EM PRINCÍPIO E A PRINCÍPIO

Em vista das observações de alguns leitores sobre o uso que fiz da expressão ‘a princípio’ em artigos anteriores, venho agora elucidar a questão. O termo ‘princípio’ se refere tanto a "origem, começo, estréia" quanto a "convicção, modo de ver, opinião que o espírito admite como ponto de partida", além de "preceito moral, regra, lei", entre outras acepções. Com as preposições a e em forma locuções distintas, a saber:

- a princípio: à primeira vista, logo a princípio, inicialmente, primeiramente, de início, de entrada, no começo, de começo [ou na gíria: "de cara"].

Pensamos, a princípio, que se tratava de um animal pré-histórico, mas depois constatamos que era simplesmente uma espécie rara de predador.
A princípio eu não sabia de nada, mas um dia ela me contou tudo.

- em princípio: em tese, em teoria, teoricamente, em termos, de modo geral; conforme Aurélio: "Antes de qualquer consideração; antes de tudo; antes de mais nada". O próprio dicionário deixa o significado mais claro no verbete ‘tese’: "Em tese. De acordo com o que se supõe; em princípio; em teoria".

Vais assistir ao filme Bossa Nova conosco? – Em princípio, vou; mas dependo da confirmação de outro compromisso.
Em princípio não estamos interessados em vender esse imóvel.

O professor Luiz Antonio Sacconi, no seu livro "Não erre mais" (Ed. Moderna, 1979), exemplifica de forma jocosa essa diferença: "Em princípio todo casamento é uma maravilha. / Todo casamento é, a princípio, uma verdadeira maravilha. Depois, bem, depois é o fim..."

EM ANEXO

De Marília - SP, Gustavo P. F. Piola manda a seguinte consulta: "Quase sempre, ao redigir uma peça processual, faço referências a documentos que estão no processo ou então àqueles aos quais requeiro a juntada aos autos. Pois bem, a expressão mais comumente usada é: ‘conforme certidão em anexo’ ou ‘de acordo com o boletim de ocorrência em anexo’. Ocorre que ouvi de um colega ser errada a expressão em anexo, bastando colocar ‘conforme certidão anexa’ ou ‘de acordo com o boletim de ocorrência anexo’, sem o em".

Também eu já ouvi a bobagem de que em anexo não existe. Ué, se estamos a discutir a expressão, é porque ela existe! O fato é que há muito tempo o respeitado gramático Napoleão Mendes de Almeida escreveu que essa era uma construção errônea: "São espúrias locuções como ‘em absoluto’, ‘em definitivo’, ‘em suspenso’, ‘em anexo’. Em português de lei deverá em lugar delas aparecer ou um advérbio em mente ou o adjetivo com força adverbial: ‘Absolutamente não quero’ – ‘Estou definitivamente decidido a ir’ – ‘Deixei tudo suspenso’." (Dicionário de Questões Vernáculas, 1981, p.93) Exagero dele, que acabou não exemplificando em anexo, até porque ‘anexamente’ não existe mesmo.

No caso de ‘o boletim anexo’, o termo anexo é um adjetivo, portanto variável em gênero e número conforme o substantivo a que se refere: certidão anexa, cópia anexa, boletins anexos, planilhas anexas. É uma opção. A outra é usar a locução adverbial ‘em anexo’.Eu até recomendo às pessoas que têm alguma dificuldade com a concordância nominal que usem sempre a locução, pois aí não há perigo de erro, uma vez que, como é de rigor a todo advérbio, ela fica invariável: conforme certidão em anexo, cópias em anexo, boletim em anexo, documentos em anexo.

E não se preocupem: a locução está abonada por muitos gramáticos, como Celso Luft. Quem tiver o Manual de Redação da Presidência da República (1991), dê uma olhada na página 170.

*Maria Tereza de Queiroz Piacentini, autora dos livros "Português para Redação" e "Só Vírgula", diretora do Instituto Euclides da Cunha, http://www.linguabrasil.com.br

 







principal



links



jurisprudência



súmulas



arquivos jurídicos




Email:
utjurisnet@utjurisnet.zzn.com