(JSTJ e TRF - Volume 85 - Página 112)
RECURSO ESPECIAL N. 58.736 - MG (95.0000670-7)
Terceira Turma (DJ, 29.04.1996)
Relator: Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro
Recorrente: Wagner Bueno Cateb
Recorrida: Aerolineas Argentinas S/A.
Advogados: Drs. Salomão de Araújo Cateb e outros e Carlos Kenigsberg e outros
EMENTA: - LEI. TRATADO.
I - O tratado não se revoga com a edição de lei que contrarie norma nele contida. Perderá, entretanto, eficácia, quanto ao ponto em que existia antinomia, prevalecendo a norma legal.
II - Aplicação dos princípios, pertinentes à sucessão temporal das normas, previstos na Lei de Introdução ao Código Civil. A lei superveniente, de caráter geral, não afeta as disposições especiais contidas em tratado.
III - Subsistência das normas constantes da Convenção de Varsóvia, sobre transporte aéreo, ainda que disponham diversamente do contido no Código de Defesa do Consumidor.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Srs. Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por maioria, não conhecer do recurso especial, vencido o Sr. Ministro Nilson Naves que dele conhecia parcialmente e o provia nessa parte. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Costa Leite e Nilson Naves.
Custas, como de lei.
Brasília, 13 de dezembro de 1995 (data do julgamento).
Ministro WALDEMAR ZVEITER, Presidente - Ministro EDUARDO RIBEIRO, Relator.
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: - Trata-se de pleito de indenização ajuizado por Wagner Cateb contra Aerolineas Argentinas S/A., em virtude de extravio de bagagem em viagem internacional. Pedido julgado improcedente em ambos os graus.
Inconformado, o autor manifestou recursos extraordinário e especial.
Impugnando o acórdão que julgou correta a indenização tarifada, alegou que, assim decidindo, o aresto contrariou os arts. 159 do Código Civil e 1.059 da Lei n. 8.078/90 - Código de Defesa do Consumidor. Asseverou que a Convenção de Varsóvia, em que prevista essa forma de reparação, está ultrapassada, não podendo prevalecer sobre as leis nacionais internas. Invocou a Súmula n. 229 do STF que afasta a possibilidade de limitação indenizatória. Afirmou existir dissídio com julgados que arrolou.
O especial foi admitido.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO (Relator): - Sustenta o recorrente, em bem lançadas razões, que não podem ser aplicadas as disposições da Convenção de Varsóvia, limitadoras da indenização no transporte aéreo, uma vez que supervenientes a elas as constantes do Código de Defesa do Consumidor, estabelecendo regulamentação diversa. Reporta-se, especificamente, aos arts. 14, 25 e 54.
O acórdão recorrido rejeitou essa alegação, com base em que não houve denúncia do tratado e esse haverá de prevalecer quando posto em confronto com norma de direito interno.
Considero que tem razão o recorrente quando combate a doutrina sustentada na decisão impugnada, que não corresponde ao entendimento hoje mais aceito. O tratado não se revoga com a edição de lei que contrarie norma nele contida. Rege-se pelo Direito Internacional e o Brasil a seus termos continuará vinculado até que se desligue mediante os mecanismos próprios. Entretanto, perde eficácia quanto ao ponto em que exista a antinomia. Internamente prevalecerá a norma legal que lhe seja posterior.
Ocorre que, tendo em vista a sucessão temporal das normas, para saber qual a prevalente aplicam-se os princípios pertinentes que se acham consagrados na Lei de Introdução ao Código Civil. No caso, o estabelecido pela Convenção constitui Lei Especial, que não se afasta pela edição de outra, de caráter geral. As normas convivem, continuando as relações, de que cuida a especial, a serem por ela regidas. E não há dúvida alguma sobre o cunho de generalidade das regras contidas nos artigos invocados do Código de Defesa do Consumidor.
Entendo, por essa razão, que a edição daquele não afasta a aplicabilidade das disposições especiais, relativas ao transporte aéreo internacional.
Prossegue o recurso, sustentando dissídio com julgados que arrola. Neles se destaca o fato de que o desaparecimento da bagagem se teria dado em terra e que não se verificara acidente que lhe pudesse ter dado causa. Ocorre que essa circunstância não foi objeto de consideração pelo acórdão. Falta, pois, o prequestionamento.
Por fim, quanto aos danos morais, o acórdão, bem ou mal, negou a existência de nexo causal entre os que foram apontados na inicial e o desaparecimento da bagagem. A matéria restringe-se aos fatos, não podendo ser objeto de reexame no especial.
Não conheço do recurso.
