Continuação da Parte
V - A Pós-modernidade
Capítulo
8
A Pós-modernidade, da Televisão ao "Tribalismo"
Uma grande quantidade de estudos científicos atuais, infelizmente
de pouca repercussão, colaboram com o que foi dito no capítulo
anterior. Neste capítulo apenas serão transcritos alguns
ítens, ainda não mencionados, que sintetizam os pontos essenciais
da transformação operada pela "imagem".
A) O Desânimo,
o Cansaço e a Perda da Memória
Segundo o Dr. Marcel Rufo, professor de Psiquiatria Infantil
da Universidade de Marseille e chefe do Inter-Setor I de Psiquiatria Infantil
de Bouches-du-Rhone:
"Há um paralelismo inexorável entre o tempo passado a
ver televisão e a queda do rendimento escolar, o declínio
da capacidade de atenção, da concentração intelectual.
Isto é verificável em todos os segmentos de idade e em todos
os meios, promiscuamente.
O fracasso escolar, a falta de concentração, as dificuldades
de memorização, a agitação das crianças
estão diretamente proporcionadas ao tempo que elas passam diante
do vídeo. É bem evidente que disto resulta um déficit
de sono, com múltiplas reações em cadeia ... além
de se tornarem agitadíssimas na escola e padecerem de insônia".
Outro estudo reitera que:
"O superconsumo de televisão ... é certamente nocivo.
A superinformação excedendo a capacidade de compreensão
da criança é motivo de cansaço e desânimo. A
identificação múltipla com heróis variados
pode ser fonte de perturbação. A eterna procura de uma vida
excitante e sensacional conduz ao risco de perder o contato com a realidade
cotidiana."
B)
Guerreiro Medieval ou Neo-Bárbaro Pós-moderno?
Demonstrando bem a diferença entre a literatura antiga
e a nova, comenta a Revista Catolicismo, em um artigo intitulado "O Maravilhoso,
O Real e o Horrendo na Literatura Infantil":
"As histórias, todos o sabem, são os primeiros contatos
das crianças com a vida. Através delas, a inteligência
infantil transpõe os limites do ambiente doméstico, e apreende
as noções iniciais sobre a sociedade humana, com as inúmeras
diferenciações que comporta, as atrações que
oferece, os deveres que impõe, as decepções que traz,
e o jogo complicado das paixões nos altos e baixos desta grande
luta que é a existência, ... em que uns lutam por seus interesses
pessoais, legítimos e ilegítimos, e outros lutam contra o
mundo, contra o demônio, contra a carne, para a maior glória
de Deus. As primeiras noções sobre esta ‘milícia’,
as impressões mais fundas que o homem recebe relativamente aos aspectos
essenciais dessa luta e à sua posição perante ela,
recebe-as nos seus primeiros anos.
Daí haver importância essencial, para uma civilização
católica, em proporcionar às crianças uma literatura
profunda e sadiamente religiosa. Não falamos apenas do curso do
catecismo e História Sagrada, que deve ser o centro de tudo, mas
de histórias que fossem como que o comentário, o prolongamento,
a aplicação do que a religião ensina.
[tais histórias evocavam no passado, por vezes,] o maravilhoso,
indispensável nos horizontes infantis como meio de apurar o senso
artístico, elevar o espírito, abrir o descortínio,
estimular sadiamente a imaginação.
[outras, como as aventuras de Juca e Chico], esmeravam-se em representar
a vida quotidiana, com seus aspectos calmos, caseiros, simpáticos,
elemento essencial nos horizontes da literatura infantil, para despertar
a atração, o interesse pela realidade e pela virtude."
Essa literatura colocava, portanto, a criança diante
de problemas universais, bem como de tipos humanos e situações
que, pelo enredo, o mais das vezes se resolviam em recompensa para o bem
e em punição para o mal.
Atualmente, dificilmente se encontram tais histórias
nas cenas de televisão, são quase tão somente filmes
e desenhos animados malfazejos, que apresentam cenas de "murros, tiros,
assaltos, agressões, vibração exagerada, narração
melodramática, corre-corre, sangue, morte, ‘super-homens’ que voam,
que transpõem muralhas, que manipulam raios. É toda uma sinistra
e ridícula contextura de inverosimilhanças, de crueldade,
de grosseiros artifícios de sensacionalismo".
Ou então, como diz o Prof. Pfromm Neto,
"uma dieta ... onde predominam o grotesco, as guerras interplanetárias,
os robôs, andróides e ‘transformers’, os super-herois - personagens
de uma ficção científica mais ou menos imbecil, cujas
fórmulas pertencem mais ao reino do pensamento mágico e da
superstição do que ao da ciência e da tecnologia, quando
não projetam uma imagem totalmente distorcida e daninha destas últimas".
Continua o citado artigo da revista Catolicismo:
"Que horizontes assim se abrem para a infância? Os do crime.
Que prazeres? Os da excitação nervosa tendente em certos
casos quase ao delírio. Que ideais? Os da força bruta, e
da vida de aventura sem eira nem beira. Com isso não se forma um
homem, e muito menos um cristão. O produto próprio dessa
literatura é o neo-bárbaro."
Esse artigo que acaba de ser transcrito sintetiza bem a metamorfose
operada na literatura mundial.
Em um artigo do Correio Braziliense de 6/9/94, intitulado ‘EUA
Debate de Novo Violência na Televisão’, o colunista assim
se exprime:
"No espaço de apenas uma semana, uma sucessão de fatos
chocantes - dois deles em Chicago, uma das maiores cidades do país
- atrai de novo a atenção dos EUA para a violência
envolvendo crianças - em especial gangues juvenis.
Primeiro foi a caçada policial a Robert Sandifer, de 11 anos,
que num tiroteio de gangues matou uma garota de 14.
Ainda em Chicago, após investigar um ano, as autoridades concluíram
que o assassino de uma mulher de 84 anos que tivera a garganta cortada
com faca de cozinha, em seguida a brutal espancamento, fora o vizinho dela
‘Frog’, então com 10 anos, que ainda desviara a polícia para
outro suspeito, supostamente visto por ele no local.
