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Parte VI
A Reação Tradicionalista
(O Revés da Pós-modernidade)

Capítulo 1
Tradição: Conservadorismo ou Progressismo?

  Existe, principalmente no Brasil, uma concepção pejorativa da idéia de tradição, como sendo algo velho, empoeirado, contrário ao desenvolvimento, etc. Seria o progresso algo novo e não baseado em crenças e costumes dos antepassados; algo que acompanhasse o tempo e suas inovações, tanto no nível ideológico como até mesmo artístico. Tradicionalismo seria, desta forma, um obstáculo ao progresso,  uma estagnação em um momento histórico passado, apenas um saudosismo. O progresso seria o exemplo Norte Americano, país pluralista, moderno e livre, do "Americam Way of Life", do "self made man", do espírito Hollywoodiano.
  Entretanto, estas considerações sobre a tradição não encontram resguardo no nível conceitual, como também - se formos analisar os países ditos desenvolvidos (incluindo os Estados Unidos) - veremos que é precisamente pelo respeito às tradições e não pelo desprezo a elas, que esses países são hoje o que são.
  A palavra tradição ("tradere") significa o ato de transmitir ou entregar.  Em outras palavras, podemos conceituar tradição como uma linha invisível que une o passado, o presente e o futuro de um povo, entregando ou transmitido o que foi bom, aperfeiçoando no presente e projetando, baseado no que deu certo e no progresso, o futuro.
  Tradição indica reformas, não rupturas. Indica um passado admirado e protegido, repleto de heróis, de fatos grandiosos e de conquistas. Indica, enfim, aquilo que marca profundamente a "alma" de um país e sua identidade como nação.
  A tradição pressupõe valores que se mantêm ao longo das gerações, e algo que se modifica com elas. Pressupõe uma mesma identidade sendo projetada ao longo dos séculos. Em outras palavras, significa fazer dos descendentes uma continuação, um progresso constante dentro de princípios perenes...
  O ato de progredir não é, pois, oposto à tradição. Antes, pelo contrário, é a tradição que o garante. Progredir nada mais é do que caminhar em uma direção. Quem se movimenta de uma direção para outra, pode se dizer, progrediu naquela direção. Portanto, quando um país progride, ele avança rumo a alguma direção que antes não ocupava.
  Disso resulta que assim como uma pessoa, um país pode caminhar (progredir) em direção a um erro. Conseqüentemente, nem sempre o simples ato de progredir é suficiente, resta saber como progredir e em qual direção. Ora, é a tradição que sustenta o progredir seguro de uma nação, iluminando, com a experiência do passado e os anelos do futuro, os passos a serem dados rumo a uma nova grandeza. Desta forma, mantendo-se certos valores perenes e adaptando-os aos tempos, consolida-se a identidade de um povo.
  Esse progresso contínuo, alicerçado na tradição, foi historicamente substituído por revoluções que não buscavam apenas progredir sobre certos valores, mas transformar o fundamento metafísico que eles encarnavam.
  Chega-se hoje, no final do século XX, a uma das maiores encruzilhadas da história, pois ao mesmo tempo em que a Pós-modernidade representa o ápice do processo revolucionário, também é a sua fragilidade. A radicalização de valores surgidos nesse processo - e que pelo seu caráter processual é gradativamente crescente - leva a um tipo de reação social a eles.
  Essa reação, como oposta a uma revolução anti-tradicional, consiste em uma Contra-Revolução tradicionalista. Desta forma, ao mesmo tempo em que existe uma tendência de concretização da Revolução, existe também uma reação contra-revolucionária que se ergue contra ela.
  Há 20 anos atrás, tinha-se a impressão que o mundo caminhava para a esquerda, para uma ruptura com a moral tradicional e para o igualitarismo.
  A Sorbonne e o festival de Woodstock foram os marcos históricos de uma nova era até então esperada, foram os marcos de uma pretensa "liberdade" moral que nascia.
