PÓS-MODERNIDADE, POLÍTICA E EDUCAÇÃO-1

Holgonsi Soares Gonçalves Siqueira-2


1-  Resumo da Conferência realizada no VIII Encontro de Ciências Sociais da Universidade Federal de Pernambuco. Recife, 11.11.2005. Resumo para publicação nos anais do evento.

2-  Professor Adjunto/2 do Dept º de Sociologia e Política da UFSM. Doutor em Educação.


O tema que me foi proposto trabalhar nesta conferência é bastante complexo. Primeiro, devido aos vários encaminhamentos possíveis; segundo, porque sob qualquer ótica de abordagem, estamos na verdade tratando da questão da mudança (o que dificulta muitas vezes o entendimento por parte dos adeptos daquilo que K.Kummar chama de "tese da continuidade"); terceiro, devido a complexidade inerente a cada termo envolvido nesta relação.

Assim, proponho, a partir da complexidade do termo "pós-modernidade", destacar os principais aspectos envolvidos neste debate, analisar as características que considero centrais para o entendimento do contexto pós-moderno, e concluir sobre a necessidade de uma "educação pós-moderna crítica" que tenha condições de dialogar com os desafios resultantes deste novo contexto.

No que diz respeito à pós-modernidade, sigo o entendimento proposto por F.Jameson de que ela é mais do que uma categoria especificamente cultural, ou seja, é uma condição histórica, original, que corresponde a fase tardia do capitalismo (ou capitalismo multinacional).

Já na sua relação com a modernidade, e seguindo o mesmo pensador, acredito ser impossível defender filosoficamente, ou justificar empiricamente se a pós-modernidade é uma ruptura ou uma continuidade. Sob este aspecto, costumo pensa-la como um conjunto de novas condições no âmbito do social, do político, do econômico, do cultural e do tecnológico, mas também como um conjunto de continuidades (questões modernas não resolvidas, e outras intensificadas) que não podem ser desprezadas. É certo que estas questões motivam discussões inscritas em alguma moldura teórica e perpassadas por fortes influências político-ideológicas.

Entendendo-a como condição histórica, destaco que a pós-modernidade é utópica e distópica; pode ser lúdica, transgressiva, construtiva e destrutiva, crítica e conservadora, ou seja, é uma condição permeada de contradições produtivas e não-produtivas. Como F.Jameson chamou a atenção, a "pós-modernidade deve ser pensada dialeticamente, como um progresso e uma catástrofe ao mesmo tempo".

Com base neste pensamento, destaco aqui (como características não-produtivas) que a pós-modernidade é o mundo no qual encontramos de forma intensificada, os simulacros e as simulações, bem como suas relações com o espetáculo e o consumismo; é o mundo fragmentado do presente perpétuo e também da performatividade como critério técnico de legitimação da ciência e da vida pós-moderna. A pós-modernidade aumenta a distância entre os "turistas e vagabundos" (usando a já clássica metáfora de Z. Bauman), e neste processo, intensifica graves problemáticas sociopolíticas. Seguindo este rumo, é fácil afirmar que a pós-modernidade é o contexto da obsolescência planejada, dos contratos temporários (em todas as áreas da vida) e das angústias existenciais.

Mas esta para mim não é toda a história, ou melhor, a pós-modernidade não deve ser vista apenas como "catástrofe", pois ela é também o mundo das contradições produtivas. Nesta ótica destaco o seu descrédito às metanarrativas e suas soluções globais que tentavam dirigir o destino humano. Relaciono este descrédito ao enfraquecimento das "verdades formulares", e portanto à morte do "Pai Todo Poderoso" que nos deixava calados frente ao poder da tradição. Mas na pós-modernidade podemos (e devemos), usando uma frase de C.Castoriadis, "questionar a Virgindade da Virgem", o que faz do contexto pós-moderno um lugar propício para as "verdades proposicionais".

Neste sentido, é indispensável um link com o pensamento de A.Giddens para dizer que a pós-modernidade é o mundo da destradicionalização e da reflexividade, e conseqüentemente, um mundo de "indivíduos mais ativos". Indivíduos que não acreditam mais em decisões políticas impostas, rígidas, burocratizadas e que não condizem com suas necessidades. Através das micropolíticas, os atores pós-modernos estão redimensionando o entendimento da política, e como diz U.Beck, "os microgrupos de poder abrem possibilidades de uma mudança na relevância e na qualidade da política".

Ora, todas estas questões (produtivas e não-produtivas) da pós-modernidade colocam desafios e exigências de mudança para a estrutura educacional, afinal, "a educação, suas leituras e currículos, são realidades históricas concretas e não metafísicas" (A.Gramsci). Creio que a resposta às mudanças, passa pela construção de uma "educação pós-moderna crítica", e que de forma geral caracterizo como sendo uma educação, efetivamente, interdisciplinar: seu objetivo maior é a formação "omnilateral" dos indivíduos; rompe as fronteiras e amplia o sentido de "espaço educativo"; situa-se na contemporaneidade, considerando no contexto da educação formal os problemas sociais, políticos, econômicos e culturais que repercutem na prática do cotidiano; toda a sua estrutura influencia positivamente na autonomia dos indivíduos; e por fim, tendo por base o multiculturalismo crítico, educa para o respeito à dialética igualdade-diferença. Uma educação pautada pelo princípio da "democracia dialógica", que (a partir das palavras de B.Santos), capacita os indivíduos a lutarem pela diferença quando a igualdade padroniza, e a lutarem pela igualdade quando a diferença inferioriza.

Concluindo, eu diria que a pós-modernidade, como a condição histórica na qual estamos vivendo, é o lugar das complexidades e das contradições. É um mundo com exclusões, problemas de grandes conseqüências, violências, etc., mas é um contexto também de oportunidades utópicas, representadas em uma nova forma de se relacionar com o "Outro" e em uma nova forma de fazer política. A condição pós-moderna rompeu, positivamente, com o paradigma da pureza e da essência; transgrediu fronteiras que sempre obstaculizaram o livre intercâmbio de idéias e projetos; é lugar de "possibilidades transgressivas", desafiadoras de um conjunto de normas culturais dominantes, monolíticas e contrárias às diferenças e aos conflitos.

Em conjunto com as mudanças da pós-modernidade, torna-se indispensável uma "educação pós-moderna crítica", que ao valorizar as competências sociais e políticas de outros espaços educativos, contribua para que os indivíduos possam configurar suas vidas de forma diferenciada e autônoma, no lugar de ações rígidas, padronizadoras e geradoras de heteronomia. Neste contexto de complexidades e contradições, "é necessário que haja instituições que facultem a produção de argumentos e o confronto articulado de posições e de proposições de futuros alternativos para a vida em sociedade" (C.Castoriadis).


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