EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE: ASPECTOS TEÓRICOS E PRÁTICOS
Francisco Wildo Lacerda Dantas
Juiz Federal da 1ª Vara, em Alagoas e Prof. Assistente da UFAL
1. Introdução
O direito, como ciência cultural, sofre inegável influência das ondas que, de tempos em tempos, provocam a preocupação da alma humana e que se repetem em várias levas ou ondas, influenciando as modificações que se introduzem na ordenamento, tanto em seu arcabouço legislativo que forma o ordenamento jurídico quanto no plano doutrinário e hermenêutico, que lhe direciona o sentido das normas, como sopro atualizador, atento à mensagem do Evangelho: a letra mata, mas o espírito vivifica.
Assim também se passa com o processo de execução, que experimentou uma evolução desde o direito romano, em que se buscava a proteção do executado, embora no início se fizesse a execução contra o corpo do devedor e o direito intermédio, em que privilegiava a posição do credor, até atingir-se a uma postura mas eqüânime, por influência do cristianismo, embora ainda com prevalência do direito do credor.
Eis porque, em nosso ordenamento jurídico, se considera a execução como fase de satisfação do direito já certificado na sentença ou em título a que a lei atribua essa eficácia, reconhecendo-se que o juiz exercita uma função jurisatisfativa, mas, ao mesmo tempo, se assegura que, quando a execução puder se realizar de várias formas, ela se faça sempre pela forma menos gravosa ao devedor, como o estabelece expressamente o art. 620 do CPC, que recepcionou o resultado da evolução que humanizou esse processo.
e a dialética processual
Como defendi em obra recente, embora a defesa não constitua um instituto à parte, no fenômeno do processo, está ínsita a essa atividade. Decorre mesmo do direito de ação, visto do ângulo do réu, segundo o comprova a visão acolhida expressamente no art. 30, do novo Código de Processo Civil francês:
"L´action et le droit, pour l´auter d´une prétention d´etre entendu sur le fond de celle-ci afin que le juge la dise bine ou mal fondée. Pour l´adversaire, l´action est le droit de discuter le bien-fondé de cette preténtion".
Tanto o autor quanto o réu têm o direito de ação, isto é, o direito ou poder de exigir do Estado que lhes aprecie as alegações. O autor apresentado uma pretensão, para que o Estado diga se ela é bem ou mal-fundada. O réu, oferecendo a resistência a essa pretensão, para demonstrar que ela não se fundamenta no direito material.
Graças à influência recíproca que os institutos processuais exercem entre si - jurisdição, ação (defesa) e processo - se pode entender melhor porque o processo se apresenta sempre e indissoluvelmente com uma natureza dialética, como essência do due process of law, em que se exige a obediência de instrução contraditória, ao direito de defesa, ao duplo grau de jurisdição e à publicidade do julgamento, além de outras garantias.
Essa natureza dialética, que se caracteriza por ouvir-se os opostos não resulta, como queria Carnelutti, da existência de uma lide, pois esta noção ainda que importante, é pré-processual, e se entremostra com toda exuberância nos domínios da Sociologia, muito mais do que no do direito.
Daí porque o mestre seria obrigado a reformular a notável teoria que engendrara para modificar o conceito originário da lide - como uma pretensão resistida - para reconhecer, a fim de considerar a execução como um verdadeiro processo que, nesse caso, a lide se apresenta como uma pretensão insatisfeita.
Essa dialética, consistente na obrigatoriedade de se ouvir ambas as partes ou interessados envolvidos na relação processual, é uma conseqüência do audiatur et altera pars dos romanos, não se devendo esquecer que o próprio Carnelutti fez a distinção entre parte no sentido material e parte no sentido processual e de que identificou a prevenção da lide como fim específico do processo voluntário próprio da jurisdição voluntária.
3. O contraditório e a defesa
na execução
Escrevendo sobre a execução, Cândido Dinamarco assinalou que embora se houvesse identificado o processo, desde a decisiva contribuição de Oskar von Bülow, em 1868, como uma relação processual, a partir de meados do século passado se descobriu que coexistem no processo o procedimento e a relação processual. Mais recentemente, sobreveio o pensamento de que o processo está integrado por procedimento e contraditório, chegando a afirmar que se encontra excluída "... a pertinência da relação processual em seu conceito".
