O PAPEL DO MINISTÉRIO PÚBLICO NO PROCESSO ELEITORAL
Delson Lyra da Fonseca
Procurador da República
I - INTRODUÇÃO
O objetivo desta abordagem é buscar parâmetros jurídico-legais que permitam delimitar O Papel do Ministério Público no Processo Eleitoral, advertindo que o termo processo não está aqui sendo utilizado no sentido restrito do Direito Processual - instrumento de que se serve o Estado-jurisdição para compor conflitos de interesse - e sim na sua compreensão mais abrangente e vernacular de sistema ou conjunto de atos, métodos ou procedimentos por que se realiza alguma coisa.
Fossemos buscar definição e parâmetros para as funções reservadas ao Ministério Público na realização dos direitos eleitorais na legislação eleitoral e partidária, embasados em sua literalidade e limitados à prática que fez a sua história mais remota nas eleições brasileiras, restariam não muitas questões a merecerem considerações no tratamento do tema proposto. Talvez por força da tradição positivista no Direito, buscamos ou enxergamos o texto infraconstitucional como fonte indispensável à efetividade da Ordem Jurídica e por isso somos levados a aspirar leis que elenquem à exaustão as tarefas da Instituição no processo eleitoral.
Por conseqüência, menos em face da (por vezes) sustentada ausência ou deficiência de previsão legal e mais pela postura de alheamento dos próprios Agentes da Instituição, que resulta da deficiência de análise e da prática reducionista - campo onde as exceções confirmam a regra - e sem passarmos os olhos mais atentamente nos dispositivos erigidos nessa perspectiva, afirmaremos que ao Promotor Eleitoral caberia participação menor no processo eleitoral. Iriam merecer registro, apenas, coisas como presenciar a abertura de urna com suspeita de violação e exercer a ação penal nos delitos eleitorais (perante os Juizes Eleitorais) ou exercitar o "custos legis" nos moldes clássicos e a autoria das ações penais de competência originária (perante os Tribunais).
É certo que essa visão e essa postura já começam a fazer parte do nosso passado institucional, contudo, ainda que não tão distante quanto desejado. Basta recordar que ainda são muitos os Membros da Instituição, em todas as esferas, que mantêm a posição de alheamento, assim como ainda são freqüentes e atuais as decisões judiciais proclamando a ausência de legitimação do MP para causas eleitorais que dizem respeito a matérias onde a lei prevê a legitimação de candidato ou Partido -por exemplo, em casos de fraudes e nulidades na fase de votação e apuração, como se verificou nas eleições de 1992 em Alagoas .
Depois disso, não podemos continuar fingindo desconhecer que se a Função Jurisdicional em geral é carente de meios estruturais (materiais e humanos), a Função Jurisdicional Eleitoral é verdadeiramente indigente, pois não interessa aos controladores do poder o seu fortalecimento. Desgraçadamente, o maior interessado no funcionamento escorreito do Judiciário Eleitoral continua sendo a oposição e só perdura enquanto tal: os opositores de hoje que se rebelam contra esse quadro são os defensores de sua manutenção amanhã, quando chegam ao poder - sempre com registro das honrosíssimas exceções, claro.
Também não é possível desenvolver qualquer análise da operacionalidade do Direito sem admitir que as leis a serem interpretadas e aplicadas, enquanto conjunto de normas disciplinadoras das relações sociais, são fruto de nossa formação social, resultam das hegemonias das forças dominantes e, assim, expressam os conflitos, as contradições e as exclusões que a caracterizam. Por decorrência, a função jurisdicional finda por ser instrumento de manutenção e de reprodução dessa realidade.
Some-se, ainda, a origem e a formação que caracterizam os nossos operadores jurídicos. Como regra, provêm de classes sociais dominantes e recebem formação técnica num processo educativo desenvolvido para satisfazer aos interesses dessas.
Considere-se, por último, a importância dos veículos de comunicação social que cada vez mais se capacitam na produção de fatos e imagens para serem veiculados como produto de consumo, quando seu papel haveria de ser o de bem transmitir dados e informações. Assim, eles têm sido eficientes em produzir candidatos e governantes, do mesmo modo como o são em destruir candidatos e governantes.
O resultado, de todos conhecido, está em que nosso processo político eleitoral se revela mero produto desse caldo cultural, um verdadeiro jogo de "faz de conta": as pessoas que integram o grande contingente da população politicamente analfabeta fazem de conta que se alistam eleitores e que votam em senhores que agem como se fossem candidatos e estivessem aptos ao exercício do poder; estes aparentemente são eleitos e fazem de conta que governam, até o próximo ciclo. Esse processo acaba sendo referendado pela Jurisdição Eleitoral, ao fazer de conta que ele transcorreu com normalidade, como em geral se ouve nas solenidades de diplomação.