Em seguida, ocorreu (em) uma pequena cidade de Nova Jersey, o assassinato
de (um) menino de 11 anos por outro de 14.
São três entre muitas histórias semelhantes. Todos
se perguntam até que ponto a violência dos meios de comunicação,
em especial as imagens da televisão e no cinema, vêm influindo
negativamente no comportamento dessas crianças."
Nesse sentido, escreve o Dr. Michael M. Miller, professor de
Psiquiatria na Howard School of Medicine e ex-diretor de pesquisa do Instituto
Psiquiátrico da Columbia University, em sua obra ‘A Saúde
Mental das Crianças’:
"Se o sadismo é apresentado como heróico, e a crueldade,
a rudeza e a falta de compaixão perpetradas por esses heróis
são tratadas como ideais, para muitos jovens, isso se torna um modo
de reação aceitável."
Comenta o Prof. Franz-Dietrich Poelert, citando a psicóloga
alemã Sabine Joerg, a respeito da diversão eletrônica.
"Essa diversão apodera-se das sensações infantis.
Deforma-as e as faz definhar ... Imagens confusas de horror e de felicidade
ocupam a mente da criança e permanecem obstinadamente coladas como
se fossem experiências vividas por ela mesma. ... A comunicação
com o mundo fica obstruída, os órgãos dos sentidos
fornecem informações fragmentadas."
Viciadas nos prazeres fáceis de uma imaginação
solta e de soluções mágicas para os problemas, as
crianças teledependentes perdem qualquer interesse pelo esforço
intelectual. Com razão comenta a psicóloga francesa Marie-Josée
Chombart de Lauwe, a respeito do escolar assíduo à TV:
"Sua inteligência é cada vez menos solicitada. O sucesso
escolar não lhe interessa mais, uma vez que o herói possui
a capacidade de solucionar as situações difíceis..."
C.
Efeitos Semi-Hipnóticos da TV Assemelham-se aos da Droga
Comenta o criterioso estudo da já citada associação
"O Amanhã de Nossos Filhos": "Mary Winn, nos estudos que fez dos
efeitos da televisão sobre a infância, sustenta que a TV provoca
reações próximas aos efeitos da droga. Sob o efeito
direto da televisão, nota-se um estado de passividade quase nirvânica
do ‘paciente’, semelhante ao hipnotismo.
"Cessado este, quando o paciente acorda para a realidade, as
reações são de frustração e amargura,
que podem chegar a explosões temperamentais até mesmo convulsivas".
Em um artigo da revista "Rainha" sobre os estudos de Mary Winn,
lemos:
"alguns pais - adverte Mary - colocam os filhos diante da televisão
para acalmá-los. Contudo, as manifestações de nervosismo...
- gritos estridentes, pulos nos estofados, desobediência às
ordens dos pais na hora de comer, dormir ou estar quietos etc. - quando
a televisão, por algum motivo é desligada, prova que o estado
de descontração que se supunha na criança é
puramente fictício ... Analisando as razões dessa irritabilidade
- por vezes incontrolável - diz Mary que ela é, muito possivelmente,
o efeito da transição de um estado de inconsciência
para outro de consciência, como a passagem do estado de sono para
o de desperto. Mary também compara a experiência da televisão
à experiência da droga, que leva o seu usuário a uma
‘viagem’, no fim da qual, ao tocar os pés o mundo da realidade,
se torna irritadiço e insuportável. E conclui: "A impressão
que logo se tem, quando a criança se afasta subitamente do seu pólo
de atração (televisão), reforça a idéia
que seu estado mental é de natureza hipnótica".
O Estado de São Paulo, em entrevista com um ‘agitador
cultural dos anos 70’, Timothy Leary (ex-professor de psicologia em Harvard,
expulso por uso de LSD), cujo título do artigo é sugestivo:
Leary Troca LSD por Alucinação Eletrônica, comenta
o seguinte:
"Leary continua pregando a alucinação, só que
agora eletrônica. Entrou na realidade virtual, na criação
de mundos por meio de computadores carregados de software interativo e
ligados a fones de ouvido estério e telas de video-goggles - óculos
especiais que contêm minúsculas telas de vídeo criadoras
da ilusão de um ambiente em três dimensões...".
D) A Geração
X
Em entrevista ao mesmo jornal, Leary afirma:
"Nosso trunfo [da geração X - geração educada
pela imagem], porém, não é a inteligência de
armazenar [memória], mas a de processar. (...) O movimento
das drogas psicodélicas dos anos 60 e o movimento dos computadores
pessoais, dos anos 80 são reflexos internos e externos de cada um
de nós. Simplesmente não se pode entender drogas psicodélicas
a não ser que se entenda alguma coisa sobre computadores."
Ainda segundo o Estado de S. Paulo, comentando a chamada "Geração
X":
"Cada geração tem sua própria arte, seu próprio
meio para expressar seu fascínio pela publicidade, pelo sexo, pelo
significado da vida. Há 15 anos, era lama; há 25 anos, eram
bandas de rock; há 35 anos, eram poetas guerrilheiros em bares beatniks.
Hoje, cibercultura. Eles circulam em ambientes de arte abstrata a extremos.
(...) Cada um vivendo sua fantasia".
Na mesma edição, mas em outro artigo, comenta
a articulista Sônia Nolasco:
"Eles têm 20 e poucos anos, os ‘twentysomethings’. Os mais velhos
os vêem como um bando de Bart Simpsons, mal educados, ignorantes,
que não sabem onde fica o Vietnã. Passam horas assistindo
MTV, único entretenimento a que eles dedicam mais do que três
minutos, o tempo de um vídeo clipe. Não votam e não
querem saber de política. Mas entendem de computador e cibernética
como se fossem gênios. Manejam videogames e vídeos de realidade
virtual sem precisar maiores explicações. Essa é a
juventude que vai chegar ao século 21. Os que herdarão a
Terra. (...)
Esta é a primeira geração que cresceu junto com
o desenvolvimento dos computadores. Para os Slackers [o mesmo que geração-x],
a tecnologia transformou o mundo numa aldeia global.
Esses adolescentes são maníacos por mídia. A geração
X foi criada na sociedade mais supercomunicada do mundo".
