O AXÉ
Está claro que a finalidade principal de um "Terreiro" é o Culto aos Orixás, porém, uma atividade paralela e de igual importância se desenvolve, sendo, até mesmo, uma conseqüência do Culto aos Orixás: a manipulação de axé. Esse "axé" é o conteúdo mais precioso do Terreiro. Ele é a força que assegura a existência, que possibilita o acontecer e o porvir. Tudo está (ou deve estar) impregnado de axé.
Podemos classificar o axé como uma forma de energia e, como toda energia, ele é acumulável e transmissível. É acumulável em determinados materiais, os quais transmitirão a algo ou alguém essa energia acumulada. Todos os objetos "sagrados", seres e lugares têm a sua carga de axé, a qual é aumentada pela manipulação dos "acumuladores", pelos objetos impregnados de axé.
Em um Terreiro, todos os seus objetos e participantes devem receber axé e acumulá-lo, mantê-lo e aumentá-lo.
O axé como forma de energia que é, pode diminuir ou aumentar. Ele diminui pelo uso constante das energias vitais do ser ou pela transmissão do objeto acumulador ao indivíduo. Aumenta em função da manipulação de objetos ou seres portadores em favor de outro. Comparemos a manipulação de axé à manipulação de uma bateria de automóvel: quando é adquirida, ela está "cheia" de energia e, com o uso constante, deve ir à recarga para acumular energia para repor a que foi gasta.
A quantidade de axé varia de acordo com o elemento que o veicula. Cada elemento é portador de uma "carga", de uma quantidade de energia, de um poder que permite determinadas manipulações. O axé é contido em elementos dos três reinos: Animal, Vegetal e Mineral. Está contido nas substâncias essenciais da cada um dos seres, animados ou não, que compõem o mundo.
Esses "portadores" de axé podem ser agrupados em três categorias:
- "sangue" branco
- "sangue" vermelho
- "sangue" preto
NOTA: o termo "sangue" é proveniente do fato de considerarmos o sangue como o principal portador de axé, dada a sua importância para a vida, humana ou animal. Todas as substâncias essenciais são consideradas "sangue".
Cada um desses "sangues" tem representações em cada reino da Natureza. A partir de agora, vamos nos referir ao "sangue" como AXÉ.
Antes de entrarmos na descrição desses "axé", vejamos como é o sistema de cores dentro do culto dos Orixás:
Originalmente os Yorubá, que nos legaram a Religião dos Orixás, possuíam um sistema de cores baseado em somente três cores básicas: BRANCO, VERMELHO e PRETO.
· o BRANCO, por ser uma cor única, é somente branco;
· o VERMELHO, deriva-se em todos os matizes do vermelho, o coral, o laranja, o amarelo (em todos os seus matizes) e o marrom. Então, todo material cuja cor lembre o vermelho, será considerado do Axé vermelho.
· o PRETO, além da cor negra em si, compõe-se de todos os matizes de cinza, de azul e de verde.
Além das suas cores características, o AXÉ subdivide-se, ainda, em outros três grupos:
· ANIMAL
· VEGETAL
· MINERAL
Vejamos agora o AXÉ, com todos os seus componentes.
1. AXÉ BRANCO
1.1. Axé branco animal
O axé branco animal compreende:
· O hálito
· Os ossos (inteiros ou reduzidos a pó), dentes, marfim
· O plasma branco de certos moluscos (igbin)
· O leite e outras secreções brancas animais (sêmen, saliva etc.)
· Pérolas e outras concreções que se formam no organismo de certos animais
· Corais brancos
1.2. Axé branco vegetal
O axé branco vegetal compreende:
· Pós brancos de origem vegetal (serragens, moagem de sementes, amido de arroz, amido de milho etc.
· Sumo branco de folhas, frutos e sementes
· Seivas e resinas brancas (borracha, látex etc.)
· "Leite" de certas plantas
· grãos brancos de todas as espécies (arroz, feijão, milho etc.)
· tubérculos e frutos brancos (nabo)
· álcool e outras bebidas brancas
· a "manteiga" vegetal
1.3. Axé branco mineral
· Todos os metais brancos (prata, platina, chumbo, alumínio etc.)
· Todos os minerais brancos, em pedra ou em pó (calcário, talco, gesso, mármore, argilas brancas etc.)
