(JSTJ e TRF - Volume 83 - Página 243)
RECURSO ESPECIAL N. 73.958 - PR (95.0045044-5)
Quarta Turma (DJ, 11.03.1996)
Relator: Exmo. Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar
Recorrente: Angela Ester Langowski Govatzk
Recorrido: Ilian Zacarias Xavier Roth
Advogados: Drs. Margareth Zanardini e Egas Dirceu Muniz de Aragão e outro
EMENTA: - RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CIRURGIA ESTÉTICA. PÓS-OPERATÓRIO.
I - Reconhecido no acórdão que o médico foi negligente nos cuidados posteriores à cirurgia, que necessitava de retoques, impõe-se sua condenação ao pagamento das despesas para a realização de tais intervenções.
II - Recurso conhecido em parte e provido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, conhecer em parte do recurso e, nessa parte, dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Fontes de Alencar e Barros Monteiro. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo.
Custas, como de lei.
Brasília, 21 de novembro de 1995 (data do julgamento).
Ministro BARROS MONTEIRO, Presidente em exercício - Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, Relator.
RELATÓRIO
O EXMO. SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR: - Cuida-se de ação de indenização por dano estético e moral proposta por Angela Ester Langowski Govatzk contra Ilian Zacarias Xavier Roth, sob a alegação de que se submetera a uma cirurgia plástica estética, nos seios e abdômen, não alcançando, contudo, os resultados almejados.
A sentença julgou procedente a ação e condenou o réu ao pagamento de cinqüenta salários mínimos, a título de indenização por danos resultantes da intervenção cirúrgica; nova cirurgia estética; indenização por dano moral, no valor de 25 salários mínimos, e ao tratamento psicoterápico, a que a autora deve ser submetida.
Interposta apelação pelo vencido, a Eg. 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná deu parcial provimento ao recurso:
"RESPONSABILIDADE CIVIL. MÉDICO. CIRURGIA PLÁSTICA. RECLAMADO DANO ESTÉTICO E MORAL. ARTS. 159 E 1.545 DO CÓDIGO CIVIL.
I - Resultado almejado não-inteiramente alcançado. Retoques cirúrgicos necessários, como de certa freqüência nesse tipo de intervenção, que não foram levados a termo ante o rompimento das relações médico-paciente.
II - Ausência de comportamento culposo pela parte do profissional, ao plano do inquinado ilícito civil. Desinteligência conduzida à inexecução complementar dos serviços, com rompimento do contrato, ensejando apenas composição obrigacional para completar o ato secundário.
III - Recurso parcialmente provido" (fl. 260).
O Revisor votou vencido, em parte, mantendo a condenação relativa ao tratamento psiquiátrico.
Demandante e demandado opuseram embargos de declaração e a Eg. 4ª Câmara Cível do TJPR recebeu os embargos do réu e rejeitou os da autora em acórdão assim fundamentado, para o que nos interessa:
"Assiste razão ao primeiro embargante, Ilian Zacarias Xavier Roth, uma vez que, conforme analisa em sua petição, o aresto reconheceu que para o insucesso parcial da intervenção concorrera a própria autora quando se negou a se submeter aos retoques complementares que eram necessários em razão do ato cirúrgico e que eram recomendados por seu médico, proporcionando, assim, com essa sua conduta, o resultado que determinou o aforamento da demanda.
E é evidente que tendo havido concorrência de culpas não cabe somente a uma das partes arcar com a reparação, que deverá ser suportada por ambas, na mesma proporção, uma vez que sem a culpa exclusiva descabe cogitar-se da responsabilidade civil por inteiro, "ex vi" da norma insculpida no art. 159, parte final, do Código Civil, como leciona Sílvio Rodrigues" (fl. 291).
Contra esses dois acórdãos, ingressou a autora com recursos extraordinário e especial, este pela alínea a, alegando violação aos arts. 4º, 5º da LICC, 159, 1.545 do Código Civil, 333 e 334 do CPC. Afirma a recorrente:
"Tal acórdão viola, em absoluto, os arts. 159 e 1.545 do Código Civil, bem como os arts. 333 e 334 do Código de Processo Civil Pátrios e também os arts. 4º e 5º da Lei de Introdução ao Código Civil na medida em que:
- não determina uma satisfação completa do dano imposto pela inabilidade e também insensibilidade do esculápio em questão pois inadmitiu o pagamento tanto do dano estético quanto do moral, bem como do tratamento psicoterápico, determinando apenas e tão-somente fosse procedida nova cirurgia; em contrário do que determina o art. 159 do Código Civil;
- desconheceu as regras processuais segundo as quais o ônus da prova cabe ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor e, quanto à não necessidade de prova quanto a fatos confessados pela parte contrária (arts. 333 e 334, II do CPC), negando-se vigência a tal estatuto processual.