Capítulo
9
A Informática e a Morte do Sujeito
Mas, perguntariam alguns, como é possível uma vinculação
entre um mundo altamente técnico e computadorizado e o ideal auto-gestionário
ou alternativo? Parece estranho, à primeira vista, imaginar um anarquista,
nudista, etc, usando computadores e máquinas altamente desenvolvidas.
De fato, é aparentemente paradoxal o "tribalismo" pós-moderno
de um lado, e a informática na civilização da imagem
de outro. Entretanto há um nexo lógico e coerente nos fenômenos
que caracterizam a Pós-modernidade.
A Pós-modernidade tende à "morte do sujeito",
à ausência do subjetivismo próprio da existência
de individualidades desiguais. Quanto mais técnico o mundo, mais
igual e padronizada seria sua produção e, em último
caso, o próprio indivíduo. O sujeito faz parte de uma máquina
chamada comunidade, é uma parte anônima e igual a todas as
outras, uma parte do "Pan". Há, como efeito, um desaparecimento
da personalidade individual submersa no anonimato igualitário da
massa, onde a parte e o todo são iguais.
Um exemplo, que esclarecerá o que foi dito acima: certos
"fast-foods" proliferam no mundo inteiro. Além de se basear na pressa
(imediatismo) da sociedade atual, esses "fast-foods" acabam com a diversidade
orgânica das muitas nações. Em outras palavras, um
"Mac-Donalds" é exatamente igual aqui no Brasil ou na Coréia,
em Marrocos ou na Dinamarca. É uma comida "computadorizada", sem
o "subjetivismo" de cada país, região, cidade ou mesmo família.
Esse exemplo, aplicado à comida, pode ser aplicado a
todos os ramos do existir humano, vestuário, modas, músicas,
línguas, etc... Destruindo-se as diferenças entre as famílias,
regiões, nações, etc, consolida-se a igualdade Pós-moderna,
a "aldeia global", a "república universal". Não é
preciso lembrar que o computador já é usado como o veículo
natural para as comunicações internacionais.
A esse respeito, escreve o Correio Braziliense:
"A Internet está explodindo as fronteiras entre os países.
E nivelando todas as legislações pelo ponto mais "liberal"
do planeta. A Net está presente hoje em mais de cem países
e, como conseqüência, fica quase impossível para um governo
controlar o cumprimento das legislações que restringem o
jogo ou qualquer outra atividade...".
O computador, na maioria das vezes, acaba servindo como uma
janela aberta para um mundo irreal, ilusório, onde todos os desejos
ou emoções do homem podem ser satisfeitos, sem barreiras
físicas ou naturais. Com um simples toque no teclado tudo se transforma,
o fraco se torna herói... Tudo é uma imagem manipulada pelas
mãos do digitador, que submerso em distantes sonhos de uma ilimitada
liberdade (liberdade da sua própria contigência ou da realidade)
e de uma indefinida igualdade, torna-se próximo da aniquilação.
O indivíduo do terceiro milênio se tornaria "livre",
mas exatamente igual a todos os demais, ou seja, escraviza-se a uma consciência
comunitária (padronizada) e liberta-se de sua consciência
individual - que o diferenciava. Aliás, essa é a função
do "nirvana" e da "meditação" que apregoam os gnósticos.
A Pós-modernidade tende a parecer uma exacerbação
do indivíduo, mas, na verdade, é a morte do sujeito individual.
Basta comparar a narração histórica medieval e teológica,
com a que é feita hoje. A Bíblia - assim como a história
da vida de santos -, revela indivíduos que fizeram a história,
já a narrativa atual, considera a História como fruto de
um processo coletivo e jamais individual. O indivíduo não
pode ser um agente de mudanças, não é ele quem faz
a história, tudo é em função da coletividade,
da comunidade.
A subjetividade, fruto das personalidades desiguais de cada
um, é destruída pelo mito do igualitarismo. A personalidade
humana, baseada na individualidade, na inteligência individual e
particular, e não na inconsciência sensitiva ou instintiva
do "id" de Freud, é substituída, dando-se, assim, a "morte
do sujeito".
A Comunidade Pós-moderna nada mais é do que a
visão panteísta e monista do universo, onde o sujeito pertence,
como uma peça "igual" e "livre", a uma energia "primeira" e única,
sem fronteiras ou divisões, onde ‘um’ é ‘todos’ e ‘todos’
são ‘um’. Não se pode pensar individualmente, todos devem
pensar como uma coletividade, no sentido literal da expressão.
A padronização matemática da informática,
aliada a todos os demais elementos da civilização da imagem,
colabora para ‘fabricar’ um homem sem a supremacia da razão sobre
a sensibilidade, sem a perfeita noção entre o real e o virtual
e sem as diversidades naturais decorrentes das diferentes personalidades
do ser humano.
Difunda-se que tudo é uma ilusão, que todos os
ideais são falsos, que a salvação eterna depende de
cada um através da iluminação, do auto-conhecimento
de suas potencialidades, difunda-se que a matéria é pura
energia em evolução, uma energia divina, que os vegetais
e os animais também têm a mesma partícula divina que
o homem tem, que todos somos perfeitos e podemos decidir o que fazer, etc.
Difunda-se isso em uma sociedade em um momento de caos econômico,
político, social e axiológico, somem-se a isso boatos de
fome, de miséria e o efeito será, muito provavelmente, a
destruição do Estado e a implantação de comunidades
alternativas ou gnósticas: a Pós-modernidade tribalista e
auto-gestionária.
Capítulo
10
Tribalismo Auto-Gestionário:
A Revolução "Comuno-Indigenista"
no Ideal Pós-moderno de Vida em Comum
A finalidade última do Comunismo, já diziam seus organizadores,
era a auto- gestão, onde o indivíduo, "igual" e "livre",
pudesse viver sem a opressão ínsita à existência
de desigualdades. O movimento prototípico dessa percepção
de sociedade é, sem sombra de dúvida, a marcha contestatária
da Sorbonne, que contraditoriamente preceituava que "é proibido
proibir".
Para os Pós-modernos mais radicais, a sociedade deve
basear-se em uma completa rejeição das normas tradicionais.
