VISÕES SOBRE AS NOVAS TECNOLOGIAS*

HOLGONSI SOARES GONÇALVES SIQUEIRA

* Publicado no Jornal "A Razão" – 02.08.2001

"Eu não estou dizendo que tudo é ruim; eu estou dizendo que tudo é perigoso" (M.Foucault).

A explosão das novas tecnologias (de informação, de entretenimento e comunicação, de reestruturação do mundo do trabalho e do lazer), tem proporcionado um grande debate sobre os efeitos das mesmas para o homem pós-moderno. Este debate é marcado por duas visões; seguindo a classificação de D.Kellner, temos a visão dos tecnófilos e dos tecnófobos. Os primeiros fazendo uma apologia total às novas tecnologias, são os otimistas sem restrições; para eles estas tecnologias são revolucionárias porque possibilitam aos indivíduos imaginarem novos caminhos que jamais foram considerados, permitindo que os mesmos vivenciem e façam coisas novas de forma melhor e mais rápida. Sob esta ótica, as novas tecnologias são apenas ferramentas que estão à disposição dos usuários para maximizar suas performances, e portanto o que se considera aqui são as habilidades para usá-las. Na Filosofia da tecnologia, esta visão faz parte da Teoria Instrumental, a qual afirma que a tecnologia não pode ser ruim pois é puramente um meio que ajuda os indivíduos a alcançarem suas metas; sendo apenas um instrumento útil, é neutro, não afetando qualquer outro valor, pois está associada exclusivamente à eficiência.

Por outro lado, os tecnófobos são os pessimistas tecnológicos de plantão; para eles o avanço tecnológico é de cunho elitista, conservador, autoritário e como sempre... "neoliberal"(!). Com sua concepção determinista sobre as novas tecnologias, vêem estas como "parte de uma invenção diabólica" (M.Arroyo), com um exacerbado poder deformador/destruidor das formas culturais existentes. Associada à Teoria Substantiva, e aos pressupostos Heideggerianos, a visão dos pessimistas nega a questão técnica como possibilidade para a mudança social, e afirma-a como desumanizadora, tornando-nos pouco mais que objetos. Para eles, a instrumentalização do homem e da sociedade é um destino do qual não se pode fugir. Poderíamos concluir então que as novas tecnologias constituem-se num novo tipo de sistema cultural, cuja expansão dinâmica invade e controla, autônoma e autoritariamente todas as formas da vida social. Esta visão está ganhando força no momento atual, principalmente quando os perigos da tecnociência tornam-se mais evidentes.

Porém uma visão efetivamente crítica/dialética das novas tecnologias, não ignora que elas estão saturadas de negatividades mas também de positividades (ou vice-versa); não concebe a técnica de forma autônoma, à parte da sociedade, das relações econômicas, políticas e culturais, e sim de forma integrada; portanto não há uma imposição determinista sobre o social. Isto nos faz compreender que as novas tecnologias não colocam-nos objetos exclusivamente técnicos, visão cartesiana que percebe os objetos isoladamente, esquecendo que os mesmos constroem um sistema aberto e dinâmico, que inserem-se conflituosamente nos processos culturais, e que tornam-se dispositivos pelos quais percebemos o mundo.

O campo das novas tecnologias é, como diz P.Lévy, "um campo aberto, conflituoso e parcialmente indeterminado, no qual nada está decidido a priori". Neste campo não há imutabilidade, mas constantemente novas conexões imprevisíveis. Por isto, o filósofo, o educador, o historiador ou o sociólogo precisam ir mais longe, não podem ficar presos a um ponto de vista, e sim, "abrir-se a possíveis metamorfoses" (Lévy).

Com base no pensamento inicial de M.Foucault, e adepto das contradições e relações, eu diria que as novas tecnologias não são totalmente más, ou totalmente boas, mas complexas. Não colocam-nos um caminho linear, mas um caminho repleto de bifurcações, nas quais podemos e devemos tomar decisões. As novas tecnologias podem ser usadas como instrumentos para consolidação de um poder dominante, como podem estar à serviço de indivíduos que lutam pela democracia; podem colaborar na criação de uma sociedade mais, ou então menos igualitária.

Se somos sujeitos ativos neste processo, então "é mais útil apreender o real que está nascendo, torná-lo autoconsciente, acompanhar e guiar seu movimento de forma que venham à tona suas potencialidades mais positivas" (P.Lévy). Podemos/devemos intervir nas inovações técnicas, reconfigurando-as para que sirvam aos interesses de emancipação e bem-estar humano, embora tenhamos que reconhecer que este é o desafio mais difícil, e que portanto não deve deixar de fazer parte de nossos objetivos político-educacionais.

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