  Mesmo até a queda do regime totalitário comunista, ainda dentro da polaridade Leste-Oeste, a sociedade via-se em uma perspectiva de revoluções e rupturas. Hoje, aparentemente, tudo parece calmo... O que houve?
  Fukuyama imagina um "fim da história" . Contudo, pelo  que foi demonstrado neste trabalho, não é o que ocorre. A história não permanece estagnada por muito tempo. Ou ela caminha para a realização do ideal revolucionário, ou para a reação a ele e um retorno às tradições esquecidas .
Capítulo 2
A Reação Tradicionalista
  Misturadas no confusão ideológica atual, começam a surgir diversas tendências, ora recuando, ora avançando na Revolução.
  Passemos a analisar algumas das muitas tendências tradicionalistas que foram notícias em diversos jornais nos últimos anos. Estas notícias demonstram, no limiar do que se tem chamado de Pós-modernidade, um como que saudosismo, um retorno a valores como nobreza, moral, família, etc. Enfim, significam, ainda que apenas de forma superficial, uma verdadeira mobilização tradicionalista.
  Os trechos apresentados a seguir foram extraídos de jornais de diversas tendências ideológicas. Desta forma, muitas dessas notícias se posicionam contra as tendências que diagnosticam.
A) "A Gothamania"
 Le Point:
"Sejam eles reis ou rainhas, príncipes ou princesas, os mínimos detalhes de suas vidas constam da primeira página dos jornais e constituem delícias para os leitores. Por trás desse fenômeno social encontra-se um fato sociológico: a nova paixão pelo Gotha  reflete uma época, seus mitos, suas deficiências, suas miragens.
Parece um mundo onde tudo é luxo, calma e volúpia. Um mundo fora do tempo, a mil léguas dos subúrbios, colocado no alto da sociedade. Homens nascidos na púrpura, cultivando valores seculares à sombra de seus brasões. Suas vidas são o mais "chatoyant" dos espelhos.
A realeza torna-se moda. Ela aparece com seus mitos que não se gastam e apresenta à nossa imaginação sua vida de sonhos.
Desde há muito existe um público apaixonado pelas revistas especializadas em nobreza. "Point de Vue" aumenta suas vendas em 25%. Uma nova revista, "Gala", tem 885 mil leitores. Um dos canais de televisão teve a coragem de consagrar uma de suas noites do mês de agosto (de 1994) às frontes coroadas. Um outro tem um programa semanal, denominado "Estrelas e Coroas", assistido por dois milhões de telespectadores.
Não tem jeito: Um desejo de reis e rainhas parece tomar conta dos corações sensíveis. Olhando de perto vê-se que o fenômeno é sério: nos eflúvios de água de rosas emanados da aristocracia flutua um fenômeno social.
Será o reverso da medalha de uma época por demais igualitária? Os franceses, embora irremediavelmente republicanos, são atraídos pelo trono e pelos diademas. Castelos, vestidos, bailes, princesas - tudo constitui um conto de fadas para adultos.
O fenômeno resulta de diferentes tendências sociais. Presenciamos um retorno às regras sociais, aos valores aristocráticos. A nobreza, uma instituição outrora exigente (contraignante), perde seu caráter imperativo e é reabilitada como tradição simpática.
Quanto mais o passado morre institucionalmente, mais ele ressurge sob a forma nostálgica e contemplativa. A ênfase que agora se dão às raízes e ao passado idealizado é uma reação contra a crise de identidade, patenteada há pouco pelo tratado de Maastricht.
A diluição dos pólos republicanos põe em movimento a máquina do tempo que permite voltar ao passado. A identidade republicana e seu ritual se encontram numa situação crítica.
A revitalização das relações com o passado se pode ver de diversas maneiras. Por exemplo, o prodigioso interesse manifestado atualmente pelo patrimônio cultural histórico: ao lado do aumento (20% em relação ao ano passado) das visitas aos castelos e catedrais, cresce o apreço pelos personagens da nobreza e da aristocracia. "O patrimônio se encontra em segundo lugar, logo depois do cinema, entre as práticas culturais francesas", diz Mme. de Saint Pulgent, do Ministério da Cultura, e membro da ANF. "Nestes tempos confusos as pessoas têm necessidade de raízes", acrescenta ela.