Não apenas no que diz respeito à propriedade dos bens, mas
também em relação à liberdade sexual, o que
abrangeria a ausência de fidelidade conjugal ou mesmo a livre "opção
sexual". Não basta que tudo pertença a todos, é preciso
que todos sejam de todos, pois, na "lógica" revolucionária,
a família é uma reminiscência do Direito de Propriedade
e da dominação autoritária e desigual, onde o filho
obedece ao pai (que transmite os valores tradicionalmente opressores).
Em relação à família, já
não era outra a posição do Comunismo:
"Abolição da família! Até os mais radicais
ficam indignados ante essa proposta infame dos comunistas. (...) Acusai-nos
de querer acabar com a exploração de crianças por
seus próprios pais? Confessamos esse crime.
Mas, direis, destruímos a mais sublime das relações
ao substituir a educação doméstica pela educação
social. (...)
Os comunistas não inventaram a intervenção da
sociedade na educação; procuraram apenas transformar o tipo
dessa intervenção, arrancando-a à influência
da classe dominante."
Vários exemplos dessa nova maneira de organizar a sociedade
podem ser percebidos em grupos alternativos já existentes, em comunidades
de pessoas que se uniram e tentaram por em prática essa ampla "liberdade,
igualdade e fraternidade". Poderíamos dizer que isso tem por causa,
ainda que implícita, a suposta necessidade de libertar o "id" do
"superego", ou de libertar a divindade imanente aprisionada pela consciência
transcendente do ser humano.
O próprio imediatismo do homem da Pós-modernidade
faz que ele não queira assumir compromissos como o casamento e a
fidelidade conjugal, pois isso o impediria de viver com quem ele queira
e tão somente enquanto ele quiser, sem normas e leis, éticas
ou morais, que inibam o seu grau de liberdade, igualdade ou fraternidade.
Pode-se dizer que enquanto a revolução francesa
enfatizava a liberdade e a revolução comunista a igualdade,
a revolução pós-moderna confere ênfase à
fraternidade, que é entendida como um misto de liberdade moral e
igualdade social.
Todavia, como conferir uma liberdade ampla ao homem? Como impedir
que a própria existência de um Estado cerceie a liberdade?
O caminho, já o imaginavam os anarquistas e os comunistas, era a
autodestruição do Estado-nação.
Mais precisamente do que a auto-gestão, o caminho para
a consolidação da trilogia revolucionária é
a tribo auto-gestionária. Com efeito, não é esse senão
o pensamento já presente em Rousseau quando defende o "Estado de
Natureza" e quando afirma que a origem da desigualdade se deve ao direito
de propriedade .
No livro "O V Centenário Face ao Século XXI -
Cristandade Autêntica ou Revolução Comuno-Tribalista",
coordenado pelo argentino Alejandro Ezcurra Naón, encontram-se diversos
documentos que demonstram a tendência atual rumo ao tribalismo auto-gestionário,
dentre eles, destaca-se - tanto pela sua coerência, como pela sua
clareza - o seguinte:
"A metamorfose do Comunismo contemporâneo - que inclui o auto-desmantelamento
dos Estados comunistas - destina-se a dar lugar a formas mais radicais,
pré-anárquicas, de coletivismo: a passagem do Estado comunista
para o Comunismo de Estado, o chamado Socialismo autogestionário.
Este, por sua vez, se inspira na tribo primitiva, no ‘bon sauvage’, de
Rousseau, ou no ‘admirável iroquês’, de Engels."
Eis o oposto da teoria do evolucionismo de Darwin! Ao invés
da evolução, temos a entropia... Ao invés de um progresso
indefinido, existe a possibilidade de uma involução.
Essa tendência ao tribalismo é tão forte,
atualmente, que não é difícil encontrar declarações
como essa:
"Estes povos indígenas são os verdadeiros evangelizadores
do mundo. Nós, os missionários, não vamos a eles como
quem leva uma doutrina ou uma evangelização que Cristo já
nos trouxe e confiou (...). Mas vamos a eles sabendo que o Cristo já
nos antecedeu no meio deles, e que lá estão as ‘sementes
do verbo’. Temos a convicção de que eles vivem o Evangelho
da Boa-Aventurança. E de que, por isso, se impõe a nós
uma conversão às suas culturas".
Percebe-se que há um abismo de diferenças entre
a evangelização realizada por Portugal e Espanha, junto ao
continente americano, e a atual neomissiologia (pós-moderna).
Mais ainda, como explicar que Sacerdotes católicos abracem
os cultos indígenas? Por exemplo, o sacerdote chileno Pe. Diego
Irarrázabal, CSC, diretor do Instituto de Estudos Aymarás
de Puno (Peru), declara:
"O que se passa comigo e com muitos é que nós estamo-nos
convertendo a outras formas religiosas. Eu pratico o serviço a Pachamama
[culto gnóstico à ‘mãe-terra’ dos índios do
Peru, Bolívia e norte do Chile] e faço a challa [oferta sacrificial
à mesma deusa-terra] junto com as comunidades indígenas onde
estou. Aí descobri uma dimensão do ser humano, do cosmos
e da divindade. Quando alguém penetra nessa realidade desperta (...)
começa a viver outra vez".
Ou então o documento "Y-Juca Pirama, o Índio:
Aquele que Deve Morrer", assinado por Bispos e missionários:
"Um paraíso tribal, onde é coletiva a propriedade dos
meios de produção e não existe autoridade ... A missiologia
‘aggiornata’ inspira uma transformação radical de nossa sociedade".
Por sua vez, o sociólogo francês Michel Maffesoli,
em entrevista ao Estado de S. Paulo, indica o surgimento de um novo ideal
comunitário:
"O apelo da democracia e da política, o projeto de ordenar as
sociedades com base na racionalidade, a tirania das estruturas econômicas
sobre a vida humana: estas coisas esgotaram seu tempo de vida segundo o
sociólogo francês Michel Maffesoli. A fase atual, pós-moderna
traz em gestação um novo estilo de vivência: uma subjetividade
de massas, que repousa sobre o contágio afetivo, sobre a partilha
dos sentimentos e sobre a participação nas emoções
comuns’. Nesse resgate do comunitário ou retorno das ‘tribos’ entre
em ação uma ‘ética da estética’ e não
do engajamento. (...)