EXTRATO DA MINUTA
REsp n. 58.736 - MG - (95.0000670-7) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Recorrente: Wagner Bueno Cateb. Recorrida: Aerolineas Argentinas S/A. Advogados: Drs. Salomão de Araújo Cateb e outros e Carlos Kenigsberg e outros.
Decisão: Após os votos dos Exmos. Srs. Ministros Relator, Waldemar Zveiter, Cláudio Santos e Costa Leite não conhecendo do recurso especial, solicitou vista dos autos o Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves (em 24.10.95 - 3ª Turma).
Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro WALDEMAR ZVEITER.
VOTO-VISTA
O EXMO. SR. MINISTRO NILSON NAVES: - Foram estes autos relatados pelo Sr. Ministro EDUARDO RIBEIRO, que proferiu o seguinte voto (lê). Pedi vista para examinar o tema concernente à indenização por dano moral. Na ordem desta votação, o meu é o último dos votos. Peço vênia para, divergindo da maioria, arbitrar tal indenização.
A propósito deste aspecto da causa, estatuiu o acórdão recorrido que,
"Quanto aos propalados danos morais, a "causa petendi" reside em que o autor teria sido humilhado por fiscais da Receita Federal, inclusive com a pecha de contrabandista. Não se identifica, então, nexo causal entre o extravio da bagagem e a incivilidade dos fiscais alfandegários. Neste passo, portanto, o pedido ressarcitório teve endereço errado, vez que a pertinência subjetiva da ação seria evidentemente da Receita Federal ou de seus aludidos agentes".
Não foi bem isto o que foi alegado pelo autor. Ao postular a tutela jurisdicional, o autor alegou e pediu o seguinte, no ponto pertinente:
"Faz-se também necessária a indenização pelos danos morais advindos do constrangimento sofrido pelo postulante, ao chegar de viagem, além do tempo perdido em incontáveis idas ao aeroporto e aos escritórios da Ré e mais a necessidade de ter o Autor que dispender ainda mais tempo para procurar e comprar os bens extraviados, requerendo a este Juízo que arbitre um valor que seja razoável para indenizar o Suplicante".
Pois aqui, a meu sentir, houve erro ("error in iudicando"). No pormenor, a causa de pedir não foi aquela declinada pelo acórdão. Foi outra, como se viu. E há relação de causa e efeito. Acho que não se trata de questão tipicamente de fato. Trata-se mais de questão de direito. Afasto, pois, o obstáculo da Súmula n. 7.
Em caso tal, o meu entendimento é que cabe indenização por dano moral. Já deixei registrada a minha opinião, desde quando relatei e votei o REsp n. 13.813. Negar a indenização implica ofender o art. 159 do Código Civil, dispositivo que, por sinal, serve de referência à Súmula n. 37, segundo a qual "São cumuláveis as indenizações por dano material e dano moral oriundos do mesmo fato".
Conheço em parte do recurso e, nessa parte, dou-lhe provimento para deferir a indenização pelo dano moral (teve o autor atingido o lado íntimo da sua personallidade), arbitrando-a em 100 (cem) salários mínimos. Que as custas sejam divididas, e que cada parte responda pelos honorários de seus respectivos advogados.
RATIFICAÇÃO DE VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO WALDEMAR ZVEITER (Presidente): - Srs. Ministros, já que na oportunidade todos estão fazendo ressalvas, faço minhas as ressalvas postas por ambos os Srs. Ministros que já me antecederam. Acompanho o Sr. Ministro Relator.
ADITAMENTO AO VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO EDUARDO RIBEIRO: - Peço vênia para ponderar que não discuti a tese de a indenização do dano moral escapar das limitações que resultam de Convenção de Varsóvia. Cingi-me ao contido no acórdão, que não reconheceu a existência do pressuposto fático indispensável para que se pudesse cogitar de reparação àquele título.
EXTRATO DA MINUTA
REsp n. 58.736 - MG - (95.0000670-7) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Eduardo Ribeiro. Recorrentes: Wagner Bueno Cateb. Recorrida: Aerolineas Argentinas S/A. Advogados: Drs. Salomão de Araújo Cateb e outros e Carlos Kenigsberg e outros.
Decisão: Prosseguindo no julgamento, a Turma, por maioria, não conheceu do recurso especial, vencido o Exmo. Sr. Ministro Nilson Naves que dele conhecia parcialmente e o provia nessa parte (em 13.12.95 - 3ª Turma).
Participaram do julgamento os Exmos. Srs. Ministros Waldemar Zveiter, Cláudio Santos, Costa Leite e Nilson Naves.
Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro WALDEMAR ZVEITER.