"Nesta sociedade desviada é lógico que representemos um pólo de referência", diz o duque de Breteuil, Presidente da associação "La Demeure Historique", que cresce atualmente de modo espetacular. "Quem visita castelos procura uma relação pessoal com seus proprietários. Nossas raízes fascinam", ajunta o Duque.
Alguns aristocratas transformaram seus castelos em hotéis. Alí os hóspedes têm a possibilidade de jantar no grande salão, junto à família do castelão. O Conde ou o Marquês quando não comparecem em ‘smoking’ decepcionam os hóspedes."
B) Genealogia: O Mito do Nobre
 Continua o artigo do Le Point:
"O famoso adágio da III República: "Um bom republicano não tem necessidade de antepassados", parece esquecido dos cem mil franceses que hoje se dedicam a pesquisas genealógicas. Isso se deve ao poder exercido sobre os espíritos pelos grandes nomes da antiga aristocracia.
O mais poderoso impulso nessa direção não é a vaidade. Trata-se de uma busca de identidade pessoal que a história da família pode dar. Numa sociedade sem raízes a descoberta da própria estirpe é forte apoio psicológico ao homem moderno. A genealogia oferece aos franceses um remédio às angústias de um período de individualismo triunfante.
A família, o nome, a hereditariedade cativam cada vez mais o simples cidadão. Ele escapa assim ao anonimato moderno. Quando se tem um nome, sobretudo "la particule (de)" , não se é mais afligido pelo anonimato, que constitui o grande drama de nossa época. Além do mais, nobreza é o contrário do dinheiro fácil que nos foi prometido durante as últimas décadas.
Multiplicam-se os manuais de boas maneiras. As virtudes sociais ganham prestígio, como a arte de bem receber e a arte de escrever cartas. A sociedade francesa parece desejar aproveitar a atual crise econômica para voltar às suas origens. Uma grande nostalgia toma conta dos espíritos.
No momento em que as ideologias fracassam e os políticos arrancam bocejos, os monarcas comovem multidões. Que revide! E precisamente isto era classificado pelos marxistas como "alienação". Como estavam errados!
O Rei era o homem no qual simbolicamente se encarnava a nação. Nunca se viu fisicamente o Socialismo nem o Liberalismo: mas um Rei, sim.
Numa entrevista, o príncipe Rainier de Mônaco declara notar um aumento de interesse pela nobreza e pela tradição. "Uma instituição não pode ser considerada obsoleta no momento em que conta com uma renovação de apoio popular. A monarquia é a garantia das tradições, graças a seu protocolo, seus ritos, suas cerimônias", afirma Rainier.
E prossegue: "Os franceses, mesmo republicanos, têm necessidade de algo ou de alguém a quem olhar com respeito e admiração. Os políticos perderam a clareza e a credibilidade. Os valores encarnados pela nobreza são simbólicos, mas cada vez mais respeitados como fermentos da unidade nacional. A estabilidade e a continuidade da nação são encarnadas pela família do monarca. Os monegascos nos dizem "nosso Príncipe", "nossa Princesa", com um forte sentimento de pertencer à nossa família.
"Eles nos colocam naturalmente sobre um pedestal. E o fazem por respeito, para nos situar acima das paixões. Mas essa posição supõe muitos sacrifícios. É preciso saber conter-se, proibir-se certas coisas, adotar um estilo de vida preciso, pois nossa função de representação é contínua.
"Quando jovem eu quis adotar um estilo de familiaridade nas relações com os monegascos. Pois bem, posso garantir que não é isso que o povo espera de um príncipe. As pessoas não gostam nem de familiaridades nem de distância. Aprendi a lição. Isso levou-me a não receber em audiência quem não usa gravata.