Maffesoli discute essas teses no livro ‘A Contemplação
do Mundo’, que acaba de lançar pela editora Artes e Ofícios.
Professor da Sorbonne, autor de obras como ‘O Tempo das Tribos’ (1988),
Maffesoli é, ao lado de Baudrillard e Edgard Morin, um dos principais
expoentes do pensamento ‘pós-moderno’ na França."
Não é difícil perceber a mudança
da opinião pública em relação aos índios.
No prefácio ao livro de Alejandro Ezcurra Naón, o Prof. Plinio
Corrêa de Oliveira sintetiza, de modo brilhante, a mudança
que houve na opinião pública em relação aos
índios:
"(...) Esse exemplo extremo ilustra até que ponto chegou
a euforia do progresso, e o desejo de viver indefinidamente esta vida que,
‘holliwoodianamente’ falando, era deliciosa.
Isso induzia incontáveis pessoas a se entusiasmarem com o progresso
e a se esforçarem em levar adiante o sonho do crescimento científico
e tecnológico indefinido.
Para tal ótica, a situação dos índios -
como também das tribos primitivas da África, Ásia
e Oceania que permaneciam em estado selvagem - representava o grau zero
de progresso, em comparação com a situação
dos homens que viviam segundo Hollywood, a qual seria, digamos, o grau
mil.
Assim, durante várias décadas, falava-se de vez em quando
de massacres perpetrados pelos índios, de assassinatos, de canibalismo,
de como sua vida errante era perigosa, do risco que haveria em encontrar-se
com eles nas selvas, etc.
Sem embargo, em certo momento, o tema ‘índios’ começou
a sair da atenção geral e, gradativamente foi-se tratando
cada vez menos dele.
Ao cabo de um intervalo em que o assunto permaneceu submergido em um
mar de silêncio e de olvido, começou ele a ressurgir, mas
já então sob um prisma completamente diferente. Para as mesmas
correntes ideológicas que, com o objetivo de demolir a civilização
cristã, interessava em certo momento promover o mito neo-pagão
de Hollywood, passou a convir a demolição do mesmo mito,
e da civilização com base nele edificada, a fim de dar um
salto adiante no processo revolucionário, rumo à anarquia
neo-tribal.
Para este novo objetivo, era preciso então apresentar as condições
de vida dos índios do modo mais favorável possível.
Disso fui testemunha: começaram a surgir menções
a tal autor, que asseverava ser exagerada a versão de que todos
os índios fossem canibais; ou a tal outro, que sustentava nunca
ter havido canibalismo entre eles, e, pelo contrário, exaltava que
possuíam estas ou aquelas qualidades. Assim, elogios à arte,
cultura e civilização dos índios foram se tornando
cada vez mais freqüentes, e caminhando para o hiperbólico.
De fato, pode falar-se francamente de uma arte e de uma civilização
indígenas, se se consideram, por exemplo, os Incas e os Astecas,
que tiveram impérios organizados, uma verdadeira arte, e elementos
culturais dignos de menção. (...)
Essa retomada, em tempos mais recentes, do tema indígena,
culmina agora com a virtual glorificação do índio
e de suas condições de vida milenar, promovida pelas esquerdas.
A ECO 92 foi uma manifestação muito curiosa, muito aguda
e muito sistemática dessa glorificação que, por sua
vez, o movimento contrário à celebração dos
500 anos do Descobrimento da América levou até o paroxismo."
Esse elogio sistemático da sociedade e do homem indígena
chegou ao ápice com o antropólogo francês Claude Lévy-Strauss,
considerado o homem-símbolo do Estruturalismo.
O próprio nome "tribo" começa a ser sinônimo
de grupo, como escreve o articulista Fredson Charlson, no Correio Braziliense,
em um artigo intitulado: "Ritual Tribal - Magos, Duendes, Caveiras. Tatuagens
Identificam as Tribos".
Assim, o citado Pe. Irarrázabal, CSC, sustenta que,
"depois do fracasso do modelo soviético, a utopia socialista
deve ser recriada a partir do âmbito menor, humilde e místico
das comunidades indígenas: Na semente pequenina, humilde, vital
[das comunidades indígenas], alí há plenitude’".
Sempre acompanhada do lado místico, as sociedades alternativas
espalham-se por toda a parte. Não é preciso fazer muito esforço
para demonstrar a perda da noção das mínimas regras
de educação e convivência. Mesmo as roupas atuais,
quando existem, não deixam dúvida sobre a tendência
que demonstram. Assim como os índios não usavam roupas na
época do descobrimento, assim também se percebe o crescimento
do nudismo
A) O Nudismo
Comenta o Correio Braziliense:
"O mundo está mudando. As praias brasileiras também.
A onda de naturismo, uma versão dos anos 90 do nudismo, já
tem 60 mil praticantes no país, um número realmente impressionante.
O naturismo não significa só andar nu. É uma forma
saudável de interagir com a natureza, sem qualquer malícia.
(...)".
Em uma posterior edição do mesmo jornal, comenta
o articulista José Rezende Jr.:
"A Federação Brasileira de Naturismo (FBN) estima em
100 mil o número de naturistas brasileiros. É pouco, se comparado
à França, onde eles são 10 milhões para uma
população de 57,5 milhões.
O fundador e presidente da FBN, Celso Rossi, no entanto, acredita que
nos próximos dez anos o Brasil atingirá a marca de 1 milhão
de praticantes.
‘Primeiro porque as pessoas estão descobrindo que o naturismo
é uma prática saudável e respeitosa, sem nada de indecente
ou erótico. E depois porque quem tira a roupa pela primeira vez
não quer mais saber de vestir. É um caminho sem volta’, garante.
Com a criação do Núcleo Naturista do DF (Difenat),
o ‘caminho sem volta’ já conta com 17 associações,
representando 14 Estados, do Pará ao Rio Grande do Sul.
Existem hoje cinco praias oficiais para a prática do naturismo."
O mesmo jornalista comenta uma família que acabou de
aderir ao naturismo:
"‘Eu pensei que ia ficar mais retraída. Mas estou achando tudo
natural. É muito mais agradável...’ (...)