· Sais minerais
2. AXÉ VERMELHO
2.1. Axé vermelho animal
· Sangue
· Corrimento menstrual
2.2. Axé vermelho vegetal
· Azeite-de-dendê (epo pupa, em Yorubá)
· Ousa (pó vermelho vegetal)
· Mel (considerado o "sangue" das flores)
· Seivas e resinas vermelhas (Sangue-de-drago,
2.2. Axé vermelho mineral
· Metais vermelhos e amarelos (cobre, ouro, bronze, latão etc.)
· Todos os minerais vermelhos, em pedra ou em pó (argila etc.)
3. AXÉ PRETO
3.1. Axé preto animal
· Cinzas de animais
3.2. Axé preto vegetal
· Sumo de certas plantas
· Pós de cascas e madeiras pretas
· Sementes pretas
· Seivas e resinas pretas
· Carvão vegetal
3.3. Axé preto mineral
· Metais pretos (ferro, estanho etc.)
· Carvão mineral
· Pós minerais pretos
Todos os atos religiosos de um Terreiro visam a transmissão ou revitalização de axé, de objeto para objeto, de objeto para ser, de ser para ser. A combinação correta de elementos portadores de axé deverá prover a necessidade do mesmo por parte de cada indivíduo ou objeto.
Podemos utilizar determinados materiais como "acumuladores" de axé. Esses "acumuladores" nos suprirão quando necessitarmos. Esses materiais incluem os "assentamentos" ou "ojubó", as "guias" ou "contas" dos Orixás e Entidades Espirituais, os objetos sagrados do Terreiro (Adja, Obé, Obé Fari etc.). Os "patuás", talismãs e amuletos também são acumuladores de axé.
Os "assentamentos" ou "ojubó" compõem-se de materiais que acumulam o axé de determinado Orixá ou Entidade Espiritual. É através da oferenda e da manipulação de materiais portadores de axé que recarregamos o "assentamento", de tempos em tempos, cobrindo assim o desgaste contínuo. Essa é uma das razões porque fazemos o "osé", a limpeza semanal dos ojubó. É interessante notar que a qualidade (tipo) de axé varia de material para material.
As "guias" ou "contas", além de representarem a subordinação dos omorixás aos seus Orixás, servem também como portadoras de axé, necessitando ser recarregadas com maior freqüência do que os "assentamentos". Isso se deve ao fato de muitos omorixás utilizarem suas guias constantemente, quando na verdade deveriam permanecer junto ao seu ojubó, dali saindo somente para serem utilizadas nas cerimônias do Terreiro.
Os patuás, talismãs e amuletos são diminutos "assentamentos" que se destinam ao uso individual do omorixá. São objetos de complicada confecção e em nada parecidos com alguns que são vendidos nas casas de artigos de Umbanda e Candomblé.
Os objetos sagrados do Terreiro são, como dito acima, o adja (a sineta ritualística), o obé (a faca sacrificial), o obé fari (a navalha ritualística). Além desses, temos as chamadas "ferramentas" dos Orixás, tais como: Xaxará, Ibíri, Abebé, Iruquere, Ofá e outros. As ferramentas dos Orixás fazem parte dos seus ojubó.
Receber axé significa adquirir os elementos simbólicos que representam os princípios vitais e essenciais de tudo que existe, ou seja, a energia contida neles. Em suma, a manipulação de axé possibilita o reequilíbrio das energias positiva e negativa. Como todos sabemos, todas as coisas são compostas de energia positiva e negativa. O acúmulo de energia negativa provocará no indivíduo vários sintomas e doenças, os quais serão sanados com a aquisição de axé ou, podemos chamá-lo assim, energia positiva.
É preciso esclarecer que não basta somente agrupar vários materiais contenedores de axé. É preciso que esse grupo de materiais seja harmônico e combinante, pois a qualidade do axé varia conforme o Orixá. Dessa forma, se vamos, por exemplo, manipular o axé de Ogun, não podemos incluir entre os materiais algo que veicule o axé de outro Orixá. Caso isso aconteça, vários efeitos podem ocorrer, desde a ineficiência da manipulação do axé (anulação) até o choque de energias (axé), com efeitos negativos para quem estiver manipulando.
Então, devemos partir da máxima: cada coisa com seu semelhante. Porém, como toda regra tem exceção, em caso de necessidade extrema, podemos nos utilizar do axé característico de Obatalá (Oxalá) para socorrermos alguém. Também o podemos utilizar quando não sabemos quem é o Eledá (Orixá pessoal) da pessoa para quem vamos manipular axé.