Dessa forma, acentuou que, ao contrário do que se pensa, existe no bojo mesmo do processo da execução, o contraditório. Não se pode pensar que ele é somente garantido com o exercício da defesa através da oposição de embargos - uma ação autônoma, embora conexa com a execução que visa a desconstituir o título executivo - e que, infelizmente, muitos teimam em aceitar como a única forma de defesa possível.
A partir dessas observações, se pode concluir que é perfeitamente possível e adeqüado admitir-se o exercício do direito de defesa na execução, independentemente da oposição de embargos, sobretudo quando se alega a inexistência dos pressupostos processuais exigíveis à constituição de toda relação processual ou das condições da ação também exigidos na sistemática adotada pelo atual CPC para que exista o próprio direito de acionar a jurisdição.
Entendimento contrário importaria negar-se as garantias constitucionais anteriormente referidas ou defender-se que a execução não se realiza através de um processo, pois estes sempre é essencialmente dialético.
Identificando essa contraditoriedade na instrução do processo, que não se deve confundir com a produção de prova, inexistente no procedimento mesmo da execução, Cândido Dinamarco, acentuou que essa dialética do processo se caracterizava pelo funcionamento conjugado de situações jurídico-processuais e fatos processuais, pois de um fato nasce uma situação jurídica, com fundamento na qual vem fato novo, nasce nova situação jurídica e assim até o final do procedimento. Para o autor, cada ato processual, isto é, cada anel da cadeia que é o procedimento, realiza-se no exercício de um poder ou faculdade, ou para desencargo de um ônus, o que significa que é a relação jurídica que dá razão de ser ao procedimento. Por sua vez, cada poder, faculdade, ônus, dever, só tem sentido enquanto tende a favorecer a produção de atos que possibilitarão a consecução do objetivo final.
Nesse sentido, convém mencionar-se a posição de Tucci e Cruz e Tucci de que é "... impossível um processo unilateral, agindo somente uma parte, pretendendo obter vantagem em relação ao adversário, sem que esse seja ouvido, ou, pelo menos, sem que se lhe dê oportunidade de manifestar-se".
Ora, essas conclusões, geralmente aceitas por todos, encontram dificuldade de aplicação no processo de execução onde a forma de defesa, por excelência, se realiza através dos embargos e estes, por sua vez, exigem, como pressuposto processual específico, a garantia do juízo. Esta dificuldade radica exatamente na conciliação entre a garantia ampla de defesa e do contraditório ínsitos.
4. Raízes históricas da exceção
de pré-executividade
Como se disse no início dessa abordagem, o tema tem sido da preocupação constante dos juristas e sempre retorna à ordem do dia, por trazer implicações profundas com o direito de defesa, sobretudo quando se entremostra um fortalecimento do Estado na cobrança de suas dívidas através do executivo fiscal, ainda eu se apregoe a redução de seu papel.
Quando veio a lume a nova Lei de Execução Fiscal, Milton Flaks expendeu comentários que ainda permanecem atuais, tendo observado que embora somente se admitissem os embargos à execução após estar garantido o juízo, salvo, como havia observado Celso Neves, nas hipóteses teratológicas "... em que se aprecia, de plano, sem forma nem figura de juízo, a oposição do executado ...", a jurisprudência já vinha admitindo, independentemente de prévia garantia da execução, " ... petições em que os executados (com ou sem assistência de advogado), alegam pagamento ou anulação do lançamento do qual se originou o crédito reclamado".
Sugeriu, então, que se adotasse de lege ferenda a solução que já existia em nosso ordenamento desde a época do Decreto Imperial nº 9.885, de 1888, que dispunha de forma idêntica à estabelecida no art. 16 da atual Lei de Execução Fiscal, mas acrescentava a ressalva: salvo quando:
"a) provasse, com documento hábil, o pagamento ou a anulação do débito na esfera administrativa;
b) em face de suas alegações, o próprio representante da Fazenda requeresse o arquivamento do processo (art. 10 e 31)".
O tema da exceção da pré-executividade, portanto, já fazia parte da preocupação de nosso juristas desde o Império e deita raízes no referido Decreto Imperial nº 9.885/1988.
5. A exceção da pré-executividade atual
5.1 - Aspectos teóricos
Creio ser importante, inicialmente, ressaltar, com apoio nos comentos de Calmon de Passos ao CPC, que a palavra exceção se apresenta sob vários sentidos.
Numa acepção ampla, é o próprio direito de defesa; num sentido mais estrito, significa toda defesa indireta contra o processo (também chamada defesa de rito) ou contra o mérito, havendo ainda quem a utilize para denominar tão somente a defesa indireta contra o processo, ou de defesa de rito.