Contudo, não se trata de respaldar o padrão reduzido da atuação anterior, quantitativa ou qualitativamente, nas normas do Direito Positivo aplicável -ou na carência delas, nem nas práticas que escondem propósitos e submetem a Função Jurisdicional Eleitoral aos interesses dos que se apropriam do Estado e ditam a sorte de seu Povo. Cuida-se de demonstrar e aferir essa relação de causas e efeitos, visando dimensionar a responsabilidade e a participação do MP no quadro diagnosticado, com a finalidade de buscar:
a) mudança de postura no Parquet, na Magistratura e nos demais atores sociais de algum modo inseridos no processo, nos respectivos âmbitos e dimensões;
1. melhor aproveitamento dos espaços existentes, criados ou reforçados para a Instituição, na qualidade de veículo realizador da expressão do Poder Social do Estado, através do atual conjunto de normas aplicáveis - a partir da base de princípios ofertada pela Carta de 1988, que remoça, oxigena e potencializa o alcance da legislação institucional, eleitoral e partidária com ela compatível;
2. a instrumentalização adequada dos órgãos da Função Jurisdicional Eleitoral, para que se ajustem aos anseios da sociedade e consolidem seu papel de instrumento garantidor do equilíbrio democrático.
Quanto à adoção de novas posturas, felizmente, estamos vivenciando-as com razoável celeridade no seio do Ministério Público e da Magistratura, bem como entre os atores do processo. A convivência democrática força esse aperfeiçoamento pela via do controle social que a publicidade e a transparência impõem. Os Partidos Políticos e os homens públicos foram obrigados a descobrir que a veiculação pública de seus atos é algo eficaz e pode resultar efeito negativo a seus interesses corparativos ou pessoais. A liberdade assegurada aos veículos de comunicação social os aperfetiçoa rapidamente como instância de julgamento popular, causa de grande temor dos que vivem a lógica da atividade político-partidária. O crescimento da organização e da consciência de cidadania no conjunto da sociedade também é marcante: o voto já não é uma mera promissória em branco tanto quanto antes; é bastante ver as mudanças de opinião entre a eleição e os anos de exercício do cargo. Enfim, de alguma maneira, com maior ou menor intensidade, estamos buscando o rumo traçado pela nova ordem constitucional, compatível com a função do processo das eleitoral no Estado Democrático de Direito.
Claro que essas mudanças são desejadas sempre em maior intensidade e rapidez pelos interessados, mas não podemos deixar de reconhecer que paciência, persistência e equilíbrio são fatores indispensáveis ao caminhar seguro; não se modificam convicções sem reconhecê-las, respeitá-las e investir na demonstração do novo melhor pelo convencimento. Só assim conquistam-se espaços e consolidam-se posições.
II - FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS
A República Federativa do Brasil constitui-se em ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, assentado na soberania do seu povo exercitada através dos instrumentos de democracia representativa e participativa. Nos limites do objetivo deste trabalho, interessa a primeira, já que nela está situado o conjunto de instituições que disciplinam a participação popular no processo político e qualificam a cidadania, tais como constam as eleições, o sistema eleitoral, os partidos políticos, enfim, cuida-se da matéria regulada nos artigos 14 a 17 da Constituição da República .
Nesse contexto insere-se o voto enquanto configuração material e veículo dessa participação popular no processo democrático, como ato político que concretiza o direito subjetivo público de sufrágio que, por sua vez, consiste no direito que tem o cidadão de eleger, ser eleito e participar da organização e da atividade do Poder Estatal .
E o processo eleitoral, tomado agora num significado peculiar, nada mais significa senão que um instrumental composto de atos e procedimentos, jurisdicionais ou não, destinado a assegurar o exercício dos Direitos Eleitorais em todos os seus quadrantes: desde a formação do corpo eleitoral pelo alistamento, passando pela disciplina do ciclo vital das agremiações partidárias, percorrendo a eleição propriamente dita (captação e apuração dos votos e proclamação dos eleitos).
A mesma Carta Política, que delineou essa feição do Estado Democrático de Direito, definiu o Ministério Público como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa do regime democrático, da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis (art. 127) e ordenou que promovesse as medidas necessárias à garantia dos direitos nela assegurados (art. 129-II). Registre-se que tais dispositivos ostentam eficácia plena e operam aplicabilidade imediata, características que lhes conferem capacidade para incidir por si mesmos, sujeitando o legislador às suas cogências e dando ao aplicador sustentáculo legal para buscar a realização da ordem jurídica, tendo por meta a efetividade da Constituição e extraindo de suas normas o maior teor eficacial possível.