Se em audiência o médico recorrido afirmou ele próprio estar satisfeito com o resultado, sem produção de qualquer outra prova, disso impende que ele negou-se a fazer os retoques necessários e que o rompimento das relações médico-paciente foi ocasionado por ele sendo assim contraditório aos próprios argumentos do recorrido, o acórdão.
Ademais disso, o laudo é claro ao afirmar que mesmo com os retoques não se poderia chegar a um bom resultado final.
Apesar disso, o acórdão presenteou o médico, cujo valor de indenização já era pequeno, com um provimento parcial de seu recurso, baseada tal conclusão no próprio laudo apresentado, e (depois complementado para tentar ajudar o colega) e nas fotos apresentadas" (fls. 298/299).
Nas contra-razões, o réu alegou, no tocante à decisão majoritária, o trânsito em julgado da sentença e, quanto ao mais, que a recorrente objetiva unicamente o reexame da prova, vedado pela Súmula n. 7/STJ.
Com as contra-razões, o Tribunal de origem indeferiu o recurso extraordinário e admitiu o especial, subindo os autos a este Eg. STJ.
É o relatório.
VOTO
O EXMO. SR. MINISTRO RUY ROSADO DE AGUIAR (Relator): - O v. acórdão examinou a prova dos autos e concluiu categoricamente pela inexistência de prova da culpa do médico na realização da cirurgia plástica. Reconheceu que a técnica operatória foi obedecida, excluiu a relação causal com o dano psíquico, e admitiu que houve melhora na aparência da paciente. Ainda que se possa ter dúvida sobre as conclusões a que chegaram os dignos julgadores da apelação, especialmente na avaliação da culpabilidade, da relação causal e das conseqüências da intervenção cirúrgica, não se pode visualizar aí ofensa à regra sobre a prova, a não ser eventual equívoco na sua apreciação, matéria que está excluída do âmbito do recurso especial.
O ponto relativo ao dano psíquico foi julgado na apelação por maioria de votos, não tendo sido opostos embargos infringentes.
Porém, tenho que a recorrente tem razão quanto ao reconhecimento da culpa do médico pela existência de seqüelas que exigem intervenção cirúrgica para retoques.
Ao referir-se ao pós-operatório, o v. acórdão admitiu: "desdobrou-se um tratamento pouco elevado pelo laudo de quem se dedica ao nobre mister (quase um sacerdócio), prevalecendo a indiferença, insensibilidade para os anseios que eram naturais no tipo de padecimento, além de uma incompreendida e mal orientada relação com a paciente; provavelmente, com mais tolerância e paciência, as coisas caminhariam por uma trilha de menos confronto e maior entendimento" (fl. 268).
Houve, assim, por parte do médico, descumprimento de dever profissional, cujo comportamento negligente impediu, conforme reconhecido, a continuidade do tratamento. Não seria razoável exigir da paciente, que sofreu as conseqüências mostradas de forma indesmentível nas fotografias, submeter-se à continuidade do tratamento pelo médico que se comportava do modo descrito no acórdão, no trecho acima reproduzido.
Assim, tenho que o v. acórdão causou ofensa ao disposto no art. 1.545 do Código Civil, pois reconheceu a negligência do médico no cuidado pós-operatório, mas não lhe atribuiu a obrigação de pagar as intervenções necessárias para o retoque da cirurgia estética, o que teria sido feito, não fora seu comportamento inadequado.
Posto isso, conheço em parte do recurso, pela alínea a, e nessa parte lhe dou provimento, para restabelecer a decisão proferida no acórdão que julgou a apelação.
É o voto.
EXTRATO DA MINUTA
REsp n. 73.958 - PR - (95.0045044-5) - Relator: Exmo. Sr. Ministro Ruy Rosado de Aguiar. Recorrente: Angela Ester Langowski Govatzk. Recorrido: Ilian Zacarias Xavier Roth. Advogados: Drs. Margareth Zanardini e Egas Dirceu Muniz de Aragão e outro.
Decisão: A Turma, por unanimidade, conheceu em parte do recurso e, nessa parte, deu-lhe provimento, nos termos do voto do Exmo. Sr. Ministro Relator (em 21.11.95 - 4ª Turma).
Votaram com o Relator os Exmos. Srs. Ministros Fontes de Alencar e Barros Monteiro.
Ausente, justificadamente, o Exmo. Sr. Ministro Sálvio de Figueiredo Teixeira.
Presidiu o julgamento o Exmo. Sr. Ministro BARROS MONTEIRO (em exercício).