"Digo sempre a meu filho e sucessor: é necessário manter uma posição de disponibilidade, mas guardando uma certa distância, ficando como recurso e como árbitro de seu povo."
C) Castelos e Banquetes Medieváis
  Folha de São Paulo:
Imagine um autêntico banquete medieval. (...) A cena pode parecer coisa do passado, comum apenas em filmes épicos, mas essas sessões de comilança ainda se repetem em castelos na Irlanda. (...) A cada ano, cerca de 100 mil pessoas participam desses banquetes - uma das principais atrações turísticas do país. Móveis, tapeçaria, peças de obras de arte seguem à risca os moldes medievais. (...) Músicos, cantores, dançarinos e contadores de histórias também ajudam a recriar a magia daqueles tempos. (...) A duração de cada banquete é de aproximadamente duas horas. (...)
D) O Fim da Igualdade nas Escolas
 ABC: (Contra-Reforma Educativa na Suécia: Acabou a Plena Igualdade dos Sexos)
Carmem Villar Mir
Estocolmo - "Os professores não têm conhecimento suficiente sobre as diferenças que existem entre meninos e meninas. Essa falta de consciência contribui a aumentar as injustiças na escola", segundo o estudo "Feminino e Masculino", realizado na Suécia. Nele se afirma que "cada sexo tem seus problemas e facilidades, ou dificuldades, para assimilar a instrução escolar. Portanto, meninos e meninas têm que ser tratados de maneira diferente".
Políticos e Sociólogos deram marcha-a-ré - A Suécia é o país modelo na igualdade entre o homem e a mulher. Nos anos 50 as forças políticas, mais que as próprias mulheres, lutaram para conseguir a total igualdade de possibilidades.
Na escola também se adotou a reforma e se proclamou uma legislação sobre a igualdade dos sexos. A lei de Educação reza: "Todas as crianças, independentemente de seu sexo, serão tratadas de maneira igual, terão acesso a todos os programas educativos e seguirão o mesmo ritmo de estudos".
Em seu afã de não ser "discriminatória", esqueceu-se de que um dos maiores mistérios da humanidade é a diferença entre os sexos. Os meninos e as meninas foram para colégios mistos. Começaram o aprendizado na mesma idade. Tudo sem atender à voz da natureza.
Uma grande injustiça - Pela primeira vez se investigou, ordenou e quantificou os problemas de ambos os sexos na escola.
Os peritos em modos e costumes opinam que, apesar da melhor boa-vontade do mundo, sacrificaram-se muitos indivíduos no altar da igualdade, e que se perderam gênios fortes e carácteres débeis devido à grande injustiça que supõe um "tratamento e estudos iguais para ambos os sexos". Hoje, sociólogos e psicólogos recomendam que desde o primeiro ano se dê tratamento distinto a meninas e meninos.
Uma comissão nomeada por Beatrice Ask, ministra da Educação, sob a presidência de Chris Heister, apresentou os resultados de seus trabalhos sobre o tema "Meninos e meninas são diferentes".
A Comissão recomenda: meninos e meninas, separados - Ao final da roda de imprensa, Chris Heister, Presidenta da Comissão, indicou que a escola atual, mais que diminuir as diferenças, as acentua.
Que fazer para solucionar a situação criada? A comissão recomenda à ministra da Educação que revise a Lei de Educação. Indica que os professores têm que estudar muito a fundo as diferenças de sexos e que atuem em conseqüência: "Muitos professores notam e vêm a diferença entre os sexos", mas não sabem como atuar. Portanto, a carreira do Magistério deve ser reformada.
Opinam os peritos que se devem instituir aulas que só freqüentem meninas e outras para meninos, com vista a um ritmo adequado de ensino para cada sexo.
Assegura a Comissão que  "a idéia de que nos colégios  se pôs em prática a igualdade absoluta entre os sexos, sem discriminações, é falsa". Ao contrário, a tentativa de igualdade, levada ao extremo, reforça as desigualdades naturais entre os varões e mulheres.