Outrossim, não excede invocarmos, em reforço, a eficácia da cláusula constitucional que atribui à Instituição a defesa da ordem jurídica e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, tendo presente a natureza dos Direitos Políticos, onde o próprio objeto das relações jurídicas eleitorais têm assentadas suas raízes; é do conceito de Direito Eleitoral - ramo do direito público que tem por fim o estudo das normas e procedimentos que organizam e disciplinam o funcionamento do poder de sufrágio popular, de modo a que se estabeleça a precisa adequação entre a vontade do povo e a atividade governamental, -que extrairemos a substância dos Direitos Políticos, em harmonia com as noções de voto e sufrágio antes vistas.
Leve-se em conta, ainda, que diante da configuração no nosso Direito Constitucional, o voto é ao mesmo tempo direito subjetivo público e dever social da cidadania, dada a obrigatoriedade do seu exercício, sob ameaça de sanção.
É o necessário e suficiente para visualizar essa matéria no topo dos valores juridicamente protegidos da sociedade e reconhecer a marca do interesse público de destacada relevância, afora o fato de caber na compreensão de direito individual indisponível. Conseqüentemente, abre-se espaço para o manuseio das bases legislativas que expressamente legitimam o Ministério Público no âmbito geral das suas clássicas funções, enquanto parte ou na qualidade de fiscal da lei.
Assim, resulta demonstrado o necessário e suficiente suporte constitucional para afirmar a amplitude da legitimação do Ministério Público Eleitoral em todo o complexo de atos e procedimentos que informam a realização do processo eleitoral. A partir disso, é só buscar na ordem infraconstitucional o suporte para a atuação concreta - justa homenagem e indispensável sujeição ao princípio da legalidade - de sorte a fazer aterrizar nessa realidade empírica os valores jurídicos que residem nos Princípios Gerais de Direito (constitucionalizados ou não).
III - FUNDAMENTOS NA ORDEM INFRACONSTITUCIONAL
1. Na legislação especial
Aqui considero incluídas, fiel ao limite do tema, todas as normas que disciplinam ou dizem respeito ao processo eleitoral em sua amplitude e complexidade. Isso implica passar as vistas no Código Eleitoral, na Lei Orgânica dos Partidos, nas leis que regulam pleitos específicos, na Lei das Inelegibilidades e em algum outro texto especialmente aplicável.
E não é pouco para delinear o elastério das funções do Ministério Público Eleitoral, a saber, exemplificativamente:
I - perante o primeiro grau de jurisdição:
- exerce a ação penal nos delitos dessa natureza; presencia a abertura de urna com suspeita de violação; promove a definição de responsabilidade por nulidade de eleição; promove a impugnação de registro de Partidos e órgãos dirigentes; promove o pedido de desaforamento; promove justificações e antecipações de provas; representa pela instauração de investigação judicial eleitoral para apuração de uso indevido, desvio ou abuso do poder econômico ou do poder de autoridade ou a acompanha ativamente; promove as medidas decorrentes da procedência da investigação judicial eleitoral no âmbito administrativo e judicial; promove a ação constitucional de impugnação de mandato eletivo; recorre da diplomação de eleitos; promove as medidas adequadas visando a aplicação da sanção judicial de impedimento de pessoa jurídica para licitar e contratar com o poder público;
II - perante o Tribunal Superior e os Tribunais Regionais as atribuições no primeiro grau podem se repetir, a depender do nível federativo e, conseqüentemente, da esfera de jurisdição em que as relações jurídicas partidárias e eleitorais e o pleito se desenvolvam. Além dessas, exerce as funções de custos legis em todos os feitos que tramitem na respectiva Corte, inclusive nos de natureza administrativa.
Todavia, é preciso lembrar que não raro os fatos eleitorais produzem efeitos noutras esferas jurídicas, acarretando responsabilidades nas órbitas administrativa, civil e criminal, o que reclama a atuação ministerial no exercício de suas atribuições gerais. É o caso, por exemplo da proposição de ações para declarar ou decretar a nulidade de negócios jurídicos ou atos da administração pública realizados em detrimento das vedações legais destinadas a proteger a normalidade e a legitimidade das eleições.
Nesse ponto, oportuniza-se destacar a redação do § 9º do artigo 14 da CF, dada pela ECR Nº 4/94, que inclui entre os casos de inelegibilidade práticas atentatórias à probidade e à moralidade administrativas, e reclama seja considerada a vida pregressa do candidato. Noutra parte (artigos 15-V e 37 § 4o), a Carta sanciona com a pena de suspensão de direitos políticos os atos de improbidade administrativa.