Nada mal para uma família que pregou no carro o adesivo: ‘Eu
preferia estar pelado’, ao lado de outro mais antigo: ‘Sou católico,
graças a Deus’
‘Não vejo nenhuma contradição. Quem disse que
católico não pode ficar pelado? Nudez não é
pecado’, afirmava A., católica (e agora também naturista)
praticante."
Também na mesma edição, escreve José
Rezende:
"No convívio entre duas pessoas nuas, há uma relação
recíproca. A roupa é um disfarce. Nú você se
revela como realmente é ... a partir daí as relações
ficam mais sinceras".
A decadência que o homem moderno revela, tanto no vestuário,
como no trato social, não deixa dúvida da direção
para qual tende a sociedade. Até há alguns anos era impensável
alguém andar sem camisa - ou mesmo descalço - em público.
Atualmente, torna-se difícil encontrar quem ainda tenha um pouco
de cuidado com o pudor - que parece não mais existir - ou mesmo
com a estética de uma civilização que outrora brilhava
no arco-íris multicor de suas roupas típicas. Basta a "essência",
diria um pós-moderno, o resto não tem importância,
é uma ilusão.
A natureza, pela lógica revolucionária, não
precisa ser adaptada ao homem, este é que tem que se adaptar a ela.
Existe, para tal percepção de mundo, uma perfeição
inata à natureza, devendo o homem se "converter" à harmonia
dela, em consonância com a energia que dela se desprende.
B) A
Linguagem Tribal
Ao mesmo tempo, percebe-se a influência da Pós-modernidade
também na linguagem. O igualitarismo, aliado ao imediatismo, à
sensibilidade exagerada e à busca de emoções sem regras,
provoca uma ruptura com a maneira tradicional de linguagem.
As respostas se tornam cada vez mais monossilábicas,
existe uma falta de capacidade de estruturar frases com sentido. A fala
normal do pós-moderno passa a ser, por um lado, vazia de conteúdo,
superficial. O que importa é "pegar o sentido" do que se disse.
Se todos são iguais e tendentes ao inconsciente (nirvana),
a ponto de parecerem apenas um (pan), não há comunicação
possível, pois esta pressupõe dois interlocutores distintos
que conversam sobre um tema em comum.
O pós-moderno fala uma linguagem sem regras fixas, quase
"livres", onde a correção gramatical significa uma imposição
de uma civilização hierárquica, onde alguém
determina um modelo de linguagem que deve ser seguido pelos outros.
As regras gramaticais rejeitadas exprimem uma ordem muito mais
racional do que sensitiva e, por outro lado, formam frases muito mais longas
do que o ideal imediatista da Pós-modernidade.
Na já citada entrevista que "O Estado de S. Paulo" realizou
com Timothy Leary, temos a seguinte opinião da articulista, Sônia
Nolasco:
"Não é fácil conversar com Leary, menos ainda
por telefone (ele mora na Califórnia). Uma perguntinha e ele dispara
a falar, sem responder à pergunta. Seu discurso é pontuado
de falsos inícios, saltos de lógica. A fluência é
quase impossível de interromper e ele só fala do que quer..."
Assim como Leary, diversos jovens começam a demonstrar
incapacidade para o diálogo.
Nesse sentido se expressam M. Alfonso Erausquin, Luiz Matilla,
Miguel Vázquez, no já citado livro, Os Teledependentes:
"Teme-se que as imagens estejam criando futuras gerações
de não-leitores, não só fazendo diminuir o interesse
dos jovens pela leitura de livros, como também obstaculizando sua
própria capacidade de se expressarem tanto verbalmente como por
meio da escrita".
Na França, a psicóloga Mireille Chalvon constata
preocupada a freqüência com que crianças telespectadoras
se mostram incapazes de reproduzir, em palavras, aquilo que acabaram de
ver.
Segundo ela,
"A TV ... não propicia a aquisição de linguagem
porque é inútil dar nome àquilo que [simplesmente]
se vê. ... Fornecendo imagens, ela se dirige mais aos sentimentos
do que ao espírito, oferecendo mais sensações do que
noções".
O psiquiatra L. Moor chega a prognosticar:
"Os que fazem uso imoderado da TV disporão, dentro de 15 anos,
de um vocabulário de apenas 200 palavras imprecisas, abreviadas,
impróprias, carregadas de onomatopaicos".
Comenta o estudo da associação "O Amanhã
de Nossos Filhos", que os resultados dos exames de vestibular nos dão
bem conta do ponto a que chega a falta de leitura e de reflexão.
"Seus resultados são inquietantes. Com assombrosa assiduidade,
os alunos naufragam nas provas de redação. Há 20 ou
30 anos, esses rapazes e moças dificilmente teriam conseguido aprovação
sequer nos exames de primeiro grau."
Mas, que esperar de jovens que passam o dia diante de uma tela
de televisão repleta de expressões primárias? Por
exemplo estas, veiculadas por certa novela e referidas em artigo de Ethevaldo
Siqueira:
"Sem grilo, meu chapa. Seja legal. Não torra, pai. Já
tô encucado e você ainda vem me encher? Sai prá lá,
cara"...
O mesmo articulista comenta com acerto que quase 30 milhões
de pessoas (dados de 1977; hoje são mais de 100 milhões)
ouvem tais expressões diariamente na TV, assimilando-as com naturalidade
inconsciente. O que vai formando "uma nova linguagem brasileira, una e
coesa, pobre e eriçada, mas que vai integrando o país de
norte a sul".
O Prof. Marcel Rufo também notou nos jovens que foram
objeto de sua pesquisa a dificuldade de concatenar o pensamento e dar rumo
a uma conversação:
"É certamente um fato atualíssimo: as pessoas hoje mudam
de tema de uma maneira espantosa, incapazes que são de discutir
em profundidade determinado assunto, coisa que se transformou em um privilégio
de poucos - entretanto, seguramente, acessível a todos. O pensamento
parte por todas as direções, balança, não consegue
fixar-se em nada".
Desta forma, a sociedade vai rumando a um tribalismo auto-gestionário,
onde não só as roupas, mas também a linguagem, tendem
a um primitivismo próximo ao encontrado em tribos indígenas.