A conclusão mais rotunda é que "as meninas e meninos são diferentes". Foi necessário uma Comissão de peritos para lembrar aos suecos algo que se sabia de sobejo, mas que alguns começavam a esquecer: a mulher é distinta do homem. E portanto, desde sua mais tenra idade, deve ser tratada de diferente modo que o homem. Essa conclusão, fez refletir toda a sociedade.
Questão de Sexo - Meninos e meninas alcançam a maturidade de modo muito distinto. Uma menina de 12-14 anos é uma verdadeira "mulherzinha", enquanto que um menino, da mesma idade, continua sendo menino.
De acordo com o texto, as meninas aprendem mais e com maior rapidez durante os primeiros anos do colégio. Depois chegam as dificuldades e aprendem com mais lentidão, enquanto que com os meninos ocorre o contrário. Têm dificuldade de assimilação durante a escola primária e secundária e grande facilidade nos anos posteriores.
Mais matemática para as meninas e mais horas de física e química no segundo grau.
As conclusões da Comissão são todo um símbolo da situação atual neste reino. As posturas radicais dos anos sessenta sobre a "igualdade total" perdem terreno. Hoje os políticos e sociólogos tem dado marcha-a-ré: a família não é sempre compatível com o trabalho. Os estudos não têm de ser idênticos para ambos os sexos.
Estamos assistindo a fato novo: reconhecer que a suposta igualdade entre os sexos não existe nem nunca existiu e que o sexo débil deve ser tratado na escola como merece e não em suposta igualdade com os homens.
"Neotradicionalismo" - O sonho terminou. A candidez das idéias modernas foi a culpada de um processo longo e injusto, hoje revisto com rigor e profissionalidade. Há que considerar e "redescobrir" a excelência das qualidades pessoais. Na Suécia hoje cresce o "neotradicionalismo" e estamos vivendo a segunda revolução no mundo da educação, a de "programar" de diferentes maneiras meninos e meninas. Uma revolução "made in Sweden" que sem dúvida se estenderá para o resto da Europa dentro de alguns anos.
E) A Retomada Moral
  Uma série de artigos, aparecidos em jornais franceses, indicam tendência em "defesa dos valores tradicionais".
Segundo o Le Monde, palavras como "ordem natural, senso moral, perversões, hedonismo, etc’, ‘flutuam’ há uma ano como um perfume de ordem moral nos debates políticos.
Projetos de lei em "defesa da família e da reabilitação do casamento, luta contra desvios, denúncia desta crise moral, e de tantos desregramentos sociais".
Assim, foram apresentados "sete projetos de lei para instituir um salário maternal, incentivando mães a permanecerem em casa". Cinco outros "visam suprimir vantagens fiscais" dos "não-casados". "58 deputados apresentaram projetos para proibir salas de jogos próximas dos estabelecimentos escolares".
"176 deputados, ‘impregnados do pensamento cristão e humanista’, assinaram projeto de lei restabelecendo a pena de morte.
"Desde abril de 1993 os debates da Assembléia Nacional deram ocasião a que a nova maioria, mais ligada às tradições, exprimisse suas convicções". Termos como "bons cidadãos", "desvios", "casamento", "ordem natural", revelam "uma tentação de pôr o debate político no terreno da moral e dos valores. O peso esmagador da maioria, para começar, favorece tal procedimento".
Uma "geração de deputados recém-eleitos, neófitos que, por falta de maturidade política, se deixam levar por reações instintivas, pelos humores da opinião", observa um deputado mais experiente. Além disso, "o ambiente ideológico está favorável".
Christine Boutin, "deputada (UDF) católica fervorosa, porta-estandarte desse combate pelos valores, explica que a crise social atual se enraíza numa crise moral: ‘Se a sociedade francesa está doente, tudo vem de uma falta de pontos de referência essenciais".