O nosso CPC a adotou nesse último sentido e, assim mesmo, a ela se referiu, nos artigos 304 e seguintes, às exceções processuais ou de rito denominadas dilatórias, deixando as chamada exceções processuais peremptórias, como a coisa julgada, a litispendência e a perempção, para serem argüídas nas preliminares de mérito.
No sentido que usualmente se adota entende-se que serve para identificar a defesa que se exerce, independentemente da oposição de embargos e, pois, da prévia segurança de juízo, no corpo mesmo do processo de execução. Creio que se refere mais à defesa direta contra o processo, por envolver a indispensável alegação do desatendimento de matéria de ordem pública, conhecível de ofício pelo juiz. Entendo, também, que diz respeito à alegação das denominadas objeções , que tem a mesma natureza de matéria de ordem pública e, por isso, devem também se apreciadas de ofício pelo juiz, mas que constituem espécie de defesa indireta - e, portanto, exceção - contra o mérito.
O tema voltou a ocupar os centros das atenções dos juristas, por considerar-se que a execução é um processo que tem por objeto o patrimônio do cidadão e por vivermos uma fase em que se experimenta ente nós uma verdadeira aprendizagem de cidadania, bastando, para isso, atentarmos para o que se passa à nossa volta com o indivíduo se dando conta de que tem direitos e de que, ao contrário do que se imaginava, não é apenas um súdito a quem o soberano distribuía justiça como uma especial mercê.
Para isso, muito tem contribuído o atual texto constitucional que consagra garantia de que ninguém estará sujeito a sofrer agressões em seu patrimônio, sem o devido processo legal (Cf. art. 5º, LIV da CF/88), reconhecendo-lhe, em todos os processo, mesmo nos administrativos, o contraditório e ampla defesa (Cf. art. 5º, LV).
Nesse sentido, se tem observado que, no processo de execução, que tem início exatamente com ato de agressão ao patrimônio do devedor - isto é a penhora - o juiz deve ter atenção redobrada para desfechá-lo somente quando satisfeitos todos os requisitos exigidos por lei, incluindo aí, de forma genérica, os pressupostos processuais e as condições da ação.
Por outro lado, a defesa por excelência no processo de execução se procede através da oposição de embargos e, como já se disse, exige-se como pressuposto específico para esse exercício a prévia garantia de juízo. Isso provoca o dilema a ser resolvido: autorizar-se a agressão ao patrimônio do cidadão, antes que esse possa defender-se, sem exigir que, para o exercício da garantia constitucional sofra constrição em bens do seu patrimônio e, ao mesmo tempo, não desfigurar a execução como processo para satisfação do direito anteriormente reconhecido.
Em obra recente, Marcos Valls Feu Rosa ressaltou que o insuperável Pontes de Miranda já havia enfrentado o problema, quando chamado a oferecer parecer em respeito a uma questão surgida no processo de falência da Companhia Siderúrgica Mannesmann.
Nesse processo, formularam-se pedidos de decretação da abertura de falência da empresa e o juiz os havia indeferido ao fundamento de que se lastreavam em títulos falsos, sem que houvesse exigido penhora ou depósito. O objeto da consulta havia sido: pode a empresa, nas vinte e quatro horas que se seguem à citação para que o devedor pague ou nomeie bens á penhora e contra a qual se move a ação, alegar a falsidade de título ou de títulos, independentemente do oferecimento de bens à penhora? O parecer responderia que sim, por entender que "a alegação de inexistência, invalidade ou da ineficácia da sentença é alegável antes da expedição do mando da penhora".
Na mesma obra, o mesmo Marcos Valls Feu elencaria a opinião de vários doutrinadores da atualidade, acompanhando o mesmo entendimento. Para Galeno Lacerda, reconhece-se ao devedor, na execução, defender-se através de exceções prévias, lato sensu, que afastam a legitimidade da própria penhora, tendo em vista que esta pressupõe a executoriedade do título. Do mesmo modo, muitos outros autores se posicionaram de modo idêntico. Tentaremos uma síntese desse pensamento, para tendermos ao propósito deste artigo:
Araken de Assis reconhece que embora não se tenha previsão legal e o juiz tenha acometido algum lapso, é possível ao devedor requerer, independente de penhora e de oposição de embargos, que o juiz aprecie a alegação da inexistência dos pressupostos processuais.