C)
Indigenismo e Demolição Revolucionária
Contudo, é necessário fazer uma distinção
entre o tribalismo primitivo dos povos indígenas e o tribalismo
Pós-moderno ao qual ruma a sociedade. Apesar de análogos,
eles não são iguais. Como escreve o Prof. Plinio Corrêa
de Oliveira, no livro "Tribalismo Indígena, Ideal Comuno Missionário
Para o Brasil do Século XXI":
"Nossos índios podem ser qualificados de comunistas? A pergunta
só pode despertar o sorriso.
Do comunista, o índio nada tem. Nem a doutrina, nem a mentalidade,
nem os desígnios.
O estado em que ele se encontra apresenta apenas traços de analogia
com o regime comunista. Por um desses jogos de coincidências que
aparecem com freqüência, quando se faz a comparação
entre estágios primitivos e os de decadência. Entre a infância
e a velhice, por exemplo.
Não é porque seja doutrinariamente contrário à
propriedade privada, que o primitivo tem (ou quase só tem) a propriedade
comum.
Pela mesma razão porque o homem da era da pedra lascada, se
não usava a pedra polida, não era de modo algum porque pensasse
que não devia usar. Mas simplesmente porque não a tinha inventado.
Nessa perspectiva, o índio não pode ser equiparado ao
‘civilizado’, que conhece a propriedade privada, a família monogâmica
e indissolúvel, e tudo quanto dessas fecundas instituições
nasceu e floresceu, mas tem aversão a esses troncos e a seus frutos.
Este ‘civilizado’ lhes quer pôr machado na raiz.
Em suma, uma nação indígena pode ser comparada
a uma planta que não cresceu, mas ainda poderá crescer. O
adversário da família e da propriedade, nostálgico
do comunitarismo ou do Comunismo (classifique-o cada um como melhor entenda)
tribal, é um demolidor". Porque o desígnio da neo-missiologia
tribalista é implantar, sobre os escombros da família e da
propriedade, a "comunidade sexual, corolário da comunidade de bens".
D)
Os Movimentos Ecologistas
Nesse ponto se percebe a união da Pós-modernidade
com os movimentos ecologistas, que afirmam, os mais radicais, a igualdade
entre o direito à vida de um homem e de um animal, ou mesmo de um
vegetal. Alguns chegam a afirmar a superioridade da vida animal em relação
à humana e, conseqüentemente, a necessidade de diminuir a população
humana.
Recentemente foi sancionada, ainda pelo presidente Sarney, uma
lei florestal que reflete bem a nova "ecocracia". Segundo dispõe
esta lei, entre a vida de um guarda florestal e de um passarinho, mais
grave é a pena para quem matar o pássaro, por cometer um
crime inafiançável e imprescritível.
Por traz desse ideal ecologista, se encontra a mesma visão
holística de mundo. A ecologia seria uma preocupação
global de um planeta (Gaya), sem fronteiras, comandado pela ONU, que é
um organismo internacional (que deve caminhar para ser supranacional) .
A visão holística também implica na igualdade entre
o homem e o animal, pois cada um tem - como já vimos na parte anterior
deste trabalho - a mesma partícula divina, apenas se manifestando
de uma forma diferente.
Na já citada obra de Alvin Toffler, encontramos o seguinte
trecho:
"Numa série embrionária de artigos na ‘New Perspectives
Quartely’ são nitidamente expostas as linhas principais de debate.
Para esses pensadores regressionistas [os ecoteólogos], os problemas
não são primordialmente ecológicos, mas religiosos.
Esse grupo reduz a história de nossas relações
com a natureza a uma alegoria bíblica. Primeiro, houve uma ‘época
de ouro’ ecológica, quando os seres humanos viviam em harmonia com
a natureza e a cultuavam. A espécie caiu desse ‘paraíso’
com a chegada da era industrial, na qual o ‘diabo’ - a tecnologia - dominava
as atividades humanas. Agora, devemos passar para um novo ‘paraíso’
de perfeita sustentabilidade e harmonia. Caso contrário, enfrentaremos
o ‘Amargedon’.[cataclismas mundiais que iniciariam a Era de Aquários]
(...)
Rudolf Bahro, influente teórico Verde que agora vive na Alemanha
Ocidental, afirma explicitamente que o que é necessário é
‘teologia, e não ecologia - o nascimento de uma época de
ouro que cultiva (...) a nobreza do homem’.
Ele recua ao século XIII para citar Meister Eckhart, o fundador
do misticismo alemão, ... que nos disse que todas as criaturas têm
Deus dentro de si.
Ivan Illich, um de nossos mais imaginativos críticos sociais
e autor de vários trabalhos brilhantes sobre teoria ecológica
(...) [acredita que] a pobreza é a condição humana
e deveria ser aceita como tal; daí, quem precisa de desenvolvimento?
Para Illich, também, o argumento é, em último
caso, teológico. ‘Deus foi o padrão que uniu o cosmo’ numa
época em que a pura subsistência era aceita como normal e
natural, um estado ao qual deveríamos voltar.
(...) talvez valha a pena lembrar o movimento da juventude da década
de 1920, o ‘Wandervogel’, na Alemanha, onde o movimento Verde é,
hoje, mais atuante. Os ‘Wandervogel’ eram os ‘hippies-verdes’ da República
Weimer, percorrendo o interior com suas mochilas, carregando violões,
usando flores, realizando festivais semelhantes ao de Woodstoock, com alto
grau de espiritualidade e pregando o retorno à natureza. (...)
Capítulo
11
O Anti-Consumismo
Aliado lógico do tribalismo ecologista, o anti-consumismo
surge como uma nova mania na sociedade. Cansados dos slogans da propaganda,
saturados de televisão, impregnados de misticismo, a nova geração
parece não se interessar pelo consumo, bastando ter o mínimo
necessário com o menor esforço possível. A geração
pós-moderna busca apenas viver o momento, sem preocupações,
em uma reedição da Paz e Amor que caracterizou a revolução
hippie. Ou como na música Imagine, de John Lennon, quando sintetiza
a nova percepção de mundo "nada pelo que matar ou morrer,
vivendo a vida em paz".