Independentemente do que dispõe a Lei das Inelegibilidades, ou na busca da maior efetividade desta, o tratamento do tema conduz ao teor da Lei da Improbidade Administrativa (Lei nº 8.429. de 02.06.92), a qual define as pessoas - agentes públicos ou não - sob seu alcance, com adequada abrangência; conceitua os atos considerados de improbidade administrativa, segundo o resultado danoso alcançado em detrimento dos valores jurídicos protegidos e prevê as respectivas sanções.
Assim, sem prejuízo das conseqüências civis, administrativas e penais, estatui a lei em comento no seu artigo 12, em síntese, que as práticas que importem enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário ou atentem contra os princípios da Administração Pública tipificadas nos art. 9o, 10 e 11 darão ensejo à pena de suspensão dos direitos políticos pelos prazos que especificam (desconsiderando a dosimetria prevista para cada figura típica, a sanção varia entre o máximo de dez e o mínimo três anos).
Como a suspensão dos direitos políticos conduz ao cancelamento da inscrição do eleitor enquanto durarem seus efeitos, esse diploma legal opera repercussões importantes: a) nas relações jurídicas de direito material eleitoral que tenham por objeto requisitos de elegibilidade ou causa de inelegibilidade decorrente de desvio de comportamento administrativo; b) no âmbito processual; c) no campo das funções institucionais e dos instrumentos de atuação do Ministério Público.
É que embora os institutos previstos na Constituição e regulamentados na Lei das Inelegibilidades tenham aplicação própria e independente da disciplina dessa lei especial, não há como deixar de reconhecer a repercussão positiva que sua efetividade trará nesse campo. Basta inferir que a condenação dela decorrente, caso o provimento judicial aplique a pena de suspensão dos direitos políticos, constituirá título judicial cuja execução impede o exercício dos Direitos Políticos, suprimindo essa condição de elegibilidade.
Afora isso, dada a conceituação ofertada, tem ela um papel de indiscutível relevo quanto à definição das condutas capazes de precipitar o efeito jurídico das inelegibilidades embasadas em desvio administrativo, podendo servir à aplicabilidade das normas eleitorais sancionadoras, as quais, não raro, trazem dispositivos em branco, desprovidos de completude conceitual.
Por fim, o Ministério Público pode promover diretamente, de ofício ou mediante representação de qualquer pessoa ou autoridade, a apuração da notícia de prática de ato de improbidade administrativa, assim como, poderá requisitar a instauração de inquérito policial ou procedimento administrativo, utilizando-se dos instrumentos que a legislação institucional oferece. Em juízo, detém a legitimação ad causam, igualmente conferida ao ente jurídico interessado, para a ação civil pública que veiculará a pretensão, em cuja abrangência está situada a afetação aos Direitos Políticos.
2. Na legislação institucional
Face a ausência de disciplina constitucional própria, tem-se discutido se a função ministerial no processo eleitoral é integralmente federal e os membros dos Ministérios Públicos estaduais atuariam por força de delegação legal, ou se seria fragmentada em parte federal e parte estadual. Não se constitui tarefa difícil afirmar a correção da primeira assertiva, porquanto, sendo a função jurisdicional eleitoral federalizada também o é a do Ministério Público que perante ela atua.
Contudo, vejo nessa questão um falso dilema, fruto das imperfeições ou características do nosso sistema de Jurisdição Eleitoral, pois, o Ministério Público Eleitoral não existe como instituição autônoma, com corpo próprio. Não é referido na Constituição entre os ramos do Ministério Público da União nem no dos Estados. Discutir a conveniência ou não de sua existência como ramo próprio envolve o mesmo debate sobre a necessidade de uma Magistratura Eleitoral de carreira, Uma situação levará à outra . Importa mais identificar o que e a quem compete fazer para que os Direitos Políticos sejam realizados.
Também é fato que a Lei Complementar nº 75/93 (lei de organização do Ministério Público da União) disciplinou a matéria no rota da federalização. No artigo 5o, estatuiu ser função institucional do Ministério Público da União a defesa do regime democrático com fundamento na soberania e na representatividade popular; dispôs no art. 37 que o Ministério Público Federal exercerá suas funções nas causas de competência dos Tribunais e Juízes Eleitorais; nos artigos 72 a 80 rege o que chamou de "funções eleitorais do Ministério Público Federal". Parece-me induvidoso que o legislador poderia, depois de reconhecida como sendo responsabilidade da União a função do Ministério Público no processo eleitoral, disciplinar a estrutura orgânica peculiar e as atribuições do Ministério Público Eleitoral, escapando às dificuldades atuais. E se for estabelecido um paralelo com o Judiciário Eleitoral - que é justiça da União e não federal no sentido estrito - a constatação resultante reforçará a conclusão aqui afirmada.