Para Humberto Theodoro Júnior, como a nulidade é vício fundamental que priva o processo de toda e qualquer eficácia, sua declaração, no curso da execução, não exige forma ou procedimento especial, podendo o juiz decretá-la de ofício ou a requerimento do devedor - por simples petição (normalmente se refere: atravessando petição), sem necessidade da oposição de embargos.
Luiz Edmundo Appel Bojunga, em artigo recente na Revista de Processo, também participa da resenha de opiniões a respeito da possibilidade do oferecimento dessa defesa no processo de execução. Reconhece que " ... a alegação de nulidades, vícios pré-processuais e processuais que tornam ineficaz título executivo, judicial ou extrajudicial, devem ser suscitados através da exceção de pré-executividade, antes mesmo ou após a citação do executado", pois para ele "A penhora e o depósito já são medidas executivas e não podem ser efetivadas quando não existir ou não for eficaz o título que embasa o processo executório".
Para Nelson Néry Júnior, há de reconhecer-se ao devedor o direito de apontar irregularidade formal do título que aparelha a execução, a falta de citação, a incompetência absoluta do juízo, o impedimento do juiz e outras questões de ordem pública, sem a necessidade de prévia garantia do juízo e da oposição de embargos, como manifestação do princípio do contraditório.
Cândido Dinamarco, por sua vez, com a autoridade que lhe é própria, insiste ser preciso acabar com o mito dos embargos, que conduz o juiz a uma atitude de espera, "... postergando o conhecimento de questões que poderiam e deveriam ter sido levantadas e conhecidas liminarmente, ou talvez condicionando o seu conhecimento à oposição destes", concluindo, de forma categórica: "Dos fundamentos dos embargos, muito poucos são os que o juiz não pode conhecer de-ofício, na própria execução".
Ovídio A. Baptista da Silva assinala que, nas concepções modernas da ação executiva, vem se confirmado o entendimento - já anteriormente assinalado nesta exposição - de reconhecer-se atividade de conhecimento, não apenas com vistas à correção de eventuais imperfeições da relação processual, mas até mesmo tendente à total e definitiva eliminação do processo executivo. Desse modo, nem sempre será necessário a oposição de embargos para que o devedor impeça o desenvolvimento do processo executivo, sobretudo quando se alega matéria de ordem pública, que o juiz é obrigado a conhecer de ofício.
Advertindo que a matéria do art. 618 do CPC está expressamente cominada como nulidade, Vicente Greco Filho esclarece que o juiz pode conhecê-la de ofício, independentemente da oposição de embargos. No mesmo sentido, aliás, se posicionam, dentro da mesma resenha elaborada por Marcos Feu Rosa, Os seguintes autores: José Alonso Beltrane, José da silva Pacheco, José Antônio de Castro e Mário Aguiar Moura.
Em obra mais recente, já na 4ª edição, Araken de Assis assinala que "Embora não haja previsão legal explícita, tolerando o órgão judiciário, por lapso, a falta de algum pressuposto, é possível o executado requerer seu exame, quiçá promovendo a extinção da demanda executória, a partir do lapso de vinte e quatro horas, assinado pelo art. 652. Tal provocação de matéria passível de conhecimento de ofício pelo juiz prescinde de penhora, e, a fortiori, do oferecimento de embargos (art. 737, I)".
Finalmente, repetimos lições de Galeno Lacerda, para quem a regra do art. 737, I, do CPC, que exige a prévia segurança do juízo, não pode ser interpretada em termos absolutos, sobretudo quando se trata de título extrajudiciais - entre os quais, como é de notório conhecimento, se encontram as Certidões da Dívida Ativa (CDA) que embasam a execução fiscal - segundo tradição do direito luso-brasileiro e comparado, até porque o mesmo autor conclui, "Se o título não for exequível, não tem sentido a penhora, desaparece seu fundamento lógico jurídico".
5.2 - Aspectos práticos
O posicionamento doutrinário, com soe acontecer, tem provocado efeitos práticos que se revelam no entendimento jurisprudencial que se vem robustecendo, a revelar a aceitação de que o executado, ainda que sem segurar o juízo, como garantia exigida ao exercício em qualquer processo de execução, sobretudo na execução fiscal (Cf. art. 738 do CPC e art. 16 c/c P. Único deste mesmo art. da Lei nº 6830/80), possa provocar o exame pelo Magistrado de certas matérias consideradas de ordem pública, que o juiz é obrigado a conhecer de ofício.