Na matéria Jovens Consomem e São Consumidos, a
articulista Sônia Nolasco exprime essa situação da
seguinte forma:
"Sobre os hábitos desses consumidores, James Truman, editor-chefe
da ‘Details’ (cuja média de idade dos leitores é de 26 anos),
diz: ‘Eles são tremendamente cínicos porque sabem que a mídia
está sempre tentando vender alguma coisa a eles’. A diretora da
revista ‘Sassy’, Linda Cohen, acha que essa geração foi tão
exposta ao consumo que aprendeu cedo a escolher suas marcas preferidas".
No mesmo sentido escreve o jornalista Enor Paiano, na matéria
Livros Apontam Repulsa ao Trabalho:
"Andy, Claire e Dag resolveram largar seus insípidos "McJobs",
sua rotina estéril e fazer uma viagem de auto descobrimento. Encontraram
velhos seriados de TV, a crônica necessidade de viajar, o vício
da informação associado à sensação de
‘nada acontece’, o ‘espetacularismo’ (fascínio pelas situações
extremas) e o culto da solidão: uma necessidade de ficar só,
mesmo sacrificando relações duradouras. Essas foram as características
apontadas por Douglas Coupland no livro ‘generation X - Tales of an Accelerated
Culture’, que batizou a ‘Geração X’.
O livro traz nas margens verbetes que explicam alguns termos usados
pelos personagens... (...) Existem também cenas de quadrinhos em
que os personagens repetem máximas da geração, como
a moça que diz: ‘Mamãe, não se preocupe, se o casamento
fracassar sempre há o divórcio’ - um exemplo de ‘rede-de-segurantismo’
ou crença de que há sempre um lenitivo para os machucados
da vida.
Em 1992, Coupland escreveu também a apresentação
de ‘Stacker’, livro feito a partir do filme de Richard Linklater, também
um retrato de geração, só que com outra característica:
‘slacker’ é o tradicional preguiçoso, que foge de qualquer
tipo de emprego. Mesmo de um ‘McEmprego’".
Desta forma, mais precisamente do que apenas a saturação
do consumo, a nova onda anti-consumista tem sua raiz na filosofia de vida
surgida com a Pós-modernidade. Filosofia esta que pode ser sintetizada
na seguinte frase do Prof. Plinio Corrêa de Oliveira:
"Mais vale a pena trabalhar o menos possível, comer igualmente
o menos possível, descansar muito... do que trabalhar muito, consumir
com fartura e melhorar constantemente o próprio nível de
vida".
Consumir não significa apenas comer, mas engloba um conceito
muito mais amplo. Inclui tudo aquilo que é conveniente ao homem
possuir e, no conveniente, até o supérfluo, que torna a vida
agradável e favorece a um constante engrandecimento de todo o corpo
social. Desde o sabor, até a estética, tudo tem no consumo
o seu impulso.
Se não se estimula ao supérfluo, não se
tem o belo, apenas o funcional. Para que serve uma poltrona esculpida em
cedro, forrada de um precioso veludo vermelho, bordada a ouro, basta um
banco qualquer, de ferro retorcido e plástico descartável,
pois ambos cumprem a mesma finalidade.
A esse funcionalismo, que nega à estética a sua
importância e reduz tudo a um minimalismo miserabilista, agrega-se
a concepção de igualdade, onde não importa mais o
melhor e o mais perfeito, basta o indispensável. Voltaire, que tanto
colaborou com a destruição do Ancien Régime, lançou,
entretanto, uma frase diametralmente oposta ao funcionalismo anti-consumista:
"O supérfluo, essa coisa tão indispensável".
Ora, é próprio da doutrina socialista a tese de
que os que têm muito fiquem só com o indispensável
para viver e dêem todo o supérfluo aos demais. Na mesma linha,
a tendência anti-consumista moderna apenas radicaliza a doutrina
igualitária do Comunismo.
Continua o mencionado artigo do Prof. Plinio Corrêa de
Oliveira:
"(...) Resultado: numa sociedade na qual ninguém tem vantagem
em trabalhar mais do que os outros, ninguém trabalha mais do que
os outros! É uma sociedade organizada em vantagem dos preguiçosos,
com prejuízo dos trabalhadores autênticos, dos diversos níveis
sociais.
Nessa sociedade, praticamente desaparece a abundância. (...)
Para que haja estímulo a que se trabalhe, é preciso dar
a quem trabalha a devida compensação. A fim de aproveitar
em benefício da sociedade os mais capazes, os mais eficientes, os
mais produtivos - numa palavra - os melhores - é preciso que
ganhem mais. Se tal não ocorrer, a sociedade amolece e cai no não-consumismo.
E daí resvala para um estado de pobreza crônica, preguiçosa,
mofada, que tende, em última análise, para a barbárie."
Aliás, como já demonstrado no capítulo
anterior, é bem para o tribalismo anti-consumista que caminha todo
o misticismo ecológico. Como salienta Alvin Toffler na sua obra
Pawershift, as Mudanças no Poder:
"A retórica teocológica contém mais do que uma
insinuação da teoria cristã da retribuição.
Como observam os escritores Linda Bilmes e Mark Byford, os Verdes teológicos
insistem que ‘o consumo é pecaminoso’, enquanto a praga ambiental
é vista como um ‘castigo por um consumismo excessivo, falta de espiritualidade,
desperdício’. (...)
Hoje, um ‘fundi’, ou fundamentalista ecológico inglês,
escreve numa carta à revista ‘The Economist’; que ‘os objetivos
dos Verdes ‘fundi’ como eu (...) [são] retornar a uma Europa que
existia no passado distante (...) entre a queda de Roma e a ascensão
de Carlos Magno’, na qual a unidade básica da sociedade ‘era a propriedade
agrícola, não maior do que uma aldeia. (...) A única
maneira de os humanos viverem em harmonia com a natureza é viver
a um nível de subsistência".
Voltar ao Sumário
Ir para a Próxima Página - A
Reação Tradicionalista: O Revés da Pós-modernidade
Para maiores informações, visitar o
seguinte link:
http://www.lepanto.com.br