"Muitos parlamentares de direita se sentem mais à vontade para afirmar suas convicções religiosas. M. Delalande reconhece que a constituição de um verdadeiro ‘lobby’ da Igreja no Parlamento ‘seria muito mal visto’, na medida em que ele romperia o fundamento da República laica. O Padre De la Morandais, indicado pelo Cardeal Lustiger junto aos parlamentares, o sabe muito bem e toma cuidado de não fazer nenhum proselitismo".
"Os ativistas de direita se sentem encorajados pelo sucesso de Philippe de Villiers", - nobre, deputado da Vandéia - "nas eleições européias. ‘Villiers é o profeta da sociedade francesa de amanhã’, alegra-se M. Chénière".
  Pergunta-se o jornal "Info Matin" , "se as ligas da virtude retomaram a ofensiva pela ordem moral" tendo encontrado na AIDS "um novo campo para passar à ação e promover ‘valores morais’,(...)".
"Assiste-se de fato uma vaga de apelos à salvaguarda dos ‘valores cristãos tradicionais’, veiculados por uma série de associações que se aliam freqüentemente com a mais reacionária direita. Petições, artigos, panfletos, cartazes, ‘mailings’, campanhas voltadas aos jovens... tudo é bom para combater ‘a desordem moral’ que reinaria na França".
A criação, no começo do ano, do Comitê de Iniciativas pelo Respeito da Dignidade Humana (CID) é um exemplo". Esse CID apresentou um "código ‘para campanha sã de prevenção da AIDS", e coletou "em 15 de maio, 9.000 assinaturas e conseguiu o apoio de 73 associações familiares, católicas ou ecumênicas". As assinaturas teriam sido enviadas a Balladur, a ministros competentes e aos bispos da França. (...)".
 O Público
"Duas em cada três mulheres norte-americanas afirmaram, de acordo com os resultados de uma sondagem, que iriam virgens para o casamento caso o celebrassem agora e metade das inquiridas defende que nem homens nem mulheres devem ter experiências sexuais antes do casamento. A sondagem, uma iniciativa da revista ‘Redbook’, concluiu que 64% das 500 mulheres interrogadas gostariam de se casar virgens, enquanto 31% não. Mas também se concluiu que 53% entende que ter relações sexuais com quem se vai casar é a mesma coisa que casar virgem, mas 42% discordam desta visão liberalizante".
 El Diário Montanhês:
Ao perfume inquietante de Torquemada - Durante a recente convenção Republicana do Texas, o líder moderado Madison McKenne foi derrotado pelo fundamentalista Tom Paulken, graças a 70% dos delegados vinculados à denominada Coalizão Cristã. O slogan de Paulken é tão equívoco como petulante: "Vote por Deus". Mackenne diagnosticou a situação: "Há pessoas que queriam converter o partido em uma Igreja".
O furacão integrista, que utiliza como arma de ataque o repertório mais tradicional dos valores definidos convencionalmente como morais, parece instalado com firmeza no Partido Republicano. Ralph Reed, de 33 anos, é diretor executivo da Coalizão Cristão e declarou:
-"Vamos conseguir que este país seja novamente regido pelos cristãos e pelos valores cristãos. Nós formamos a espinha dorsal da América e já somos uma corrente política principal capaz de ganhar as eleições".
Estes ardorosos cruzados da fé apostam num dirigente carismático, o ex-coronel Oliver North, cujos objetivos na vida pública se reduzem, de acordo com suas próprias declarações, a duas abstrações intangíveis: Deus e família.
David Schnittger, pastor da Igreja Bíblica de Emmanuel, resume com maior clareza: "Nossa comunidade está alarmada pela agenda homossexual de Clinton, pela sua medicina socializada, pela sua defesa do aborto".
Estes norte-americanos ultramontanos estão objetivamente mais próximos das teses sobre o aborto, defendidas com infatigável tenacidade pelo Vaticano, que das teorias que preconiza o atual inquilino da Casa Branca.