No artigo 78 estabeleceu que as funções eleitorais do Ministério Público Federal perante os Juízes e Juntas Eleitorais serão exercidas pelos Promotores Eleitorais, denominação orgânica que recebem os Promotores de Justiça investidos no ofício eleitoral. O artigo 79 considera Promotor Eleitoral natural o membro do Ministério Público local que oficie perante o Juízo incumbido do serviço eleitoral de cada Zona, enquanto seu § único estatui que a designação de substituto, nos casos de recusa ou impedimento do Promotor Eleitoral natural, concretiza-se mediante ato complexo, onde o Chefe da Instituição Estadual indica o Promotor a ser designado pelo Procurador Regional Eleitoral.
A Lei Orgânica Nacional dos Ministérios Públicos dos Estados (Lei n 8.625/93) trata do tema de maneira restrita (art. 10, IX, h; art. 32, III; art. 50, VI e art. 73) e no art. 80 prescreve a aplicação subsidiária da lei institucional do MPU.
Logo, na tentativa de encontrar uma disciplina jurídico-institucional única para o Ministério Público Eleitoral, a solução possível será reconhecer que os integrantes do Parquet local, quando no exercício da função eleitoral, estão sob a regência da Lei Complementar nº 75/93 - em plenitude no que toca às normas disciplinadoras das atribuições eleitorais do Ministério Público Federal e no que couber, no que tange aos instrumentos de atuação do MPU.
Dessarte, buscando arrimo nos dispositivos do Código Eleitoral e das Leis Orgânicas das Instituições, são os órgãos do Ministério Público Eleitoral:
1. o Procurador-Geral Eleitoral - com função junto ao TSE - é o Procurador-Geral da República;
2. os Procuradores Regionais Eleitorais - com função perante os Tribunais Regionais Eleitorais - são os Procuradores Regionais da República ou Procuradores da República, designados pelo Procurador-Geral Eleitoral;
3. os Promotores Eleitorais - com função perante os Juizes e Juntas Eleitorais - são os Promotores de Justiça que oficiem junto a tais Juízos (como titulares ou substitutos), ou aqueles que forem excepcionalmente designados, nos casos de impedimento ou recusa.
Por último, tem lugar considerações rápidas acerca das garantias, prerrogativas e vedações aplicáveis aos agentes do Ministério Público Eleitoral, à luz da legislação especial e institucional aplicável.
Quanto às garantias, nada de novo, porquanto incidem as mesmas que acobertam e instrumentalizam o exercício funcional do Ministério Público nos demais campos de atuação, sob o alcance do que estatuem a Constituição e as leis institucionais.
No campo das prerrogativas e vedações, além dequelas comuns aos Membros da Instituição, algumas lhes são próprias, merecendo exemplificação:
1. não podem exercer outras funções eleitorais (mesário, escrutinador, auxiliar) nem integrar Junta Eleitoral;
2. têm direito de preferência na votação, podendo exercê-lo em qualquer seção da Zona onde atuar (nos pleitos estaduais e federais) e em qualquer seção do Município onde for eleitor (nos pleitos municipais);
3. podem ser filiados a Partido Político, concorrer a eleições (satisfeitos os requisitos de elegibilidade) e exercer cargo eletivo (mediante afastamento da função);
4. ficam impedidos para o exercício das funções do Ministério Público Eleitoral, qualquer que seja ela, a partir da filiação partidária e até dois anos após a desfiliação .
IV - CONCLUSÕES
1. Diante do regramento constitucional, é de se reconhecer ao Ministério Público Eleitoral amplo papel e legitimação potenciada em todos os quadrantes do processo eleitoral - instrumental composto de atos e procedimentos, jurisdicionais ou não, destinado a assegurar o exercício dos Direitos Eleitorais.
2. No Estado Democrático de Direito, sustentado no sistema de equilíbrio de relações entre os Poderes e na efetividade do exercício dos Direitos Políticos, o Ministério Público, função essencial à prestação jurisdicional, legitimado como veículo da expressão do Poder Social do Estado, constitui-se instrumento de garantia do equilíbrio dessas relações e da participação popular no processo político e na organização e atividade do Poder Estatal, que qualificam a cidadania.