência de que estando a equipa a praticar bom futebol a cobiça sobre os jogadores será muito maior. O Boavista não pode competir com os salários dos grandes, que pagam em média entre 60 e 80 mil contos ano por jogador, enquanto nós ficamos pelos 20 mil. São realidades diferentes.

EXP. - O Nuno Gomes foi vendido na altura certo ou admite que teria potencial para fazer ainda melhor negócio?

J.L. - Foi na altura certa. Se não tivéssemos transferido o Sanchez, o Nuno e o Jimmy, agora não podíamos estar a realizar os investimentos que andamos a fazer em estruturas desportivas, que é o nosso grande objectivo do momento. O dinheiro dessas vendas foi investido no nosso empreendimento imobiliário, cujos proventos irão financiar o complexo desportivo já em marcha. Há muitos clubes com projectos de estádios modernos, mas até agora não passaram daí. O Boavista foi o único a avançar porque no momento certo realizou mais-valias. Aliás, só poderemos ser mais ambiciosos em termos desportivos no dia em que tivermos as infra-estruturas desportivas. E isto porque vamos estar uns anos adiantados em relação aos nossos concorrentes.

EXP. - Quando?

J.L. - Prevemos inaugurar o estádio do Bessa em 1 de Agosto de 2000, data do 97ª aniversário do clube. A partir daí teremos mais oportunidades porque o complexo desportivo atrairá muito mais gente devido a óptimas condições de conforto e segurança - será o primeiro estádio do século XXI -, terá uma zona comercial, onde ficará instalada uma média-superfície e restaurantes. Seremos ainda o primeiro clube com estrutura própria para a prática de desportos radicais, que não duvido atrairá muita gente nova. E como já teremos feitos todos os investimentos em termos de estruturas, poderemos canalizar muito mais receitas para o futebol. Em 2000/2001 vamos estar mais próximos dos grandes.

EXP. - A criação de uma SAD é inevitável?

J.L. - Até final do meu mandato (no ano 2000) os sócios terão de pronunciar-se sobre o assunto. A minha opinião é que é irreversível todos os clubes constituírem uma sociedade desportiva. E julgo que são os grandes quem mais poderia fugir a essa inevitabilidade - basta terem receitas associativas que lhe permitam um maior equilíbrio. Quando ouço o Vale e Azevedo falar de cotizações a diferença é de um para 15 ou 20. Cheguei à conclusão de que o Benfica, num jogo da Liga dos Campeões, tem tantas receitas como o Boavista durante duas épocas. Temos de ter essa noção quando se fala do título. Ou seja, temos outros tipo de problemas, que podemos tornear com uma boa prospecção no mercado de jogadores.

EXP. - Que vantagens trará uma SAD ao Boavista?

J.L. - A constituição de uma SAD levanta ao Boavista um grande problema - o de retirar ao clube as receitas do futebol. E por isso só constituiremos uma SAD se ficar salvaguarda a sobrevivência das outras modalidades que o clube pratica.

EXP. - Jaime Pacheco afirma que a equipa nada deve em relação aos «grandes». Como explica que um plantel que custa 800 mil contos valha tanto como outro que custa quatro vezes mais?

J.L. - O Jaime tem razão. A explicação é termos uma boa política de prospecção. Excepção feita ao Jacaré, é difícil apontarem-se falhas à nossa política de contratações. Foi uma falha no mesmo ano em que se contratou o Ayew, o Quevedo e em que o Pedro Emanuel começou a jogar. Depois, todos os anos é feito um grande acompanhamento na pré-época de colocação de juniores noutros clubes, existindo uma observação permanente. Somos o clube da I Divisão que tem um maior número de jogadores da casa na equipa principal - um terço do plantel foi feito nas escolas do Boavista. Curiosamente, o Jacaré foi o único jogador que não observei pessoalmente. Estou arrependido de não o ter feito, mas estava ocupado com a transferência do Nuno Gomes e do Jimmy.

EXP. - Está a passar um atestado de incompetência ao técnico que o contratou...

J.L. - Não, é uma realidade. O Douala também não o vi com os meus olhos e é um grande jogador. Estou a falar em concreto da época passada. O problema do Jacaré é que não se adaptou, passava os dias a chorar. Agora até está a jogar no Brasileirão.

EXP. - Quem foi o melhor treinador que já passou pelo Bessa?

J.L. - Se atendermos só aos resultados, José Maria Pedroto, que nos levou ao segundo lugar. Gostei muito de trabalhar com o Manuel José e mantenho uma óptima relação com o Mário Reis, apesar de as coisas não terem corrido bem. Agora, quem prefiro é o Jaime. É um técnico com uma filosofia de vida idêntica à minha - trabalha muito, une bem o grupo, tem uma atitude ambiciosa, mas sólida. Às vezes, ambição em demasia tolda o espírito.

EXP. - Para um clube em ascensão, não é pouco mediático, introvertido...

J.L. - Ainda bem. Um técnico tem é de treinar bem. Aliás, certos treinadores até trabalham bem, mas perdem-se por falar demais. O Jaime é um exemplo de discrição, o que só lhe fica bem. Temos conversas simples e directas.

EXP. - Como se acaba com o boicote dos árbitros aos jogos do Sporting?

J.L. - Não sei. O conflito tornou-se um braço-de- ferro, e quem ceder será considerado perdedor. O conflito foi demasiado extremado de parte a parte. Este ano, no Boavista, procurámos falar o menos possível da arbitragem porque, com a cabeça quente, dizem-se coisas impensadas e injustas. Quem ama um clube vive os jogos de forma apaixonada, não pode depois falar desapaixonadamente.

EXP. - O que já aconteceu consigo...

J.L. - É verdade. Uma coisa é estar de fora, outra é ver um jogo da minha equipa. Dou um exemplo concreto. O ano passado, no final do Leiria-Boavista, teci críticas demasiado duras a Vítor Pereira. Antes de ele ir para o Mundial escrevi-lhe uma carta pessoal a pedir desculpa. E não me custou nada fazê-lo. Até me senti melhor.

EXP. - A reforma da Taça UEFA e da Taça da Taça, que dará lugar a uma única prova, beneficiará o Boavista?

J.L. - Sim, o modelo favorece clubes como o Boavista que geralmente participam nas competições europeias. Ficarão mais sustentados no futuro. O balanço, em termos financeiros, da nossa presença na UEFA é fraco. Só se ganha dinheiro quando se joga com equipas italianas ou espanholas. Resta-nos o prestígio e o sucesso desportivo. Com o novo figurino, se os prémios de presença forem de 10 por cento dos praticados na Liga dos Campeões, ganharemos entre 200 a 300 mil contos por presença. É quase metade do nosso orçamento actual.

publicado no semanário Expresso em outubro de 1998.