Na França, depois da contundente vitória da centro-direita, em março de 1993, esse fenômeno também vai se desenvolvendo, a ponto de o Le Monde, 24-6, dedicar-lhe uma ampla análise: "Flutua, há um ano, como um perfume de ordem moral nos homiciclos do Palais Bourbon e do Palais de Luxemburg. Discreto, mas insistente, às vezes sussurrante, essa mudança de tom impregna os debates e acaba por impor-se como um novo ar da época’.
O lobby católico da maioria governamental francesa adota o combate pelo retorno dos valores morais, no estilo da batalha que em Grã-Bretanha impulsiona o Partido Conservador; centra sua atuação, assim mesmo, na família, no aborto e até no restabelecimento da pena de morte. Este inquietante "perfume da ordem moral" não coincide em absoluto com a visão que do Cristianismo tinha El Clarín: "Queremos que seja sempre possível outra Santa Teresa e impossível outro Torquemada ".
F) Notícias Variadas (Diversos)
 Le Figaro:
"O que há de novo na França é o barroco!" "Desde a apresentação da ópera Atys em 1987 (música de Lully), e o imenso sucesso do filme "Todas as Manhãs do Mundo", - 3 milhões de espectadores - o barroco é mais do que uma moda. Ele se tornou, nos anos 90, elemento capital do patrimônio dos franceses.
George Chérière, diretor da revista "Repértoire", fez uma estatística: em três mil e quinhentas gravações contidas na sua publicação em 1993, seiscentas cobrem o período de 1580-1780!
Há também uma magnífica exposição de pintura de Nápoles no século XVII, que se encerrou em Strasbourg e que se encontra em Bordeaux até 21 de agosto.
O mundo editorial não está parado. Do historiador François Bluche, somadas todas as edições, ultrapassa 200.000 exemplares o seu ‘Louis XIV’.
A Unesco e o Conselho da Europa acabam de lançar duas grandes campanhas, uma em escala mundial, e outra continental, sobre o barroco.
Jacques Thuillier descreve assim este retorno ao barroco: ‘Em 1950, na Normandia, destruíam-se, nas Igrejas, os altares desse período. Em 1994, os Monumentos históricos compravam o quadro encomendado a Simon Vouet para o altar principal da capela do castelo de Saint-Germain-en-Laye’.
François Bluche, especialista desses dois séculos, assinalou: ‘A mediocridade das criações contemporâneas produziram um tal vazio que levou os franceses, por nostalgia, a amar esse passado artístico e histórico. Esse interesse pela monarquia francesa é flagrante. Compreendeu-se que este país não nasceu em 1789! Os historiadores detestavam o Ancien Régime, mas, sem querer, eles o reabilitaram! Um sinal: os cincos volumes da história da França da Hachette reabilitam o Ancien Régime, algo que antes era impossível!".
  Pode-se notar que o fenômeno não só se dá com relação ao período de 1789, como também ocorre o mesmo com a Idade Média. Até o final do século XIX e início do século XX, existia um certo tipo de "ódio" renascentista em relação à Idade Média . A partir de meados da década de 50, iniciou-se, sobretudo na Europa e nos Estados Unidos, uma reavaliação sobre o período de 1.000 anos que a história teimava em ignorar. A tal ponto isto ocorre que a Idade Média já começa a ser chamada, por muitos historiadores, como Idade da Luz.
 Le Monde, 1/6/94:
"Vinte e cinco anos depois de maio de 1968, os jovens certamente não retomaram o caminho das igrejas, mas a uma geração de ruptura radical com a religião, seguiu-se outra de busca religiosa difusa. 12.000 jovens participaram do encontro "fraterno", 10 vezes mais numerosos que a ‘Frat’ de 1979. Em Vitry-sur-Seine outra reunião de 20.000 jovens se realizou pela iniciativa da Ação Católica das crianças.