Essa matéria envolve, como acima mencionado, o exercício à defesa direta contra o processo, por dizer respeito à indispensável alegação do desatendimento de matéria de ordem pública. Penso, também, que envolve a alegação das denominadas objeções que tem a mesma natureza de matéria de ordem pública e de ser apreciada de ofício pelo juiz, mas que constituem espécies de defesa indireta contra o mérito, como é o caso do pagamento.
Nesse sentido, observa-se que o STJ já decidiu que:
"Execução. A nulidade do título em que se embasa a execução pode ser argüída por simples petição, uma vez que suscetível de exame ex officio pelo juiz. O inadimplemento do contrato, a que se vincula o título, entretanto, constitui matéria que, para ser conhecida, requer seja alegada pela via dos embargos".
"Processual Civil. Agravo de Instrumento. Processo de Execução. Embargos do Devedor. Nulidade. Vício Fundamental. Argüição nos Próprios Autos da Execução. Cabimento. Artigos 267, § 3º; 585, II; 586; 618, I, do CPC.
I - Não se revestindo o título de liquidez, certeza e exigibilidade, condições basilares no processo de execução, constitui-se em nulidade, como vício fundamental, podendo a parte argüi-la, independentemente de embargos do devedor, assim como pode e cumpre ao juiz declarar, de ofício, a inexistência desses pressupostos formais contemplados na lei processual civil.
II - Recurso conhecido e provido".
Anota-se, ainda, em sede da Justiça Estadual:
"Execução. Inexistência de título líquido e certo. Extinção do processo de execução. Legalidade.
1 - Ao exercer o juízo de admissibilidade no próprio Processo de Execução, verificando o julgador a inexistência de título de crédito líquido e certo, é legítima a sua decisão de extinguir o processo, por impossibilidade jurídica do atendimento.
2 - No exercício do juízo de admissibilidade do Processo de Execução, o magistrado deve examinar os pressupostos básicos de liquidez, certeza e exigibilidade do título que instrui o pedido, não se considerando como peça de defesa a mera impugnação do devedor apontando as deficiências que descaracterizam o título para efeito de execução;
3. Apelação a que se nega provimento".
Assim também tem se posicionado o Juiz monocrático, como se observa de sentença cujo trecho se transcreve abaixo:
"Assim, com maior razão, sustento que o executado pode alegar prescrição nos próprios autos de execução. Isto é, independentemente do Juízo se encontrar garantido e da oposição de embargos. Na verdade, não é razoável que o credor ajuíze ação imprópria para receber seu crédito e, ainda assim, imponha ao devedor o ônus de oferecer garantia ao juízo para alegar tal irregularidade".
6. Conclusões
A exceção de pré-executividade constitui a defesa - e, por isso, exceção - que se exerce no processo da execução, independentemente da oposição de embargos e da prévia segurança de juízo, quando se alega que essa foi desfechada sem atender aos pressupostos específicos para a cobrança de crédito que, na redação do art. 586 do CPC, se resume à exigência de título líquido, certo e exigível.
Assim, entende-se que a exigência da prévia segurança do juízo não pode ser imposta naqueles casos em que a execução é desfechada com base em título que não se reveste das características de título executivo, porque, destarte, a própria execução estaria sendo ajuizada com abuso de direito por parte do credor, utilizando uma via processual que a lei, em tese, não lhe concede.
Considera-se, também, que não se pode exigir a segurança prévia do juízo para o reconhecimento do exercício do direito de defesa para aqueles que, sendo comprovadamente pobres, não podem prestá-la, porque isso implicaria desatender a garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa.
Não é toda matéria de defesa que pode ser alegada por essa forma. Os embargos do devedor, como ação autônoma embora conexa com a execução, continuam a ser a forma principal de defesa no processo de execução que tem como pressuposto um direito já acertado, já definido, por sentença (título judicial) ou por outro a que a lei atribua a eficácia da sentença (título extrajudicial).
Somente quando se investe diretamente contra o próprio título por não apresentar as garantias mínimas de certeza, liquidez e exigibilidade ou se invoca matéria de ordem pública, como inexistência das condições de ação ou a não satisfação dos pressupostos processuais ou, ainda, objeções, como o próprio pagamento, e, por isso, conhecível de ofício pelo juiz, se pode excepcionalmente admitir que essa defesa se faça, excepcionalmente, por simples petição, nos autos mesmo do processo, algumas vezes pelo próprio devedor e sem estar firmada por advogado.