O escotismo, com 110.000 membros, não cessa de progredir. A Igreja Católica registra um número crescente de batizados em idade escolar: 13.500 após os sete anos em 1990, contra 4.000 em 1977. A peregrinação de estudantes a Chartres - por volta de 5.000 participantes na Páscoa - reencontrou seu ritmo de cruzeiro. Outras peregrinações a Lourdes, a Santiago de Compostela, Czestochowa, atraem grupos cada vez maiores de jovens.
Estranhos às batalhas clericais de ontem, não têm contas algumas a acertar e têm, assim, menos complexos que seus maiores para exprimir sua fé. Apesar disso, a indiferença continua maciça. Todos os institutos de pesquisa registram que a proporção de jovens que se declaram ‘sem religião’ é maior do que a dos adultos.
O ateísmo no sentido estrito, mesmo assim, não progride. "Deus está morto, dizia-se em 1968". Hoje não chega a um em dez cuja resposta seria francamente atéia.
O prof. de Filosofia Guy Coq observa que ‘as questões sobre Deus, morte, vida, o sagrado, tornam-se muito fortes’, acrescentando: ‘Os meus alunos estão muito mais interessados nos cursos de metafísica do que pela filosofia política".
Os de 68 queriam romper com o passado. Os atuais buscam suas raízes. Sentem mais simpatia que hostilidade pela religião de seus pais ou de seus amigos. A mesma tendência se observa entre jovens judeus ou muçulmanos. Não rejeitam nenhuma herança a priori, aí compreendida a espiritual ou religiosa, buscando num tipo de ‘panteísmo’ moderno, vizinho da vaga ecológica, uma respostas às suas questões sobre o sentido da vida. Diz "François Champion, sociólogo: o Cristianismo tem, agora, que partilhar o campo do inexplicável com a transmissão de pensamento, a astrologia, videntes, a magia e o diabo."
G) No Brasil
  O Jornal do Brasil, na coluna de Danusa Leão, em 1993, reproduz uma  pesquisa realizada pelo Ibope, segundo a qual 70% do eleitorado brasileiro é conservador. Apenas 30% é favorável a mudanças. A colunista afirma, então, que isso reflete o fato da queda de Lula nas enquetes eleitorais. Essa notícia foi publicada no mês de setembro do corrente ano, ainda durante a campanha eleitoral.
  Paralelamente, comenta Perseu Abramo, membro do Diretório Nacional do PT:
"O PT chega a um ponto de sua existência em que é legítimo indagar se já não terá cumprido o seu papel na história... Hoje o PT perdeu muito do charme e do carisma iniciais".
  No mesmo sentido, afirma Frei Betto, arauto do progressismo católico:
"Com o andar da carroça as abóboras se ajeitam: bastava defender o Socialismo. Porém o Socialismo faliu no Leste Europeu, a política exige alianças e nada indica que a via institucional ruma na direção do Socialismo".
  Também, na mesma linha, manifestou-se Luís Inácio Lula da Silva, no Rio de Janeiro, por ocasião do 15º aniversário do PT:
"Eu acho que estamos vivendo o desafio de construir uma nova utopia. E não é apenas o PT. É importante que a gente tenha muita clareza de que o que estamos vivendo hoje, que para alguns parece uma baixa [sic], que parece que estamos retrocedendo, estamos desmotivados, não é apenas o PT. (...)
Afinal de contas a Igreja Progressista já foi muito mais atuante do que hoje. Afinal de contas o movimento popular já foi muito mais atuante do que hoje. Afinal o movimento sindical já foi muito mais atuante do que hoje. O movimento estudantil já foi muito mais atuante do que hoje, o movimento das mulheres já foi muito mais atuante do que hoje, o movimento pela saúde já foi muito mais atuante do que hoje. Então, não é um problema apenas do PT. É um problema histórico que estamos vivendo. Possivelmente de defasagem, de falta de reciclagem, de todos nós que participamos da Igreja Progressista, dos sindicatos, dos movimentos populares e dos mais diferentes grupos sociais que existem hoje."


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